Em
apenas cinco anos, a metade mais pobre da humanidade perdeu 38% de sua riqueza.
Os lucros dos bancos não param de crescer. É a isso que chamam de “austeridade”
— ou “ajuste fiscal”…
Guilherme
Boulos – Outras Palavras
Uma
economia para o 1%. Com esse título, a organização não governamental britânica
Oxfam lançou no mês passado um estudo sobre as desigualdades no mundo. Pela
primeira vez na história o 1% mais rico superou em renda e patrimônio os 99%
restantes. Os dados basearam-se no Relatório anual de 2015 do banco Credit
Suisse.
O
estudo mostra que a metade mais pobre da humanidade (3,6 bilhões de pessoas)
viu sua riqueza cair 38% nos últimos cinco anos, perda de US$1 trilhão. E se
apropriou de apenas 1% do aumento da riqueza global desde 2000. Enquanto isso,
o 1% mais rico abocanhou a maior parte deste incremento.
A
riqueza da metade mais pobre equivalia em 2010 à dos 388 homens mais ricos do
mundo. Nos últimos anos, essa indecência só se agravou: as 3,6 bilhões de
pessoas mais pobres agora têm o mesmo que 62 membros do Clube dos bilionários.
Os
resultados são alarmantes. Mostram que, desde o estouro da crise em 2008, a
desigualdade tem aumentado incrivelmente. Enquanto as políticas de
“austeridade” achatam a renda dos trabalhadores e atacam os sistemas de
seguridade social, o lucro dos bancos bate recordes, assim como os ganhos de
altos executivos.
Quem
viu o lucro do Bradesco avançar 14% no ano passado, em plena recessão, não
deveria estranhar os resultados apresentados pela Oxfam. No entanto, o
relatório foi seguido de ruidosa chiadeira. Os defensores da ordem foram a
campo tentando desqualificar os dados do Credit Suisse por sua metodologia.
Alegaram, principalmente, que o uso do conceito de riqueza líquida (renda e
patrimônio, com subtração das dívidas) distorcia os resultados.
Vale
pontuar que, semanas atrás, quando o mesmo Credit Suisse fez um duro
prognóstico da recessão brasileira apontando-a como a pior da história, não
vimos nenhum articulista da direita nacional fazer suas ponderações
“metodológicas”.
De
toda forma, a própria Oxfam se encarregou de responder o questionamento sobre a
riqueza líquida, afirmando que “os 50% mais pobres são, na maioria, pessoas
lutando para sobreviver com pouca ou nenhuma riqueza para apoiá-los. Apesar
desse número incluir aqueles em dívida –riqueza negativa, mas com algum
patrimônio– é importante notar que esses são a exceção e não a regra”.
Além
disso, foi alegado que, se excluídas as dívidas do cálculo, haveria uma mudança
na distribuição da riqueza global e os números não seriam tão chocantes. Isso
não é verdade, diz a Oxfam, “já que excluindo a dívida dos 10% mais pobres, a
fatia da riqueza do 1% mais rico se modifica pouco, passando de 50,1% para
49,8%”. Ou seja, as desigualdades mundiais não se resolveriam com alteração
metodológica.
Há
quem prefira atacar os dados a deparar-se com a realidade. Compreensível.
Afinal não deve ser fácil para os amantes da ordem reconhecer que seu sistema
meritocrático da “oportunidade para todos” desandou numa plutocracia onde 1%
tem mais que todos os 99% restantes.
O
capitalismo fracassou em suas promessas. O mundo de hoje é muito mais desigual
que o do século passado. Nem todos os perfumes da Arábia, nem o cinismo do
discurso neoliberal conseguirão maquiar esta realidade.
Aí
está Bernie Sanders, pré-candidato democrata à Presidência dos Estados Unidos.
Aí está o “Podemos”, na Europa. E o fortalecimento de diversos movimentos
populares mundo afora. Será difícil silenciá-los ante a profundidade do abismo
que separa o 1% da maioria trabalhadora.
*Guilherme
Boulos é integrante da coordenação nacional do MTST. É autor dos livros Por
que ocupamos? – Uma introdução à luta dos sem-teto eDe
que lado você está? – Reflexões sobre a conjuntura política e urbana no Brasil.
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