O
Banco Espírito Santo (BES) e a empresária angolana Isabel dos Santos, filha do
presidente Eduardo dos Santos (há 36 anos no poder sem nunca ter sido
nominalmente eleito) estão entre os 15 casos “mais simbólicos da grande
corrupção” em todo o mundo que a Transparência Internacional (TI) colocou hoje
em votação.
Os
15 casos “mais simbólicos da grande corrupção” foram escolhidos pela
Transparência Internacional a partir de 383 candidaturas que chegaram a esta
Organização Não-Governamental (ONG) através dos seus parceiros em vários
países, tendo sido definido como critérios o uso da posição de último
beneficiário em operações de offshore ou em participações de sociedades
anónimas, abusos de direitos humanos e escala da corrupção envolvida.
A
votação pode ser feita entre hoje, Dia Internacional contra a Corrupção, e 9 de
Fevereiro de 2016 no site www.unmaskthecorrupt.org, lançando depois a TI um
debate sobre a forma como punir o corrupto mais votado.
Além
do BES e de Isabel dos Santos, a lista em votação integra também a petrolífera
brasileira Petrobras, o presidente da Guine Equatorial (membro da CPLP),
Teodoro Obiang, a Federação Internacional de Futebol (FIFA) e o político da
Republica Dominicana Felix Bautista.
Os
antigos presidente da Tunísia, Ben Ali, do Panamá, Martinelli, do Egipto, Hosni
Mubarak, e da Ucrânia, Yanukovych, a empresa governamental chinesa de
infra-estruturas, o estado norte-americano de Delaware, por permitir o registo
anónimo de empresas, a fundação da Chechénia Akhmad Kadyrov, a corrupção
sistémica nas instituições no Líbano e a junta governamental da Birmânia são
outros dos 15 casos “mais simbólicos da grande corrupção”.
O
escândalo do Banco Espírito Santo, presidido por Ricardo Salgado, rebentou no
Verão de 2014, estando o processo a ser investigado na justiça portuguesa por
suspeitas de falsificação, falsificação informática, burla qualificada, abuso
de confiança, fraude fiscal, corrupção no sector privado e branqueamento de
capitais.
A
empresária angolana Isabel dos Santos detém em Portugal participações nos
sectores bancário e das telecomunicações.
Segundo
a Transparência Internacional, a grande corrupção “é o abuso do poder de alto
nível que beneficia poucos em detrimento de muitos”, causando prejuízos graves
e ficando, muitas vezes, impune.
Na
página da internet da TI, o presidente desta ONG, José Ugaz, apela ao voto,
considerando-o importante no combate à grande corrupção.
“O
seu voto é importante. Juntos, podemos fazer entender os governos da urgência
em agir e fazer parar esta doença”, disse José Ugaz, adiantando que a
capacidade de agir com impunidade tem de acabar.
O
responsável afirmou ainda que, identificados os maiores símbolos do mundo de
grande corrupção, a TI vai propor sanções penais e outras para quem praticou
estas acções que prejudicam especialmente os pobres.
Com
sede em Berlim, a Transparências Internacional é uma ONG que tem como principal
objectivo a luta contra a corrupção, sendo representada em Portugal pela TIAC –
Transparência e Integridade, Associação Cívica.
O
caso (mais ou menos) português
A
TIAC recebeu, num ano, mais de 100 queixas de indícios de corrupção ou abuso,
oito das quais encaminhadas para o Ministério Público (MP) por suspeitas de
crime.
Criado
há um ano pela TIAC, o serviço Alerta Anti-corrupção, disponível na página da
internet da TIAC, permite aos cidadãos reportarem “de forma segura e
confidencial” suspeitas de corrupção de que tenham conhecimento.
“É
um balanço positivo porque, em primeiro lugar, foi uma forma de conseguir criar
um canal de comunicação directo com os cidadãos. Recebemos 113 queixas de perto
de 150 comunicações de cidadãos, que muitas vezes querem uma informação muito
simples sobre qual a autoridade a quem se dirigir com determinado problema e,
em outras circunstâncias, trazem algumas histórias de suspeitas muito
fundamentadas de corrupção”, disse o director executivo da TIAC, João Batalha.
No
balanço de um ano do Alerta Anti-corrupção, João Batalha referiu que a maior
parte dos casos que chegam a este serviço “não tem necessariamente a ver com
corrupção no sentido penal”, mas sim com a falta de informação e dificuldade em
aceder a documentação.
“Em
muitos casos, aquilo que precisamos de fazer é dar alguma informação,
esclarecimentos e descodificar como funcionam as instituições, quem são e a
quem se devem dirigir porque em Portugal há uma profusão enorme de organismos
púbicos com competências de combate à corrupção ou criminalidade económica”,
afirmou, sublinhando que a TIAC tenta “descodificar este labirinto
administrativo e ajudar a direccionar as pessoas aos sítios certos”.
João
Batalha avançou que foram encaminhadas para o MP oito das 113 queixas por
“suspeitas fundadas de crimes”, realçando que a Organização Não-Governamental
(ONG) tenta “dirigir as pessoas às instituições para que seja o cidadão o autor
da queixa”.
Explicou
que a maioria das queixas está relacionada com as autarquias e empresas
municipais, “o que faz sentido porque é o órgão de poder que está mais perto
dos cidadãos e onde as pessoas mais facilmente detectam alguma irregularidade
ou se sentem insatisfeitos com alguma questão”.
“É
importante que o cidadão que tem a informação e necessidade de dar o alerta
possa acompanhar o caso junto das instâncias para poder colaborar nas
investigações, por outro lado é importante que as pessoas sintam que têm um papel
a desempenhar no combate à corrupção. Sempre que possível tentamos capacitar os
cidadãos para que sejam eles a tomar a iniciativa e a ter a dianteira neste
processo”, acrescentou.
No
entanto, em algumas situações a TIAC apercebe-se que as pessoas se expõem a
riscos se fizerem uma denúncia, podendo sofrer represálias e retaliação no
trabalho e até no meio social, isto porque, “não existe uma eficaz protecção
contra denunciantes”.
Por
isso, em alguns casos, o organismo toma a iniciativa de enviar as denúncias
para as entidades competentes para proteger a identidade das pessoas. Segundo o
responsável, as queixas enviadas para o Ministério Público estão a ser
investigadas, mas “ainda não chegou ao fim qualquer processo”.
A
Procuradoria-Geral da República tem um serviço para denúncias, através da
Internet, de crimes económico-financeiros, tendo em cinco anos recebido 9038
queixas.
Portugueses
têm medo
O
director da TIAC diz que cada vez mais portugueses querem denunciar casos de
corrupção, mas têm medo de sofrer represálias devido à ineficácia de um sistema
de protecção, que apenas existe no papel.
“Os
portugueses querem denunciar mais a corrupção do que eventualmente há uns anos,
porque o país está a sentir muito directamente os efeitos da corrupção e o
impacto económico e social, que se traduz depois nestas políticas de
austeridade que têm de cobrir muitos dos maus negócios, desvios e corrupção”,
disse João Batalha, adiantando que os portugueses querem ter um papel mais
activo, mas ao mesmo tempo sentem que “ainda há obstáculos muito grandes para
fazerem denúncias de forma segura”, sentindo-se desprotegidas porque não há um
sistema de denunciantes a funcionar.
Folha
8
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