André
Macedo – Diário de Notícias
A
velocidade é um conceito relativo. Passos Coelho fez tudo ao ritmo normal, mas
parece ter circulado como nos tempos da máquina a vapor em comparação com a
hiperatividade de António Costa. Logo na noite eleitoral, o ainda
primeiro-ministro reconheceu que a vitória o obrigava a negociar com o PS. Esse
primeiro contacto deu-se logo na sexta-feira, três dias a seguir a o Presidente
da República o ter pedido. Teria acontecido tudo dentro do que é expectável,
não fosse o líder socialista ter pisado a fundo no acelerador. Ainda não secara
a tinta do discurso de Cavaco e já Costa se encontrara com Jerónimo de Sousa e
aberto a porta a Catarina Martins. O Bloco acabou por aceitar o noivado apenas
na segunda-feira, embora deixando-se cair no regaço do secretário-geral
socialista sem grandes cerimónias. Em menos de uma semana, o candidato
derrotado no domingo percorreu todos os partidos com assento parlamentar, mas
fez mais do que isso. Iniciou também os contactos que podem ajudar a digerir na
UE um governo tão à esquerda como este - haverá seguramente chatices, tensões e
hesitações. As entrevistas que António Costa deu ontem à Reuters e à AFP são
apenas a parte visível deste processo de sensibilização europeia. Bruxelas sabe
o que está a acontecer e não deixou de estar informada pelo Largo do Rato ao
longo destes dias. O único obstáculo capaz de parar este TGV teria sido o
próprio PS, justamente receoso de partilhar cama e roupa lavada com PCP e BE.
Mas não foi isso que sucedeu. As vozes críticas foram dispersas, embora
contundentes, e também elas sem o turbo de António Costa. É assim que chegamos
a esta quarta-feira, dez dias depois das eleições, e nada é como parecia que ia
ser. O pisca-pisca do PS avisando a iminente viragem à esquerda é um facto que
só falta consumar. Para isso, Bloco e PCP terão ainda de renegar muito do que
defendem - um momento histórico de fiabilidade imprevisível e que, sublinhe-se,
ainda não tem epílogo certo. Quanto a Cavaco, não lhe resta mais do que ser
exigente. A não ser que mude tudo outra vez para que tudo fique na mesma.
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