terça-feira, 13 de outubro de 2015

Portugal. E O JEREMY CORBYN?



A vontade popular impôs como seus representantes uma maioria de deputados que se propuseram lutar contra a austeridade em defesa da democracia e do Estado social tendo como suporte a Constituição da República.

Mário Tomé

Um enxame de vespas bem apessoadas zumbe ameaçador.

A situação não é para menos: inesperadamente do ventre do monstro, um suposto allien vem perturbar a tranquilidade pachorrenta da alarve devoração.

A direita dos negócios e das rendas mais os debicadores de migalhas garantidas entraram em pânico.

O centrão passou a sofrer de angustiosa ansiedade .

A derrota imposta à ousadia do Syriza pela parceria dos neoliberais com os sociais-democratas europeus, com inusitada e, apesar de tudo, inesperada violência por parte destes últimos, parecia assegurar que a sudoeste nada de novo viria perturbar o regular funcionamento da hegemonia troikiana: a aceitação da aldrabice orquestrada pelo executivo e pela docilidade do legislativo sob a vigilância do cinismo presidencial dava sinais de resultar em pleno, com a previsão de uma vitória eleitoral dos caudatários domésticos de Merkell e Schäuble.

O PS, invocando em vão os valores republicanos e social-democratas , esforça-se estrenuamente por ignorar que a defesa desses valores em tempo de global financeirização da economia pertence objectivamente à política radical proposta à sua esquerda.

Podia ter aprendido alguma coisa com a mudança profunda no Partido Trabalhista com a eleição de Jeremy Corbyn por um lado e, pelo lado negativo, com o comportamento vergonhoso dos seus congéneres europeus no esmagamento da vontade do povo grego.

O resultado das eleições de 4 de Outubro veio obrigar os socialistas a terem que considerar uma resposta para a qual não estavam devidamente preparados e abriu a caixa de Pandora do reaccionarismo mais boçal e imbecil por parte dos agentes da coligação do PSD com o CDS e dos propagandistas, comentadores e jornalistas que prosperam à sombra da política do centrão, construindo a narrativa (cá vai ela) de que política é a arte de fintar, esconder e enganar e que a aldrabice é o mais sofisticado método de compor a realidade.

A vontade popular impôs como seus representantes uma maioria de deputados que se propuseram lutar contra a austeridade em defesa da democracia e do Estado social tendo como suporte a Constituição da República.

O CDS, levado ao colo pelo PSD sem arriscar a contagem dos votos, ficou atrás do Bloco e, onde enfrentou o eleitorado cara a cara, na Madeira, perdeu directamente o deputado que já elegera para o Bloco de Esquerda.

A composição do Parlamento revela a derrota dos partidos da PAF que ficaram em minoria perante uma maioria clara anti-austeritária.

A obstrução ideológica à constatação da vitória das forças anti-austeridade e à legitimidade da formação de um governo apoiado nessa maioria que o povo determinou com o seu voto para travar e acabar com a brutalidade do regime austeritário, tem assumido aspectos sórdidos e também ridículos, revelando em toda a sua nudez não apenas a rasteirice da direita mas, talvez o mais significativo, a sabujice colaboracionista dos media subordinados sem apelo nem agravo às exigências dos patrões da comunicação social.

As esquerdas, sistematicamente acusadas de não quererem assumir responsabilidades na procura e sustentação de soluções governativas, quando se propõem dar passos nesse sentido, em função dos resultados eleitorais que apelam à governação pela esquerda, passaram a ser anatematizadas, insultadas e, pelos mais ternurentos, aconselhadas a manterem-se no seu lugar de protesto e oposição.

A situação é propositadamente baralhada, tornada confusa e inextricável, por forma a dar saída à solução cavaquista-passista-portista.

A perícia troca-tintas de Paulo Portas, foi posta a nu pela divulgação de um passo do seu debate com Passos Coelho na campanha legislativa de 2011 em que argumentava exactamente o contrário do que hoje defende; ou seja na altura defendia que a formação do governo devia e podia ser assegurada por quem assegurasse uma maioria de deputados no caso de uma força política vencer sem apoio maioritário garantido.

As hesitações e divisões dentro do PS em trabalhar seriamente para reunir as condições, conjuntamente com as forças de esquerda anti-austeritária para assumir a formação de um governo com esse apoio maioritário garantido, deve-se exclusivamente à sua já velha capitulação perante os status quo neoliberal.

Tony Blair ou Jeremy Corbyn eis a escolha que tem pela frente.


Mário Tomé (na foto) - Coronel na reforma. Militar de Abril. Escreve com a grafia anterior ao acordo ortográfico de 1990

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