A
corrupção em Moçambique tem a cara do Estado e o rosto das meninas e dos
meninos que deixam de ser crianças para sobreviverem
Moçambique
é um país severamente afectado pela corrupção que é influenciada pelo Governo
seguido pelos negócios das multinacionais e os traficantes de drogas, a
constatação está patente num estudo apresentado nesta segunda-feira(30) em
Maputo, onde “as práticas corruptas são tidas como sendo mais frequentes”, e
que revela que “o valor agregado dos custos de corrupção durante o período de
2002 a 2014, a preços correntes, é de 4,8 a 4,9 biliões de dólares
norte-americanos”, sem incluir os empréstimos secretos das empresas Proindicus e Mozambique Asset Management (MAM). Porém, para Adriano
Nuvunga, do Centro de Integridade Pública (CIP), “a corrupção não são números,
tem rostos. E os rostos são as meninas e os meninos deste país que deixam de
ser crianças aos 10 ou 12 anos para se dedicar a actividades outras para
conseguirem viver”.
Alfândegas, Empresa Moçambicana de Atum(EMATUM), sub-facturação das
importações dos combustíveis líquidos, processo de aquisição no sector das
telecomunicações e também na construção e obras públicas são os cinco sectores
“nos quais a corrupção é a mais acentuada” no nosso país de acordo com o estudo
intitulado “Os Custos da Corrupção para a Economia Moçambicana” e que foi
realizado pelo CIP, em parceria com o Chr. Michelsen Institute (CMI) e o Centro
de Recursos de Anti-corrupção U4.
“Há
uns anos atrás tivemos uma discussão com o Presidente Guebuza, na altura ainda
era possível falarmos sem ameaças, em Londres e nós dizíamos que os salários
baixíssimos dos funcionários públicos incentivavam a corrupção. Ele dizia que
não”, recordou-se Adriano Nuvunga, director do Centro de Integridade Pública,
durante a apresentação do estudo acrescentando que “nós mostramos que a grande
corrupção distorce todo o funcionamento da economia e da sociedade, faz com que
não haja dinheiro para pagar aos próprios funcionários, e os funcionários têm
que sobreviver. Portanto é a grande corrupção, são as decisões grandes que tem
reflexos em toda a cadeia da governação e se manifesta através da corrupção”.
De
acordo com Nuvunga para agravar ainda mais os danos ao país “(...) a corrupção
em Moçambique é muito esterilizante, porque o dinheiro sai, não é investido
aqui ainda que se tenha avançado com as construções particulares das pessoas”.
“Se
olharmos também, neste mesmo período, para as possibilidades de crescimento das
Pequenas e Médias Empresas o padrão continua o mesmo, ao invés de termos aquilo
que os ingleses chamam de entrepeneurs temos os tenderpeneurs. O
sector privado fica a espera de tenders (concursos públicos) não se
pode dizer, em nossa opinião, que teve efeito positivo só basta olharmos para o
que está a acontecer na sociedade para compreender que é como um corpo humano
que ficou sem sangue, se espremeu todo o dinheiro e se mandou para fora”,
explica o docente Adriano Nuvunga que também é docente universitário.
“(...)
As práticas corruptas nas alfândegas (entre 2002 e 2014) podem ser
identificadas como a principal causa de dano na economia” concluiu o estudo,
realizado ainda antes de se conhecerem as dívidas secretas avalizadas pelo
Estado, mas que ainda assim constatou a crescente importância das empresas
detidas pelo Estado e das Parcerias Público Privadas “como sedes de corrupção”
e aponta o caso da EMATUM como “emblemático”.
“O
nosso Presidente é uma pessoa honesta” mas Nyusi “tem que agir”
Questionado
sobre se podemos combater ou não a corrupção, o director do CIP afirmou que “os
países que o fizeram juntaram três coisas: a determinação política, reformas
corajosas, estímulo à produção e desenvolvimento (dificilmente se consegue
combater a corrupção sem produzir, ao mesmo tempo o processo produtivo é
impedido pela corrupção, não se consegue pôr o sector privado a produzir por
causa da corrupção)”.
A
seu ver “o nosso Presidente é uma pessoa honesta, e isso é um dado muito
importantíssimo. Então tem que agir, honestidade é importante mas não é
suficiente se não a coloca ao serviço desta acção”, declarou Nuvunga que citou
o novo Presidente da Tanzania como “um caso típico de vontade política” para o
combate a corrupção. Para o académico, “em todo o mundo as instituições são
dinamizadas por líderes visionários, são homens e mulheres que em posição de
liderança, bastante fortes, que sacrificam muitas coisas para desenvolver as
instituições”.
Inquirido
sobre como surge a vontade política Adriano Nuvunga não tem dúvidas que “tem
que ver com a vontade do líder” e dá como exemplo “o Presidente Samora não
roubava e as pessoas não roubavam aqui, os mais velhos que o digam. A vontade
dele era essa que não se roubasse a coisa do povo e tudo, pouco ou muito, fosse
colocado ao serviço do desenvolvimento, de forma correcta ou não mas aquilo que
era a dinâmica era essa e as coisas rapidamente mudaram. E a dinâmica hoje é
outra, então a questão da vontade é central”.
O
CIP enfatizou que o informe da Procuradora Geral da República ao Parlamento, em
2015, não reflectiu o retrato real da corrupção no nosso país pois não
mencionou os casos que envolvem grandes figuras do Governo. “É a grande
corrupção, feita pelos grande chefes que deixa passar a pequena corrupção para
permitir que não seja questionado. Se você tem um Presidente que não é corrupto
você nunca vai falar com ele sobre assuntos de corrupção. É a grande corrupção
que se sustenta numa base de corrupção administrativa generalizada para
permitir que lhe facilitem as várias operações de prática de corrupção. O
inverso não acontece, é sempre a corrupção grande que precisa de deixar que a
corrupção pequena aconteça para os seus expedientes funcionarem” clarificou
Nuvunga.
O
estudo do CIP, em parceria com o CMI e o Centro de Recursos de Anti-corrupção
U4, concluiu ainda que “o custo da corrupção em Moçambique não é apenas
monetário, económico ou social (…) Quanto mais evidente for a imagem de Moçambique
como de um Estado corrupto e de facilitador de tráfico e fluxos financeiros
ilícitos, maior será o desafio de os líderes políticos moçambicanos convencerem
o mundo do contrário”.
Adérito
Caldeira - @Verdade
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