A
hora é para enaltecer (festejar ainda não) a gloriosa e imortal luta dos nossos
jovens activistas. Eles, como nós, como muitos outros, como cada vez mais,
lutamos pela liberdade, pela democracia e por um Estado de Direito. À sombra da
legítima e humana euforia, o regime aproveitou para nos enviar (se calhar
aconteceu também com outros) uns tantos recados e avisos.
Orlando
Castro* - Folha 8, opinião
Sim.
Temos medo, senhor Presidente José Eduardo dos Santos. Mas sabemos como o
combater, como o vencer. Na mesma proporção em que (usando os jovens activistas
como exemplo do seu poder) o senhor aumentou o medo em Angola, nós aumentamos a
nossa resistência a esse vírus canibalesco que alimenta o seu regime.
Como
sempre, o regime de sua majestade o rei de Angola, José Eduardo dos Santos, não
aceita que no seu reino existam pessoas que pensem de forma diferente. Não
admira, por isso, que o Folha 8 esteja para o regime como o semanário francês
“Charlie Hebdo” estava, em Janeiro de 2015, para os fanáticos… pouco importa se
eram árabes, europeus ou africanos.
Por
cá, a liberdade de expressão (quando não coincide com a verdade oficial)
representa um atentado contra a segurança do Estado e as Redacções livres são
um bando de malfeitores. Por cá, ou seja por Angola, todos os poderes
instituídos defendem oficialmente a liberdade de expressão e de imprensa… nos
outros países. A nível interno isso é uma chatice.
E
por falar em jornalistas lusófonos, relembremos que o jornalista Carlos Cardoso
foi assassinado, em Moçambique, no dia 22 de Novembro de 2000 porque, como
Jornalista, fazia uma séria investigação à corrupção que rodeava o programa de
privatizações apoiado pelo Fundo Monetário Internacional.
Para
Mia Couto, “não foi apenas Carlos Cardoso que morreu. Não mataram somente um
Jornalista moçambicano. Foi assassinado um homem bom, que amava a sua família e
o seu país e que lutava pelos outros, os mais simples. Mas mais do que uma
pessoa: morreu um pedaço do país, uma parte de todos nós”.
Embora
sejam uma espécie em vias de extinção, os Jornalistas continuam (em todo o
mundo) a ser uma espinha na garganta dos ditadores.
Por
cá, o regime de José Eduardo dos Santos – perante a criminosa indiferença da
comunidade internacional – já elaborou o seu plano e já estão contratados os
assassinos, para eliminar – sem deixar rasto – os mais incómodos. Nada de
cadeias, de julgamentos, de “habeas corpus”.
No
Folha 8 o principal visado é, continua a ser, o nosso director, William Tonet.
Razões? A palavra aos energúmenos do regime: “Pela rudeza dos escritos, no seu
jornal, onde não falta a regularidade de publicação de segredos do Estado,
calúnia e difamação, contra o camarada Presidente José Eduardo dos Santos, sua
família e dirigentes do partido, o MPLA, e membros do governo”.
O
tom ameaçador sobe sempre ao seu mais alto patamar quando algum facto ou
acontecimento pode indiciar minimamente uma vitória, uma pequena vitória, do
Folha 8. A gloriosa e imortal luta dos nossos jovens activistas e a vitória,
embora parcelar, dos direitos humanos agora consumada trouxeram ao atrofiado
cérebro do regime um, entre muitos outros de muito mais relevo, fantasma
chamado Folha 8.
Segundo
os recados do regime – por coincidência hoje mesmo chegaram alguns – devemos
“parar de falar mal do camarada Presidente, porque é graças a ele” que nós
(“cabrões de merda”, segundo o vernáculo português dos sipaios) “ainda estamos
vivos”!
Carlos
Cardoso, segundo Mia Couto, morreu porque “a sua aposta era mostrar que a
transparência e a honestidade eram não apenas valores éticos mas a forma mais
eficiente de governar”. É uma boa causa para morrer.
Carlos
Cardoso morreu, “por ser puro e ter as mãos limpas”. Morreu “por ter recusado
sempre as vantagens do Poder”. Morreu por ter sido, por continuar a ser, o que
muito poucos conseguem: Jornalista. Está a ver senhor Presidente Eduardo dos
Santos onde está a força da nossa razão?
“Liquidaram
um defensor da fronteira que nos separa do crime, dos negócios sujos, dos que
vendem a pátria e a consciência. Ele era um vigilante de uma coragem e
inteligência raras”, afirmou Mia Couto num testemunho que deveria figurar em
todos os manuais de Jornalismo, que deveria estar colocado em todas (apesar de
poucas) Redacções onde se faz Jornalismo. Como se compreende, qualquer
semelhança entre Jornal de Angola, TPA, RNA e Angop com Jornalismo é mera e
casual coincidência.
O
sentimento que nos fica é o de estarmos a ser cercados pela selvajaria, pela
ausência de escrúpulos dos que enriquecem à custa de tudo e de todos. Dos que
acumulam fortunas à custa da droga, do roubo, do branqueamento de dinheiro e do
tráfico de armas. E o fazem, tantas vezes, sob o olhar passivo de quem devia
garantir a ordem e punir a barbárie.
Por
cá os algozes do regime continuam apostados em matar os mensageiros. Ainda não
se convenceram que matar o mensageiro não resulta. A liberdade continua viva.
*Orlando Castro é diretor-adjunto do Folha 8
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