Não podemos nem devemos seguir o dito de que "o que não tem remédio remediado está" relativamente aos povos e aos países. Algo deve ser feito para o bem-estar dos países e dos povos. Também na Guiné-Bissau o dito não deverá ser seguido e "deixar andar". Fonte em Bissau refere a grande confusão que vai na política do país acerca da aprovação ou não do programa do governo. Para uns o programa foi aprovado, para outros não foi aprovado. Nada é visto e analisado com imparcialidade mas sempre com vista à luta pelo poder. Daí a expressão que dá o título: a Guiné-Bissau é um "caldeirão de confusão gerado pela luta pelo poder. Querem governar-se, não querem governar o país".
Redação PG
JURISTAS
DIVIDIDOS NA INTERPRETAÇÃO DE APROVAÇÃO OU NÃO DO PROGRAMA DO GOVERNO
O
processo de votação da moção de confiança solicitada pelo primeiro ministro
Carlos Correia que decorreu no passado dia 23 do mês em curso, continua a
suscitar o debate no país, sobretudo no meio dos juristas. A interpretação dos
resultados de votação no Parlamento, está a dividir a comunidade jurídica
guineense quanto à aprovação ou não do documento.
Sobre
o assunto, o semanário “O Democrata” ouviu o especialista em matéria do direito
constitucional, José Paulo Semedo e o professor do Direito, jurista Carlitos
Djedju. As interpretações dos dois juristas são totalmente divergentes.
CONSTITUCIONALISTA
JOSÉ PAULO SEMEDO CONSIDERA QUE PROGRAMA DE GOVERNO FOI REPROVADO
O
Constitucionalista guineense, José Paulo Semedo, afirmou que o programa de
governo de Carlos Correia foi reprovado pelo Parlamento por não ter obtido o
número de votos suficientes dos parlamentares. O jurista aconselha desse modo o
chefe de executivo a melhorar o programa e apresentá-lo novamente aos deputados
dentro do prazo limite na lei, ou seja em quinze dias.
Numa
entrevista exclusiva a’O Democrata, o constitucionalista esclarece que os
parlamentares votaram o programa de governo e não a moção de confiança, tendo
frisado que o voto a favor do programa não conseguiu atingir os 51 por cento, e
desde logo reprovado de acordo com a Constituição da República da Guiné-Bissau.
Para
este advogado de profissão, a primeira coisa que se pode questionar é sobre o
objecto de elemento submetido à aprovação, se é uma moção de confiança ou se se
trata do programa do Governo. No seu entender, o elemento submetido à aprovação
é o programa de governo. Sustentou neste particular que para a provação do
programa de governo, a Constituição recomenda a necessidade de existência de
votos em números suficientes para ultrapassar os votos em sentido diverso para
contrariar.
“O
sentido diverso significa votos contra e votos de abstenção, então significa os
votos no excesso do voto de aprovação. É verdade que a Constituição através do
artigo 104 da alínea b) não fala de percentagem necessária para a sua
aprovação. Estamos perante uma lacuna na alínea b). Se consideramos essa
lacuna, não precisamos de grande exercício para o seu preenchimento, basta
avançarmos para a alínea d) do mesmo artigo que estipula que a aprovação de uma
moção de censura ou a não aprovação de uma moção de confiança por maioria absoluta
dos deputados em efectividade de função, acarreta a demissão do Governo”,
explica.
Semedo
sustenta que a não aprovação do programa de governo significa que os votos a
favor não atingiram 50 por cento mais um, de acordo com a lei do país.
O
constitucionalista lembrou que os deputados que suportam o governo devem
expressar os seus votos no índice do 50 por cento mais um para a aprovação da
moção de confiança de governo. “São os deputados que suportam o governo é que
devem alcançar a percentagem exigida pela lei”, sublinhou.
“Se
não atingirem a percentagem exigida a favor da moção de confiança, no entanto
se os outros deputados votarem em abstenção o governo cai, porque os que
suportam o executivo não conseguiram atingir o 50 por cento mais um. Para a
aprovação do programa de governo é o mesmo exercício. O princípio que se aplica
que nós encontramos na alínea d) é o mesmo que vamos transpor para alínea b). O
governo quando apresentar o programa para sair com o sucesso do parlamento tem
que conseguir os votos de 50 por cento mais um. Supondo que no Parlamento
tínhamos 101 deputados, então 51 deputados devem votar sim ao programa”,
precisou.
Relativamente
ao ponto de discórdia, ou seja, o facto de não ter sido registado nenhum voto
contra durante o processo de votação, José Paulo Semedo explica que a situação
não é relevante porque a lei recomenda que o voto a favor de aprovação do
programa de governo tem que ultrapassar os 50 por cento mais um de votos
diversos.
“Não
tem que ser votos contra, basta ser votos diversos. Os votos diversos podem ser
votos contra e abstenção. Temos que distinguir o voto diverso e nulo que já é
uma outra conversa. Voto nulo não se toma em conta, mas o voto diverso sim.
Para a aprovação, o governo precisa garantir 50 por cento mais um de votos.
Neste caso, de acordo com a Constituição da República da Guiné-Bissau, o
programa foi rejeitado pelos deputados”, notou o constitucionalista.
JURISTA
CARLITOS DJEDJU DEFENDE QUE MOÇÃO DE CONFIANÇA AO PROGRAMA DE GOVERNO FOI
APROVADO
Por
seu lado, o jurista Carlitos Djedju disse a’O Democrata que a moção de
confiança ao programa de governo apresentado pelo primeiro-ministro Carlos
Correia no passado dia 23 do mês em curso, foi aprovada. O jurista defende
ainda que no seu entender o voto da abstenção é a indiferença, razão pela qual
não pode contar para o apuramento da maioria, seja ela contra ou a favor.
“Dada
por aprovada a moção, naturalmente arrasta consigo a aprovação do programa do
governo. O que o Primeiro-ministro pediu é a aprovação da moção de confiança ao
programa de governo. Agora no meu entendimento está aprovada a moção de
confiança e arrasta consigo a aprovação do programa do governo, porque ambos
acabam por ter as mesmas consequências”, referiu.
Em
relação à exigência constitucional que condiciona a aprovação do programa de
governo a 50 por cento mais um de votos de deputados em efectividade, Djedju
disse não ter encontrado quer na Constituição bem como no Regimento do
Parlamento essa referida cláusula.
“Este
é o problema, porque eu não encontro nenhuma disposição na Constituição e no
Regimento da Assembleia Nacional Popular que diga isto”, afirmou.
“Nós
os juristas o Direito nos ensinou que não se pode interpretar uma norma e tirar
o sentido de uma determinada norma que não tem a mínima correspondência com a
letra da lei. Se as disposições da Constituição e do Regimento tivessem
estabelecido que seria a maioria absoluta dos deputados que constituem a
Assembleia Nacional Popular, isto sim. Agora os deputados em efectividade de
função, não é a mesma coisa”, questionou, insistindo que a luz do Regimento da
Assembleia Nacional Popular (artigo 88/Nº 04), as abstenções não contam quando
se procede ao apuramento da maioria.
Questionado
se os 45 votos a favor do programa de governo são suficientes para a aprovar o
programa apresentado pelo Chefe do Governo, Djedju disse que o confronto que se
deve fazer é a maioria a favor ou a maioria contra, isto é os “votos sim” e os
“votos contra”.
“Não
há nenhum voto contra neste caso, mas sim a abstenção que não se conta, de
acordo com o Regimento. Acho que a abstenção pode parecer a violação do sentido
de voto de uma determinada pessoa. Uma pessoa que quer ser indiferente, não se
pode transformar o voto dele num voto contra, quando ele não votou contra”.
Histórico
De
acordo com os resultados da votação do programa do governo apresentado a 23 de
Dezembro, 56 deputados optaram pela abstenção e 45 votaram a favor do programa
do governo. Em comunicado à imprensa, o partido no poder (PAIGC) afirma que a
moção de confiança solicitada ao Parlamento pelo Primeiro-ministro “afinal foi
aprovada” pelos votos dos 45 deputados que se pronunciaram a favor.
Recorde-se
que o presidente do Parlamento, Cipriano Cassamá, e o próprio
primeiro-ministro, Carlos Correia, ambos dirigentes do PAIGC, reconheceram,
logo após a votação, que o documento tinha sido chumbado pelos deputados, pelo
que o Governo tem 15 dias para voltar a apresentar aos deputados o seu
programa.
Momentos
antes da votação da moção da confiança, o presidente do Partido Africano da
Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), Domingos Simões Pereira, na sua
declaração na ANP, contou o objecto de votação bem como as condições de sua
aprovação.
“S.
Excia o Senhor Primeiro Ministro submeteu a esta magna casa um pedido de
aprovação da sua moção de confiança.
Para
a sua aprovação, necessita colher pelo menos 50% +1 dos votos dos parlamentares
em efectividade de funções. Caso não consiga reunir 52 votos, não tem o
programa aprovado, o que pode ser interpretado como rejeição, não sendo contudo
nem automático nem formal.
Mais
grave é que se isso acontecer, a apresentação e discussão do programa volta a
ser agendado num prazo de 15 dias, mas nada obriga o Senhor Primeiro ministro a
submeter de novo uma moção de confiança, cabendo então à ANP a iniciativa de
votação directa para aprovação ou rejeição”
Assana
Sambú – O Democrata
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