Roger
Godwin – Jornal de Angola, opinião
A
braços com uma grave e prolongada crise económica, fruto da continuada
aplicação de sanções por parte da União Europeia e dos Estados Unidos, o
Zimbabwe decidiu adoptar o uso interno, de forma gradual, da moeda oficial
chinesa.
Esta
decisão, que resulta do encontro recentemente mantido em Harare entre os
presidentes dos dois países, é uma forma do Zimbabwe aumentar o fluxo de
circulação de moeda no circuito oficial onde, até agora, o dólar
norte-americano e o rand eram senhores absolutos, mas insuficientes para suprir
as necessidades do mercado.
O ministro das Finanças, Patrick Chinamasa, em declarações aos jornalistas, reconheceu que esta medida pode revitalizar a economia do país e sublinhou o facto de, ao mesmo tempo, o governo chinês ter aceite cancelar o pagamento de 40 milhões de dólares que o Zimbabwe deveria fazer até finais de 2015 como parte da amortização da dívida global, cujo valor total se negou a divulgar.
A China é desde há largos anos o principal investidor no Zimbabwe, país que em 2009 foi obrigado a abdicar da sua moeda nacional, passando a ter o dólar norte-americano como referência no circuito cambial.
Nos últimos cinco anos, o Zimbabwe recebeu cerca de mil milhões de dólares da China que, desse modo, se tornou no segundo parceiro comercial do país, apenas sendo superado pela África do Sul.
O yuan passa, pois, a ser aceite no circuito monetário zimbabweano lado a lado com o dólar norte-americano, a libra esterlina e o rand da África do Sul.
Outras moedas, como o euro e o dólar australiano, podem também ser usadas como moedas de pagamento, ainda que não tenham a mesma abrangência que as outras atrás referidas e tendo a sua valoração anexada ao dólar norte-americano.
No início da circulação oficial do yuan apenas os turistas chineses poderão fazer os seus pagamentos directos com esta moeda havendo, como contrapartida, a possibilidade do Zimbabwe pagar com a mesma divisa os juros da sua dívida à China.
Aos poucos, o yuan passará a ser introduzido no circuito cambial em moldes que estão a ser estudados pelas autoridades dos dois países, num processo que deverá estar concluído até finais do próximo ano.
Desta forma, a China consegue mais um espaço de penetração no continente africano graças à sua política de ajuda e de investimento, com base naquilo que são as reais necessidades dos países com quem se relaciona.
Ao rivalizar com o dólar norte-americano num país da África Austral, neste caso o Zimbabwe, a China reforça também o seu poder político no continente, colocando-se numa posição de forte concorrência em relação aos Estados Unidos, seu grande rival económico na região.
Estes desenvolvimentos acontecem numa altura em que, no Zimbabwe, já se começa a falar – e muito – nas eleições gerais já marcadas para decorrerem em 2018.
Neste momento, a antiga vice-presidente, Joice Mujuro, e o líder do principal partido da oposição, Morgan Tsvangirai, tentam um entendimento para apresentarem um projecto conjunto capaz de rivalizar com a ZANU-PF de Robert Mugabe.
Depois de ter sido afastada da cúpula da ZANU-PF, acusada de liderar uma purga interna contra Robert Mugabe, Joice Mujuro esteve uns meses afastada da cena política, chegando a admitir-se a possibilidade dela ter decidido viver no estrangeiro.
Contudo, com o assentar da poeira, Mujuro voltou à ribalta política unindo-se ao líder da oposição que, é bom recordar, já perdeu quatro votações para o Presidente Mugabe, três em eleições e uma outra em referendo à Constituição.
A ZANU-PF, que acaba de realizar mais uma conferência extraordinária, continua tranquilamente com o seu processo de reorganização interna para defender, em 2018, as posições de liderança nacional amplamente conquistadas em 2013.
Nessa conferência, que decorreu em Victoria Falls, Robert Mugabe advertiu o partido para não embarcar em aventuras perigosas “alimentadas pelos saudosistas do passado colonial”.
Mugabe aconselhou também os militares a não se meterem na política e disse que será ele a decidir quando e como sairá da política, sublinhando que não terão êxito os que escolherem a “calúnia” como “arma de arremesso contra as suas decisões”.
Depois de ter resistido a todos aqueles que o queriam ver fora da liderança do MDC-T, por ter perdido quatro vezes para Mugabe, Tsvangirai continua a ser muito contestado pelos seus pares que não lhe reconhecem capacidade política para um dia poder chegar a Presidente da República.
Essa mesma falta de liderança está agora a empurrá-lo para os braços de Joice Mujuro que, por sua vez, ainda está a tentar recuperar dos efeitos da sua pesada derrota no confronto político verbal que manteve há um ano com Grace Mugabe.
A esposa do actual Presidente, por diversas vezes, tem dito que não aspira ao lugar que o marido agora ocupa, mas a verdade é que tem crescido no país o número de pessoas que a apoiam nalguma ainda discreta rivalidade que agora mantém com Emmerson Mnangagwa, um dos dois Vice-Presidentes da República.
Embora as eleições estejam ainda a três anos de distância, o facto é que o assunto começa a estar na ordem do dia, ocupando as primeiras páginas dos jornais e sendo tema obrigatório nas conversas de bastidores mantidas por todos quantos acompanham a evolução do país.
Em política, três anos é já amanhã mas, no caso do Zimbabwe, esse lapso de tempo é demasiado lato para que se possa ter, agora, um panorama do que poderá suceder em 2018.
Foto: EPA / Aaron Ufumeli
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