William
Tonet* - Folha 8 digital, opinião
O
país está em ebulição. As igrejas, definitivamente, deixaram de ser locais de
culto seguro, segundo a “Constituição Jessiana”.
Agora,
na visão da arquitectura da paz, orar e fazer vigília, só é permitido aos
militantes e bajuladores do MPLA/JES, os demais, que ousarem pensar em
liberdade religiosa, desenganem-se, pois serão considerados arruaceiros,
incluindo os padres, podendo ser, policialmente, escorraçados do interior da
Casa de Deus, presos, torturados e ou assassinados, com base, alegadamente,
numa cartilha divina, em voga nos baús de qualquer eficiente “polícia ditatorial
comunista”. Óh exemplos à mão de semear…
Monte
Sumi, Huambo, Kalupeteka. Saiotes, São Domingos, Luanda! Oremos irmão!
E,
na dúvida, chamemos os bajuladores masoquistas e racistas, comentadores residentes
na TPA, enquanto exímios assassinos do Direito, cuja elucubração jurídica
lhes permite encontrar, na sarjeta, o preceito de vigília ilegal, quando se
apela a justiça, ante acusação caluniosa de jovens, logo, reconhecendo-se o
inverso: vigília legal, reunião de militantes e angolanos do MPLA, orando a
favor da visão estratégica do “querido líder” ou “líder escolhido”, desobrigado
a fazer cumprir a constituição, quando em causa estiverem os “frustrados”.
Assim,
no dia 12.10 a nação indígena ficou a saber que depois da queimada policial do
reduto de Kalupeteka, no Monte Sumi, onde foram massacrados pela Polícia
Nacional do MPLA, segundo provas visuais, também já não se pode rezar nas
igrejas católicas, sem autorização escrita, alegadamente, emitidas pelo Titular
do Poder Executivo ou seu representante. Importante: autorização do Papa, não
serve.
A
brutalidade, a demonstração de força, o carácter repressivo e a demonstração
de ódio demonstrada pelos agentes desta Polícia, comandadas no terreno, nos
dias 11, na Igreja Sagrada Família e 12, na Igreja de São Domingos, em Luanda,
pelo comissário Mateus André, aproximaram-me dos filmes da II Guerra mundial,
onde as semelhanças aos métodos da polícia Hitleriana, são gémeas.
Semelhanças, sim, pois abeiram-se da realidade…
Uma
pergunta. Será que o Titular do Poder Executivo, tem medo, muito medo, como
ele diz, dos “300 jovens frustrados, que não tiveram sucesso na escola e
actividade profissional”? Não quero acreditar, que na falta de argumentos de
persuação verbal, o recurso seja a lei da batota na lógica da batata, apelando
a táctica do fusil e do bastão, que tortura e assassina. Isto eu vi, ninguém me
contou e é mentiroso, quem diga não ter acontecido.
Todo
este ambiente dantesco, fez-me declinar o convite da CASA CE de poder estar na
abertura do ano parlamentar, no dia 15.10, para acompanhar o discurso sob o
Estado da Nação.
Lá,
nada é real, tudo é encenação, tudo é como se fosse um teatro, um aglomerado
verbal, onde o dito não é para ser cumprido, salvo o avolumar das injustiças,
das prisões arbitrárias, das perseguições políticas, da discriminação, dos
assassinatos de opositores, etc.
Dentro
deste quadro dantesco, recusar-me-ei, doravante, em qualquer fronteira, a
engrossar as estatísticas de “teatro de fantoches”.
A
situação politico-social do país, exige seriedade de todos os cidadãos, não se
podendo fingir que nada se passa. A sociedade quer libertar-se das grilhetas da
opressão colonial, que age, numa mão, com um carimbo democrático e noutra com
um bastão militar, para impedir o crescimento das forças democráticas.
Hoje,
não tenho medo de errar: o regime tornou-se cobarde.
É
medroso! Não é democrata. É mentiroso. Viola a própria “Constituição Jessiana”,
logo, só consegue dialogar impondo a força das armas ou a palavra dos mortos.
Veja-se
como um discurso sob o Estado da nação, passa ao largo do âmago da maior
injustiça, que calcorreia o sistema político e judicial que acusa, sem provas,
jovens por estarem a ler um livro e a vaticinarem uma mudança de regime.
O
maior objecto da democracia é vaticinar na alternância do poder, por meios
pacíficos, permitidos pela Constituição e a lei, nunca a limitação das
liberdades e o desvirtuar da justiça.
Mas
vamos ao que diz o direito quanto as acusações caluniosas e despidas de
provas, para justificar a manutenção carcerária de jovens políticos inocentes.
1)
A acusação é considerada inepta quando narra factos que manifestamente não
constituem crime ou que impossibilita, absolutamente, o exercício do contraditório
e da ampla defesa, quer por ser incompreensível, quer por omitir dados
essenciais;
2)
A acusação contra os 15+1 deveria conter e de facto não contém: quem, o quê,
quando, como e onde;
3)
A aptidão ou não da acusação deveria, ter sido, pelo órgão de instrução,
avaliada segundo a complexidade ou não da respectiva denúncia acusatória. No
caso vertente, deste arrazoado acusatório, não existe inépcia em si mesma, mas
inépcia relativamente a uma acusação específica. No caso dos autos, ao imputar
o crime aos 15+1, a SIC (Serviços de Investigação Criminal) e a Procuradoria
Geral da República de Angola, não conseguem demonstrar na denúncia elementos
essenciais, no cometimento de um ilícito, imputado a um agente, quais sejam:
a)
quem cometeria o acto delituoso;
b)
quando e como tal ocorreria (dia x, tal hora, no local tal, usando armas de
Guerra, canhões, blindados, tropas militares ou ainda blocos, lapiseiras,
lápis de carvão, etc);
c)
qual a eficácia dos meios de prova em que se funda a acusação (pericial e
testemunhal);
d)
qual o tipo penal violado pelos agentes (15+1);
e)
a acusação, principalmente, no direito penal, não pode assemelhar-se a um
texto literário, inócuo, mas ser uma peça com rigor técnico-jurídico, onde a
precisão, a lei e a norma sejam contundentes;
f)
a acusação deve, obrigatoriamente, ater-se aos factos investigados, não
podendo referir circunstâncias desconhecidas, inexistentes, não apuradas ou
irrelevantes, como ocorre, na actual acusação. Não tem competência o órgão da
acusação fazer imputações ou ilações arbitrarias;
g) A
denúncia é feita segundo a perspectiva e as possibilidades reais de quem
acusa, com base nos elementos de prova de que dispõe, e não de acordo com a
imaginação, sendo ilógico e incabível exigir-se, com a denúncia, prova da
materialidade e do ilícito ao arguido, uma vez a instauração da acção penal,
visar comprovar os factos articulados na denúncia, por meio da respectiva
instrução. O que não se pode admitir, por óbvio, é o recebimento de denúncia
manifestamente arbitrária/infundada, seja porque não vem instruída de nenhum
elemento de prova, seja porque os elementos de prova inocentam, absolutamente,
os denunciados, mas decisões políticas os mantém presos;
h)
Se realmente a denúncia omite dados importantes, o Ministério Público não
deveria acusar, por haver factos bastantes que não constituem crime, apenas se
quer forçar a sua existência, não por motivações jurídicas, mas partidárias.
Diante
deste quadro, os homens do Direito não podem continuar indiferentes a sua
banalização, por motivações a ele alheias, sob pena do futuro vir a penalizar
todas omissões.
*Diretor
do Folha 8