sexta-feira, 5 de agosto de 2016

António Guterres à frente na segunda votação para secretário-geral da ONU



O ex-primeiro-ministro português António Guterres ficou à frente na segunda votação secreta ocorrida hoje entre os membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas para eleger o próximo secretário-geral da organização, disseram fontes diplomáticas à Lusa.

Guterres teve 11 votos "encoraja", dois votos "não tem opinião" e dois "desencoraja".

O resultado é menos positivo do que o da primeira votação, em que nenhum país desencorajava a candidatura do antigo primeiro-ministro português.

Durante a votação, cada um dos 15 membros do conselho indicou se "encoraja", "desencoraja" ou "não tem opinião" sobre os 11 candidatos.

Nesta segunda votação, um candidato teve um comportamento surpreendente: Vuk Jeremic, da Sérvia, que alcançou o segundo lugar com oito votos favoráveis, mas quatro "desencoraja" e três sem opinião.

Em terceiro lugar, ficou Susana Malcorra, também com oito votos "encoraja", mas seis votos desfavoráveis e apenas um "sem opinião".

O ex-Presidente esloveno Danilo Turk, que tinha ficado em segundo lugar na primeira votação, a 21 de julho, desce agora para quarto lugar com sete votos positivos, cinco negativos e três sem opinião.

Irina Bokova, que cumpre os dois requisitos que têm sido indicados nesta eleição - ser da Europa de Leste e mulher -, tem um resultado dececionante, com sete votos de desencorajamento, o mesmo número de países que encoraja a sua candidatura (apenas um não indicou opinião).

No fim da lista, surge Helen Clark, da Nova Zelândia. Os últimos lugares ficaram com Miroslav Lajcak, da Eslováquia, Christiana Figueres, da Costa Rica, Natalia Gherman, da Moldávia, e Igor Luksic, de Montenegro.

Vesna Pusic, da Croácia, desistiu da eleição na quinta-feira, restando agora seis homens e cinco mulheres na corrida.

A organização espera ter encontrado o sucessor de Ban Ki-moon, que termina o seu segundo mandato no final do ano, durante o outono.

AYS // EL - Lusa

Angola. REGIME CENSURA E DETÉM JORNALISTAS



Enquanto vários órgãos de comunicação social angolanos ligados a figuras do aparelho governativo, receberam “orientações superiores” à última hora, orientando a censura de notícias sobre a visita em Angola, de um governante da Coreia do Norte, a UGP deteve dois jornalistas no Zango.

 Pedrowski Teca com SC - Folha 8

Oe-mail de censura sobre a visita do ministro norte-coerano, que surgiu como uma bomba em várias redacções dos órgãos de comunicação social nacional, deixou os jornalistas perplexos.

A “orientação superior” foi baixada na quinta-feira, 4 de Agosto, quando o vice-ministro dos Negócios Estrangeiros da Coreia do Norte, Sin Hong, chegou em Luanda.

A visita diplomática do dirigente norte-coreano tem como objectivo o reforço da cooperação entre aquele país e a República de Angola.

O comunicado de imprensa divulgado pelo Ministério das Relações Exteriores de Angola, anunciando a visita do vice-ministro norte-coreano, não detalhou os pormenores desse reforço da mesma cooperação.

O distanciamento do regime angolano em relação ao de Pyongyang é evidenciado no facto de Sin Hong, que permanecerá no país por um período de quatro dias, ter marcado um encontro de trabalho com a secretária de Estado para a Cooperação, Ângela Bragança, ao invés de uma figura equivalente ou superior ao seu cargo.

Em Abril deste ano, o embaixador da Coreia do Norte em Angola, Kim Hyeong-il, revelou que no final de 2015, o seu governo havia enviado cerca de 180 médicos de várias especialidades para trabalharem em Angola, e que mais de 30 técnicos estarão a caminho do país no âmbito do acordo de cooperação entre os dois países, que também abrangem os sectores energéticos, telecomunicações e agricultura.

É de recordar que no dia 18 de Junho, o embaixador Kim Hyeong-il visitou a agência de notícias de Angola, Angop, onde solicitou que aquele órgão de comunicação social do Estado, e outros, passassem a fazer cobertura noticiosa mais favorável para o seu país.

O Folha 8 fez uma busca dos artigos publicados na Angop, na quarta e quinta-feira, 4 e 5 de Agosto, na secção “Minuto-a-minuto” e notou-se que não se fez nenhuma cobertura noticiosa sobre a chegada do dirigente norte-coreano.

Jornalistas detidos por militares da UGP

Dois jornalistas angolanos, um afecto ao semanário Terra Angolana e outro à Rádio Despertar, foram detidos por militares da Unidade de Guarda Presidencial (UGP) hoje, sexta-feira, dia 5, quando faziam uma reportagem no Zango 2 e 3, especificamente nas zonas onde foram demolidas mais de 4 mil residências.

Os jornalistas, segundo informou Francisco Tchicundia, vítima ao serviço da emissora Despertar, aproveitavam a presença de uma comitiva de deputados da UNITA que se deslocaram àquela localidade para constatar o estado em que se encontram as famílias desalojadas forçadamente no sábado último, dia 29 de Julho.

“A intenção deles era justamente confiscarem a máquina fotográfica do colega do Terra Angolana porque, conforme nos informaram, receberam orientações para não permitirem que se fizesse fotografias das casas destruídas”, contou o jornalista ao F8.

Solidários com os jornalistas, os deputados decidiram acompanhar os profissionais da comunicação social até à unidade dos militares situado na Zona Económica Especial Económica. Na “guarnição da UGP”, tanto os jornalistas como os deputados foram interrogados ao longo de 45 minutos seguidos, violando assim as imunidades previstas constitucionalmente aos representantes do povo na Assembleia Nacional.

“Disseram que ninguém, nem os deputados, estão autorizados a visitar aquelas pessoas”, transmitiu Francisco Tchicundia.

Depois do interrogatório, os militares realizaram uma verificação aos meios informáticos dos jornalistas e apagaram algumas fotografias feitas por ambos.

Não houve agressão física, tal como veiculado em alguns órgãos de imprensa. No final da “arbitrariedade”, um sargento ainda pediu desculpas aos deputados e jornalistas, alegando que apenas estava a cumprir ordens superiores.

Leia mais em Folha 8

Angola. Milhares de casas demolidas por militares nos arredores de Luanda



Uma delegação da UNITA, o maior partido da oposição angolana, visitou hoje três bairros do Zango III, arredores de Luanda, onde milhares de casas estão a ser demolidas, segundo os moradores por militares.

A delegação da direção do partido, que incluiu igualmente quatro deputados, pretendia constatar no terreno as reclamações de cidadãos que viram as suas casas demolidas, há cerca de uma semana, supostamente sem aviso prévio e sem justificação dada.

Alguns dos afetados contaram à agência Lusa que as demolições iniciaram na passada sexta-feira, nos bairros Walali e Floresta, onde pelo menos 4.000 casas, de vários tipos, foram demolidas por militares que informaram apenas estarem a "cumprir ordens superiores".

Segundo as vítimas, os moradores afetados recorreram à administração da zona para obterem uma explicação sobre o sucedido, mas não lhes foi dada resposta.

No decorrer da visita, dois deputados e um fotógrafo foram obrigados a acompanhar dois militares, que supostamente fazem a guarnição do local, por suspeita de estarem a ser feitas imagens do local.

Em declarações à Lusa, o secretário para os Direitos Humanos da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), Joaquim Nafoia, disse que a delegação pretendia chegar até ao local das demolições, cuja passagem está vedada ao público, e ouvir os responsáveis desses atos, quando os militares se aproximaram do grupo e exigiram que os deputados os acompanhassem.

Joaquim Nafoia disse que com a informação recolhida será feito um relatório e o assunto deverá ser levado ao parlamento angolano pela bancada parlamentar da UNITA.

"São quatro mil residências demolidas em três bairros, a população avançou-nos o número de três mortos e alguns feridos desde que começaram as demolições", disse o secretário para os Direitos Humanos da segunda maior força política no país, que classificou como "triste este tipo de situações".

O dirigente da UNITA referiu que apelaram às pessoas para terem "muita calma, prudência e inteligência" no tratamento deste caso.

A Lusa constatou no local a presença de um grupo numeroso de pessoas, que dizem ter já recorrido à administração municipal, ao Governo da Província de Luanda, mas sem solução aparente para o caso.

NME // EL - Lusa

PALAVRAS CONTRA O DITADOR



Erdogan prende jornalistas, fecha jornais, silencia rádios e canais de televisão, para o carrasco são todos culpados do crime  de palavra dada. Contra a ameaça, há que armar a palavra

Artur Pereira – jornal i, opinião

Uma imagem vale mais que mil palavras. Não sou dessa opinião.

A imagem aprisiona as palavras, fecha-as sobre si mesmas. Cristaliza-as e suspende a imaginação, que é o ingrediente das melhores das palavras.

Mas libertas, multiplicam-se até ao infinito reconhecido, até ao fundo do ser e do saber que são duas coisas gémeas. Vão para além do entendimento, ao sítio onde os lerdos e alucinados têm palavras acoitadas.   
  
A imagem é a reconstrução representada, soletrada e desenhada por nós. A imagem é aquilo que a minha palavra quiser.

A palavra é nome feminino, como luz. Tem uma unidade que faz sentido, e que nos dá som à voz, por isso quando queremos dar voz aos que a não têm damos-lhe a palavra liberdade que é feminina também.

Na escrita,  dizem os entendidos que é delimitada por espaços brancos, esquecem que é aí que se guardam todas as palavras à espera de vez.

Toda a imagem resulta da palavra aprendida. Um cego vê com a palavra, tal como a criança que aprende a ler para dar sentido ao que pode ver. 

Para mim, a palavra zombeteira, esperta como um alho, a dar peito ao enjeitado, a voar no vento sem medo do censor nem do jumento, para mim, a palavra é que cria mil imagens, as que cada cabeça livre quiser. 

O ditador Erdogan bem pode tentar fechar Istambul, alterar o curso do Bósforo, convidar a morte para ensombrar os bazares, que nunca poderá controlar as palavras sussurradas em sopros de resistência, vento ardente de clandestino, senha de esperança.

Erdogan declarou as palavras suas inimigas. Quere-as presas, medrosas e domesticadas, só tolera o eco do seu uivo. Erdogan prende jornalistas, fecha jornais, silencia rádios e canais de televisão, para o carrasco são todos culpados do crime de palavra dada. 

Por isso, contra a ameaça, por solidariedade e princípio, há que armar a palavra. Utilizá-la com brio, com indiferença, com ira, com vontade, com ambição, pensando noutra coisa. A palavra como se fosse pão. Amassar a palavra nos dias frios e nos dias de verão, com sol, com humidade, com chuva gelada.

Há que escrever sem vontade de escrever contra a corrente.

Há que moldar a palavra com as mãos, com a ponta dos dedos, com os braços, com os ombros, com força e com sensibilidade. Há que amassar o verbo com rancor, com tristeza, com recordações, com o coração feito em pedaços, com os mortos. Há que escrever pensando no que se vai fazer depois. Há que desenhar a letra como se não se fosse fazer nada, nunca mais, para sempre, depois.

Há que crescer a palavra com farinha, com água, com sal, com levedura, com manteiga, com sésamo com papoilas. Há que untar a palavra sagrada.

Há que dar palavra com coragem, com plano, com improvisação, com incertezas. Com a certeza de que se vai falhar. Com a certeza de que se vai sair bem. Com pânico de não se o poder fazer nunca mais, que as palavras se possam queimar, que saiam cruas, que ninguém goste. Há que amassar, escrever todas as semanas, de todos os meses, de todos os anos, sem pensar que se terá que escrever todas as semanas de todos os meses, de todos os anos, há que unir as palavras como se fosse a primeira vez.

Há que misturar palavras como beijos antes de partir de viagem, e no regresso, e durante a viagem há que pensar em reescrever a palavra, quando se volte a casa. Há que juntar o chumbo das letras sem humildade, com empenho, com ódio, com desprezo, com ferocidade, com tesão. 

Há palavras que ressuscitam povos e despertam os homens adormecidos no fundo dos vulcões. Como se tudo estivesse prestes a acabar, no limite. Revolucionários a inventar outras palavras. Como tudo estivesse prestes a começar. Há que escrever para viver, para que os outros vivam, porque se vive, para seguir vivendo. Palavras de comer. Palavras que matam a besta e rasgam o selo. 

Façamos o que tem que se fazer. Escrever. Amassar o pão. Não há diferença.

Portugal. Viagens à borla. Governo fecha caso com código de conduta que não vai mudar nada



Casos como o que envolve o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais está previsto na lei há décadas. Qualquer código de conduta que venha a ser criado será redundante.

O governo anunciou ontem à tarde a criação de um código de conduta para por fim a dúvidas éticas e legais como as que surgiram com a oferta por parte da Galp de duas viagens ao secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Fernando Rocha Andrade. Atualmente já existe um código de conduta para a Autoridade Tributária, que é visto por muitos juristas como redundante, uma vez que a lei continuará a falar mais alto e, essa, já define o que há a fazer em casos como este, há várias décadas.

O anúncio da criação de um código de conduta foi a forma encontrada pelo executivo para tentar “encerrar” um caso que começou por envolver um governante e já arrastou outros dois: os secretários de Estado João Vasconcelos e Jorge Costa Oliveira. Augusto Santos Silva, ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros - que substitui o primeiro-ministro nas férias deste -, admitiu que no limite poderia não ser aceitável o comportamento de Rocha Andrade, defendendo que as “dúvidas” ficaram dissipadas com a abertura demonstrada por este governante, bem como por João Vasconcelos e Jorge Costa Oliveira, para devolver o dinheiro das deslocações a França. Em causa estão viagens oferecidas pela Galp a membros do governo para que assistissem a jogos da seleção portuguesa no Euro 2016.

O esclarecimento do executivo liderado por António Costa acabou por levantar ainda mais dúvidas do que as que já existiam - nomeadamente com a referência ao novo código de conduta.

Santos Silva garante que não foi gesto de cortesia Começando por garantir que os convites não foram gestos “de cortesia de A em relação a B”, mas sim “uma iniciativa pública de apoio à seleção nacional de futebol promovida junto de várias personalidades e custeada por um dos patrocinadores da Federação”, Santos Silva disse que é preciso evitar que casos menores se transformem em casos maiores: “A lei diz e bem que havendo uma proibição geral de aceitação ou entrega de ofertas há gestos de cortesia que são aceitáveis por razões que têm a ver com os usos e costumes ou com a adequação social. Como aparentemente isto suscita algumas dúvidas de interpretação, o Conselho de Ministros aprovará ainda este verão um código de conduta cuja norma relativa a estas matérias será taxativa”.

Um código para regular o que já está previsto na lei “Estas situações estão previstas há mais de 100 anos e têm estado sempre previstas, e nem sequer é só no Código do Procedimento Administrativo, é na legislação criminal. Quer no Código Penal, quer em legislação avulsa”, explicou ao i o advogado Paulo Saragoça da Matta, esclarecendo que “a criação de um novo código [de conduta] é algo que não faz qualquer sentido”.

Saragoça da Matta referiu ainda que este anúncio faz parecer que o novo código “iria valer mais do que o que já está na lei há décadas”.

Não seria, porém, a primeira vez que nos últimos anos se criaria um código de conduta redundante. Ainda no governo de Passos Coelho foi criado um documento idêntico. 

Consultando o Código de Conduta dos Trabalhadores da Autoridade Tributária (AT) - criado no executivo de Passos Coelho - conclui-se também que não é aceitável o recebimento de qualquer oferta, sobretudo por parte de um dos maiores contribuintes portugueses, como é o caso da Galp. 

O caso que envolve Rocha Andrade ganhou ainda outras proporções pelo facto de a empresa ter interposto recursos hierárquicos (para o ministério) por discordâncias em relação aos impostos extraordinários que tem a pagar. Em 2014, aliás, esse imposto foi aplicado pela primeira vez à Galp, REN e EDP, sendo que só a Galp conseguiu não pagar os 100 milhões de euros. O imposto correspondente a 2015 é de 150 milhões de euros.

Se se tivesse por base o Código de Conduta da AT a resposta a qualquer dúvida seria clara: “Os trabalhadores não devem pedir ou aceitar presentes, hospitalidade ou quaisquer benefícios que, de forma real, potencial ou meramente aparente, possam influenciar o exercício das suas funções ou colocá-los em obrigação perante o doador. A aceitação de ofertas ou hospitalidade de reduzido valor (objetos promocionais, lembranças, …) não é censurável se não for frequente, estiver dentro dos padrões normais de cortesia, hospitalidade ou protocolo e não for suscetível de comprometer, de alguma forma, ainda que aparente, a integridade do trabalhador ou do serviço”.

E foi a esta exceção - idêntica à que está definida na lei - a que Rocha Andrade se tentou agarrar desde que o caso foi tornado público pela revista “Sábado”: “O convite foi natural, dentro da adequação social [e por isso não houve] conflito de interesses”. 

Carlos Diogo Santos – jornal i

Portugal. Médicos. TRANSPARÊNCIA PARA TODOS!



José Manuel Silva* - Jornal de Notícias, opinião

Um título errado da TSF, entretanto corrigido, deu origem a mais uma notícia "negra" para os médicos, com base afinal numa clara "não notícia".

Esclareço. No que se refere aos apoios concedidos na área da Saúde, os destaques das notícias levam as pessoas a crer que apenas a indústria farmacêutica concede patrocínios, embora esta naturalmente prevaleça, e que só os médicos são os beneficiados. Não é verdade. Conforme o mais recente comunicado do Infarmed, há oito grupos de entidades a conceder patrocínios e há catorze grupos de entidades a recebê-los, predominando as "sociedades médicas/associações de investigação/de estudos clínicos", não os médicos individuais, e incluindo associações de doentes, que o Estado, vergonhosamente, não apoia.

Nestes "apoios" estão incluídas aquilo que são normalíssimas relações comerciais, como a inserção de anúncios em revistas científicas, a compra de espaços de stand e a distribuição de pastas, blocos e esferográficas em congressos, etc.

Será que alguém acharia normal que uma lei impusesse uma listagem num portal em que todas as empresas tivessem de declarar os anúncios que publicam nos órgãos da Comunicação Social, festivais de música e eventos desportivos, etc.? Provavelmente, não. Pois bem, na Saúde isso acontece e é considerado como "patrocínio" de "caráter duvidoso"!
Há congressos com custos superiores ao salário mensal líquido de um médico especialista (1500 euros) e os apoios que os médicos recebem para a sua formação, que o Estado não concede, refletem-se em benefício para os doentes.

É curiosa a ênfase que é colocada na diferença entre o montante declarado pelas entidades patrocinadoras e o valor declarado pelas entidades recetoras, quando essa diferença não tem significado absolutamente nenhum, resultando apenas da burocrática estupidez da lei que obriga a uma dupla declaração dos mesmos atos! Os patrocinadores declaram sempre, os recetores esquecem-se com frequência, pois não faz parte da sua rotina quando recebem um apoio esporádico. Está tudo declarado e não há nada a esconder, nem quaisquer consequências fiscais ou legais. Porquê tanto ruído?

Quando teremos um legislador que simplifique a legislação, evitando a obrigação da dupla declaração e todas estas desnecessárias e estéreis confusões?

Simultaneamente, porque cultivo a transparência e pela coincidência de alguns secretários de Estado receberem apoios para irem a jogos de futebol, lançamos um desafio a este Governo para que, com as devidas adaptações, generalize o espírito e a letra do art.º 159 dos decretos-lei 176/2006 e 123/2013 a todos as pessoas que ocupam cargos públicos, de eleição ou nomeação, para que população e jornalistas possam, de forma transparente, consultar igualmente as respetivas listagens de apoios e patrocínios. Fica o desafio.

*Bastonário da Ordem dos Médicos

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Portugal. Educação. "Por trás dos colégios, há forças que têm muito poder" – Mário Nogueira



Secretário-geral da Fenprof desde 2007, Mário Nogueira não baixa os braços em relação aos direitos dos professores e pensa que os mesmos reconhecem essa luta. Numa entrevista exclusiva ao Notícias ao Minuto, o sindicalista dá "nota positiva” ao estado atual da educação e não se escusa a comentar polémicas.

Mário Nogueira tem apenas um objetivo: chegar ao final do seu ‘mandato’ confiante de que fez tudo o que estava ao seu alcance pela classe dos professores. Numa entrevista exclusiva concedida ao Notícias ao Minuto, o secretário-geral da Fenprof passa em revista os últimos anos, faz as contas ao desempenho de ministros, avalia o Governo de Costa e é contundente na análise que faz à polémica dos contratos de associação.

Está no Sindicato desde 2007. Pensa que os professores estão satisfeitos com o trabalho da Fenprof até agora?

Espero que estejam insatisfeitos, porque nós estamos insatisfeitos. Acho sempre que nós temos de fazer sempre mais e melhor e, se não for esse o nosso desafio, acabamos por nos acomodar, que é o que faz muita gente quando está no desempenho de uma função qualquer. Acomoda-se, satisfaz-se com o que tem e não faz por fazer melhor. Agora, não tenho dúvidas (...) que reconhecem na Fenprof aquela que mais luta pelos seus direitos, que mais toma posição sobre as diversas matérias e que melhor entra em fases de negociação com propostas com que se identificam.

Quais foram as lutas mais difíceis que já travou até agora? Algum ministro com quem tenha tido uma batalha mais dura?

Desde que sou secretário-geral da Fenprof, este é o quarto ministro com que lido. Foi a Dra. Lurdes Rodrigues, que já a apanhei em três anos do seu mandato, depois durante pouco tempo a Dra. Isabel Alçada, depois o professor Nuno Crato... Diria que são situações diferentes. Por exemplo em relação ao professor Nuno Crato praticamente nunca apareceu durante quatro anos em reuniões. Delegava sempre no seu secretário de Estado. (…) Com a Dra. Lurdes Rodrigues, penso que essencialmente havia um problema, admito sim relacional, mas que não era com a Fenprof ou connosco em particular.

Voltando ao exemplo que deu de Nuno Crato, pode concretizar?

"A sensação que nós tínhamos é que eles consideravam que os sábios estavam todos no Ministério"

O que acontecia era que chamavam as organizações sindicais e numa sala projetavam na parede um Power Point a dizer como é que ia ser. Perguntavam se tínhamos alguma pergunta a fazer e, normalmente, perguntas tínhamos muitas mas as respostas deles eram sempre a justificar a opção e portanto não havia negociação. (...) A sensação que nós tínhamos é que eles consideravam que os sábios estavam todos no Ministério. (...) Este ano, houve negociação (…) Aquilo que nós notamos desta equipa ministerial para a anterior é precisamente esta diferença em querer ouvir aquilo que outros têm a dizer.

E comparativamente a Maria de Lurdes Rodrigues?

Nessa altura não diria que foi por falta de negociação, porque houve muitas reuniões. Aliás, foi um processo em que se estiveram a alterar muitos aspetos importantes da vida dos professores, como por exemplo o estatuto da carreira de docente. Havia um sentimento de injustiça que criava uma indignação enorme, porque era posto em causa o empenho dos professores, a sua dedicação, o seu trabalho. Acho que esse mandato, do primeiro governo do engenheiro Sócrates, e portanto da Dra. Maria Lurdes Rodrigues, foi um mandato em que as pessoas se sentiram muito injustiçadas e essa indignação acabou por se transformar nas grandes marchas que se realizaram.

(...) Quando a pessoa está com fome, qualquer coisa lhe sabe bem. Perante o deserto que nós tínhamos, há aqui algum oásis

Que nota dá à Educação agora?

Não gosto de dar notas. Penso que até agora - até pelas alterações em relação ao que podemos comparar - a avaliação que faríamos era sempre uma avaliação positiva, do ponto de vista da educação. Por exemplo: acabaram alguns dos focos de grande conflito com os professores, acabou aquela prova da PACC, acabaram as bolsas de contratação ao BCE (…) Depois há aspetos que não são propriamente do Ministério: os salários estão a ser repostos na íntegra até outubro, houve negociação e abertura para negociação. Às vezes é a tal coisa: quando a pessoa está com muita fome, qualquer coisa lhe sabe bem. E, portanto, diria que estamos a falar de qualquer coisa, mas perante o deserto que nós tínhamos, há aqui algum oásis. 

E ao atual ministro, que nota lhe dá?

Não dou nota nenhuma, porque acho que os ministros são todos iguais. Enquanto pessoa não lhe dou nota nenhuma, até porque só nos reunimos com ele três vezes até agora. Os ministros cumprem as medidas que o Governo define para o setor. Penso que que o ministro Tiago Rodrigues cumpre aquilo que são as decisões do Governo, tal e qual como Nuno Crato as cumpria – as decisões é que são diferentes. (...) Penso que o ministro, naquilo que tem sido o essencial do debate político, tem-se saído de uma forma que é de quem tem conseguido argumentar e com argumentos sólidos.

Pior do que o anterior fez, só o anterior conseguiria continuar a fazer

Já agora, como avalia estes meses do Governo de António Costa?

Diria que é melhor do que o anterior - sem dúvida - mas também acho que pior do que o anterior fez, só o anterior conseguiria continuar a fazer. E, portanto, acho que isso não acontece e espero que a Direita fique por muitos e bons anos na oposição.

Falando sobre as medidas concretas de Tiago Brandão Rodrigues e dos contratos de associação. Estamos a falar de apenas 80 colégios. Como se justifica este fenómeno?

Por trás dos interesses dos colégios, há forças que têm muito poder neste país. A começar nos partidos que foram governo até há pouco tempo e a acabar na Igreja Católica

São 80 colégios que iriam levar por ano 140 milhões de euros, não estamos a falar de uns trocos. Estamos a falar de uma situação que tem levado ao enriquecimento de muita gente, de uma forma que até há indícios que poderá ser ilícita e por isso até há um grande processo no Ministério Público de averiguação (…) A questão é simples: por trás dos interesses dos colégios, há forças que têm muito poder neste país. A começar nos partidos que foram governo até há pouco tempo e a acabar na Igreja Católica. Portanto não estamos a falar propriamente de uns diretores de uns colégios 'que e tal andam aí a fazer barulho'. E porque a discussão hoje é a outra: aquilo que está aqui em discussão não é o ensino particular e corporativo. Este ensino sempre existiu e há de continuar a existir, tem um papel importante, não acho que tenha nem mais ou menos qualidade do que a escola pública (...) Hoje o discurso já não são os contratos de associação mas sim ‘nós é que temos qualidade e o que se deveria fechar é o que não tem qualidade’ - diz a Dra. Cristas e, por isso, fecham-se as escolas públicas. Acho isto curioso porque toda a gente diz que Portugal tem hoje nos seus jovens a geração mais bem qualificada de sempre.

Não são os colégios privados que estão em causa?

Para mim isto não põe em causa os colégios privados. O que põe em causa de facto é esta discussão dos contratos de associação, porque toda a gente sabe que há vários tipos de contrato que o ensino particular e o Estado fazem. (…) Os contratos de associação têm um objetivo que é: a Constituição da República obriga o Estado, no seu artigo 65, a ter uma rede de estabelecimentos. (…) Ou seja, fez uma parceria com privados para que estes se associassem à resposta pública. Mas é uma parceria que é feita enquanto o Estado não cumprir aquilo que a Constituição o obriga, que é a ter suficiência de resposta. (…) A única novidade que este Governo fez foi escrever que em relação a isto, iriam ser fiscalizados os termos do contrato. Alguém tinha de fazer isso!

E como ficam os professores sindicalizados dos colégios nesta situação? Não receia que se sintam 'órfãos'?

Os professores destes colégios sentem-se tão órfãos como os milhares de professores que foram para a rua ao longo destes anos. Eu tenho ouvido pessoas do PSD e CDS, gente que foi responsável pelo desemprego de milhares e milhares de professores e agora estão com lágrimas – eu nem quero dizer que são de crocodilo porque, coitados, até ofendo os crocodilos – que de facto deveriam ter vergonha. (…) Por exemplo, o ministro Nuno Crato foi condenado em mais de 700 processos no tribunal a ter que pagar as indemnizações aos professores. (...) Agora fazem esta campanha toda e não é porque querem lá manter os professores, que eles querem lá saber dos professores. Querem é saber do dinheirinho que têm metido ao bolso. E usam este medo dos professores, que é legítimo, para conseguirem manterem o que tem.

O que vai ser deles?

Então e o que é que foi feito dos outros professores todos? Onde é que estão? É um problema, mas onde estão os outros professores também? Não se pode pensar assim. Neste caso concreto, não pode haver, mas nos outros não tem mal que tivesse havido. Ora não podemos dizer isso não é. (…) Diria que nem sequer há aqui uma supressão de emprego, mas sim uma transferência de emprego de colégios para escolas. Agora aquilo que é verdade e que eu lhe posso dizer é: preocupa-nos isto e estamos a acompanhar.

Leia a segunda parte desta entrevista na EDIÇÃO DA TARDE da Newsletter do Notícias ao Minuto.

Inês Esparteiro Araújo – Notícias ao Minuto

ENQUANTO HÁ FORÇA



Expresso Curto a abrir diferente, depois vira o disco e toca o mesmo. É o Expresso, caramba! Mas olhem que comparativamente a outros podemos dizer com toda a propriedade: do mal o menos.

“Não há estrelas no céu p’ra d’ourar o meu país”… Rui Veloso canta assim algures numa das milhentas dele. Pois não. Não há estrelas e o breu invade tudo e todos a nível planetário. O neoliberalismo-fascista está tomando tudo e todos, Portugal vai por arrasto.

“Aprende a nadar companheiro”… Sérgio Godinho. A liberdade já passou por aqui. Urge retomá-la. Liberdade sem sofismas, sem cortes. A luta continua, "enquanto há força" - José Afonso.

Bom dia. Vão ao que o jornalista (só) Ricardo Marques escreve neste cafeínado e matinal texto que muitas vezes aqui trazemos. Ricardo com Amália.

Carlos Tadeu / PG

Bom dia, este é o seu Expresso Curto

Ricardo Marques – Expresso

A música que Amália não cantou

Prezado,

Espero que esta o encontre bem, de preferência estendido na toalha ou com os pés na água, e a ler estas singelas linhas numa manhã de férias. Nós por cá vamos andando e amolecendo à conta deste calor que vai esmagando a capital da nação. Istomói o corpo e cansa a mente, já de si fatigada pela monotonia deste arranque de silly season – algo pouco recomendável na véspera de alinhavar este madrugador Expresso Curto.

Partiu o caro amigo para longe, e invejo-lhe a sorte porque na praia é que se está bem e o trabalhinho até sabe melhor depois de umas férias bem passadas. Lição antiga, que todos conhecem. Não há empresário, lente ou magistrado à vista. Deputados, nem vê-los, embora os ouçamos de vez em quando (mas lá chegaremos). Os mestres-escola foram com eles e levaram a estudantada atrás. Sindicatos? O que é isso? Sim, é agosto e escasseiam assuntos.

Ontem de manhã, rumei ao Chiado em busca de algo que me ajudasse a contar-lhe como vai este nosso mundo que deixou para trás. Foi lá, subindo e descendo a Rua do Carmo, que tudo se tornou mais claro. A Amália canta todo o dia naquela roulotte de fados, e dizia-me a dado momento: “Eu sei meu amor / que nem chegaste a partir…” Parei por instantes e dei por mim a pensar: “Pois não, Amália. Alguns de nós ficaram”. Para contar.

Segui para Brasileira e ainda tentei sentar-me ao lado do nosso Pessoa, mas as pessoas eram tantas que nem uma cadeira sobrava. Ao balcão, onde toda gente pede “équesseprésso plize”, arrisquei, mandei vir uma bica e fugi rapidamente para me encostar lá fora, à sombra, a fumar um cigarro e a escutar as conversas de quem passava. Ouvi tratados curtos em francês, alemão, japonês e inglês. Mas nada sobre os quentes assuntosque nos vão entretendo por cá, nós os que caminhamos pelo mar de turistas.

Mas perco-me em divagações, que pouco interessarão ao estimado leitor. Não me quero alongar, apenas garantir-lhe que foi proveitoso o passeio. Tão rico que o utilizarei, deste parágrafo em diante, como guia para esta carta.

Deixe-me apenas dizer que, cansado de calor e de turistas, tomei um carro de praça, modelo antigo, um daqueles Mercedes 190 cada vez mais raros, e pus-me a caminho de Belém para ir dar com os dentes num pastel quentinho. A fila não era tão grande como as dos Jerónimos ou da Torre de Belém, mas era suficientemente desencorajadora para não me apanharem lá. Nem coberto de canela e açúcar. O Padrão dos Descobrimentos, ali perto, esse está coberto de andaimes. Parece um prédio em obras na Baixa ou uma rua das Avenidas Novas ou do tal Eixo Central.

Como eles escrevem nos cartazes, embora se tenham esquecido de um 'bê' que aqui resgato ao fundo da memória, “obra a obra, Lisboa melhobra”.

Bom, por este andar nem pastelinho nem novidades.

Vamos a elas?

OUTRAS NOTÍCIAS

Pois saiba o meu amigo que o homem do momento é o Exmo. Senhor Rocha Andrade, que foi a Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais pela mão do nosso Primeiro, o Exmo. Senhor Costa, António. Ora, soube-se há dias pela revista Sábado, em duas ocasiões o senhor Rocha Andrade, por ocasião daquele torneio de foot-ball que os nossos spostman tão valorosamente venceram em Paris, tomou um aeroplano rumo a França, para ver o match, a custas de uma empresa de produtos petrolíferos, patocinadora do team lusitano, que tem um litígio em tribunal contra o Estado devido a 100 milhões de euros em impostos. Que bronca que isto tem dado, estimado leitor, e mais ainda depois de se saber por Lisboa inteira que outros dois Exmos. Membros do Governo fizeram o mesmo.

Os chalaceadores do costume não se entendem sobre o nome – Galpgate? Eurogate? - mas o caso, o gate, é de tal modo grave que ontem à tarde o Senhor Santos Silva, Augusto - ministro dos Negócios Estrangeiros e chefe do Governo na ausência do Senhor Costa, António, que está a banhos – chamou a rapaziada da imprensa. Anunciou um Código de Conduta para reger a solicitada agenda de ministros e secretários de Estado, garantiu que os três senhores vão pagar à petrolífera o valor das viagens (tornando-a, quiçá, uma petro-agência de turismo) e sugeriu que, assim sendo, o assunto está encerrado.

Só que, ao contrário do convite feito pela tal petrolífera que os três secretários de Estado aceitaram, a explicação do Exmo. Ministro dos Negócios Estrangeiros não teve tão unânime acolhimento.

PCP e Bloco de Esquerda, os dois partidos que apoiam no Parlamento o Governo, optaram por uma espécie de contido “meus caros senhores, isso não se faz, mas o que se faz por causa disso é lá com os estimados senhores”.

O PSD, conta o Observador, está a digerir as viagens dos seus senhores deputados aos matchs da seleção. Uns não justificaram as faltas, outros apresentaram justificação para não terem falta.

Já o Exmo. Senhor Magalhães, Nuno, do CDS, ao saber que os senhores secretários de Estado iam pagar as viagens do próprio, saiu-se com a tirada do dia dizendo que “os pagamentos dissipam dívidas, mas não dúvidas”. Gostou tanto dela que a repetiu na rádio e na televisão.

O CDS, recorde-se, tinha já pedido a demissão do Senhor Rocha Andrade, algo que a julgar pelas palavras do Senhor Santos Silva não irá acontecer.

Tudo isto faz lembrar aquela canção que Amália não cantou, e que foi celebrizada (carregue em play) por uns artistas americanos, no idos de 80. Falava de rochas e ia mais ou menos assim:

“And now it's solid /Solid as a rock /That's what this love is /That's what we've got, oh, mmm” (fim de citação).

Soube-se que a Procuradoria Geral da República está a analisar o caso. E não deverá faltar muito que para alguém se lembre deste outro senhor Secretário de Estado (Senhor Martins, Carlos) que, como não fazia sequer sentido pagar, deu o problema por resolvido deixando de receber. E no fim, claro, acabou por devolver.

Falou por fim sobre o assunto o senhor Presidente da República, Senhor Professor Marcelo Rebelo de Sousa, e mandou dizer que em Belém, onde os turistas fazem fila para comer um pastel e onde fica o já famoso Palácio das Condecorações, não há confusões.

Mas não era este o Europeu do nosso contentamento? Não era esta a vitória que nos ia unir e a ajudar a construir um futuro melhor? Como é que conseguimos estragar tudo em menos de um mês?

Quer ver o caríssimo leitor como isto anda tudo ligado? Sabe onde está o nosso estimado Presidente? No Rio de Janeiro. Sabe o que aconteceu ontem no Rio de Janeiro? A seleção portuguesa jogou contra a Argentina no primeiro jogo do torneio olímpico e ganhou por 2-0, com um golo de um moço chamado Paciência e outro de um jovem a quem chamam Pite. Uma maravilha. (Só de pensar que no último grande torneio começámos com um empate…)

Por falar em foot-ball, o Arouca deu um passo em frente na Liga Europa e o Rio Ave deu o passo atrás. O Sporting perdeu com o Betis de Seviha e houve pancadaria entre os adeptos antes do encontro.

Sabe o que acontece hoje no Rio de Janeiro? Sim, começam os Jogos Olímpicos. Até à meia-noite tem tempo suficiente para ler este artigo da Christiana Martins e mais este do Plínio de Fraga. Dificilmente encontrará melhor.

Claro que houve percalços. O JN contava ontem que alguém se esqueceu de uma chave. E como esquecer a atribulada viagem dofogo olímpico por terras brasileiras? O que importa é que ele ainda arde.

Falemos de fogo, então. E permita-me começar por dizer que, ao contrário das viagens do senhor Rocha Andrade e companhia a França, ainda ninguém sabe quem vai pagar os 422 carros que arderam em Castelo de Vide no estacionamento do Andanças. A investigação das autoridades prossegue, as imagens impressionam, mas a música não para. Nem a dança.

Vai por aí também uma guerra sobre um imposto (isso mesmo, de volta ao senhor secretário de Estado dos Assuntos Fiscais)chamado IMI. As autarquias estão divididas entre os que recusa mas novas regras e aqueles que as aceitam - ainda que, a fazer fé no que vai nas redes sociais (os cafés e tabernas de hoje) ninguém tenha conseguido explicar lá muito bem que regras são essas. Pelo menos até agora, porque a Raquel Albuquerquepreparou uma espécie de IMI para tolos. Não é para si, claro, é para os outros.

Mantenha a calma, estimado amigo. Nisso temos muito que aprender com os estrangeiros que esperam horas para entrar nos Jerónimos. Contemple o mar sereno à sua frente e, se estiver na costa ocidental, pense em tudo o que vai acontecendo para lá da linha do horizonte. Os americanos - que ora adoramos odiar, ora odiamos adorar - já estão em eleições.

O voto é só em novembro, mas abriu a caça ao Trump. Espreite o New York Times e o Washigton Post e as gordas são todas sobre o Donald - ele também ajuda... Entretanto, o cowboy supremo, Clint Eastwood, lançou mais gasolina para a fogueira (bem sei, bem sei, estamos sempre a voltar ao mesmo) ao defender o candidato Republicano. Numa entrevista à Esquire, magazine americano que entre nós se pode encontrar em alguns ardinas bem estabelecidos e de loja aberta, o ator admitiu que vai votar Trump e deixou algumas palavras sobre as acusações de racismo que são dirigidas ao Donald: “ Just fucking get over it. It's a sad time in history”

Mais triste, e capaz e colocar tudo em perspectiva, é a notícia de ontem à tarde. Uma criança de quatro anos morreu ao cair de um oitavo andar, em Loures. O caso está a ser investigado.

MANCHETES

Correio da Manhã: "Costa tira a filha da noite"

Jornal de Notícias: "Presos montam negócio ilegal de aguardente na cadeia"

Diário de Notícias: "Quedas do BES e do Banif podiam ter sido evitadas"

Público: "Governo segura secretários de Estado e promete código de conduta"

I: "Finanças já têm código de conduta que impede aceitar ofertas"

FRASE

“Insto todos os londrinos a manter a calma e permanecer alerta”,Sadiq Khan, mayor de Londres, após o ataque com faca de quarta-feira à noite, que fez um morto e cinco feridos.

O QUE ANDO A LER

Chega de livros, que os há de ter já, e não poucos, aí mesmo ao lado, cheios de areia. Para longe os tomos pesados, aborrecidos. Falo-lhe de magazines, dessas que, como a Esquire, só encontramos na mão de bons ardinas. Sei de um, ali para os lados da Avenida da Liberdade, que tem tudo e mais algumas páginas. Uma pessoa perde-se naquele corredor estreito. Entre outras preciosidades, encontrei lá a 1843, a versão ligeira da seríssima The Economist, que pode espreitar aqui (https://www.1843magazine.com). Tem histórias sobre lobos, banda desenhada, um colégio de elites e - como não? - o Donald.

Os nossos estimados camaradas da Visão, a newsmagazine portuguesa, encontraram uma forma engenhosa de nos ir contando como vai o planeta. Sendo certo que há sempre um português em todo o lado, nada melhor do que convidá-los a escrever sobre os respetivos lados, ou locais. Graças a eles e à Visão temos o Nós Lá Fora. Faça a mala e meta-se ao caminho.

E é este o país que temos, é esta a vida que deixou para trás. Tudo por uns chinelos e uns banhos de mar. Um país que Camilo Castelo Branco resumiu em duas linhas, no livro distribuído com o Expresso há uma semana (há mais um amanhã, "A queda de um anjo" - 
bem sei, bem sei). Estão elas no fim de um capítulo que acaba com dois homens ajoelhados diante do impostor que finge ser D. Miguel para deixar o Minho em alvoroço com a perspetiva de uma revolta.

“Foi assim que se inaugurou a corte de D. Miguel I em São Gens de Calvos, segunda-feira de Entrudo de 1845, às 3 horas da tarde”, escreveu Camilo sobre esse futuro que nunca chegou a ter passado.

Há novidades às seis da tarde, com o Expresso Diário, e notícias frescas amanhã, com a edição semanal do Expresso. Na Internet é odia todo. (Psst: aqui tem tudo e é mais barato)

Se já andar perdido nos dias, provavelmente está de férias. Hoje é sexta-feira, 5 de agosto e prepare-se porque o tempo vai aquecer. Tenha um bom dia e um excelente fim de semana.

ATÉ QUANDO ESQUECEREMOS KARL MARKX?



É cada vez mais óbvio: só políticas decididas e intensas de redistribuição de riqueza — portanto, opostas às atuais —  permitirão enfrentar a crise econômica global, que se arrasta há oito anos

Vicenç Navarro – Outras Palavras - Tradução: Inês Castilho

Em consequência do enorme domínio que as forças conservadoras têm nos maiores meios de difusão e comunicação, inclusive acadêmicos, na Espanha, o grau de desconhecimento das diversas teorias econômicas derivadas dos escritos de Karl Marx nesses meios é esmagador. Por exemplo, se alguém sugere que para sair da Grande Recessão é necessário estimular a demanda, imediatamente penduram-lhe uma etiqueta de keynesiano, neo-keynesiano ou “o que seja” keynesiano. Na verdade, essa medida pertence não tanto a Keynes, mas às teorias de Michal Kalecki, o grande pensador polaco, claramente enraizado na tradição marxista que, segundo o economista keynesiano mais conhecido hoje no mundo, Paul Krugman, é o pensador que melhor analisou e prognosticou o capitalismo. Seu trabalhos servem melhor para entender não só a Grande Depressão como também a Grande Recessão iniciada em 2008. Para Joan Robinson, professora de Economia na Universidade de Cambridge, no Reino Unido, e discípula predileta de Keynes, este conhecia e foi em grande medida influenciado pelos trabalhos de Kalecki.

Contudo, como Keynes é mais tolerado que Marx no mundo universitário, muitos acadêmicos assustam-se de ser vistos como marxistas e preferem disfarçar-se sob a qualificação de keynesianos. O disfarce é uma forma de luta pela sobrevivência em ambientes tão profundamente direitistas, como ocorre na Espanha (inclusive Catalunha), onde quarenta anos de ditadura fascista e outros tantos de democracia supervisionada pelos poderes de sempre deixaram sua marca. Convido o leitor que pensa que exagero para a reflexão seguinte.

Suponha que eu, numa entrevista à TV (que é mais que improvável que ocorra, nos meios altamente controlados que nos rodeiam), dissesse que “a luta de classes, com a vitória da classe capitalista sobre a classe trabalhadora, é essencial para entender a situação social e econômica na Espanha e na Catalunha”. É mais que provável que o entrevistador e o telespectador me olhassem com ar de incredulidade, pensando que o que eu estaria dizendo era tão antiquado que seria doloroso que estivesse assim mesmo afirmando tais sandices. Na linguagem do establishment muitas vezes confunde-se antigo com antiquado, sem dar-se conta de que um princípio ou uma ideia podem ser muito antigos mas não necessariamente antiquados. A lei da gravidade é muito, mas muito antiga, e sem dúvida não é antiquada. Se não acredita nela, pule de um quarto andar e veja o que acontece.

A luta de classes existe

Pois bem, a existência de classes é um princípio muito antigo em todas as tradições analíticas sociológicas. Em todas, repito. E o mesmo quanto ao conflito de classes. Todos — repito: todos — os maiores pensadores que analisaram a estrutura social de nossas sociedades – de Weber a Marx – falam de luta de classes. A única diferença entre Weber e Marx é que, enquanto que em Weber o conflito entre classes é conjuntural, em Marx, ao contrário, é estrutural e intrínseco à existência do capitalismo. Em outras palavras, enquanto Weber fala do domínio de uma classe sobre por outra, Marx fala de exploração. Um agente (seja uma classe, uma raça, um gênero ou uma nação) explora um outro quando vive melhor às custas de que o outro viva pior. É um desafio negar que existam enormes explorações nas sociedades em que vivemos. Mas afirmar que há luta de classes não significa que alguém seja ou deixe de ser marxista. Todas as tradições sociológicas sustentam sua existência.

As teorias de Kalecki

Michal Kalecki indicou que, conforme sustentara Marx, a própria dinâmica do conflito Capital-Trabalho leva a situações como a que produziu a Grande Depressão. A vitória do capital leva a uma redução dos rendimentos do trabalho, o que cria graves problemas de demanda. Não sou muito favorável à cultura talmúdica de recorrer a citações dos grandes textos, mas me vejo obrigado a fazê-lo neste momento. Marx escreveu o seguinte n’O Capital: “Os trabalhadores são importantes para os mercados como compradores de bens e serviços. Contudo, com a dinâmica do capitalismo, os salários – o preço de um trabalho – caiam cada vez mais. Por este motivo, cria-se um problema de demanda dos bens e serviços produzidos pelo sistema capitalista. Surge um problema não só na produção como na realização dos bens e serviços. E este é o problema fundamental na dinâmica capitalista que leva ao empobrecimento da população, enquanto impede a produção e sua realização.” Claro como água. Este não é Keynes, é Karl Marx. Daí a necessidade de transcender o capitalismo estabelecendo uma dinâmica oposta, na qual a produção responda a uma lógica distinta, na verdade oposta, encaminhada para satisfazer as necessidades da população, determinadas não pelo mercado e pela acumulação do capital, mas pela vontade política dos trabalhadores.

Daí derivam vários princípios. Um deles, reverter as políticas derivadas do domínio do capital (tema sobre o qual Keynes nada fala), aumentando os salários ao invés de reduzi-los, a fim de criar um aumento da demanda (do qual sim, Keynes fala). Isso se faz por meio do aumento das rendas do trabalho, via crescimento dos salários ou do gasto público social, que inclui o Estado de bem-estar social e a proteção que Kalecki define como o salário social.

Observando os dados, percebe-se claramente que hoje as políticas neoliberais realizadas para o benefício do capital têm sido responsáveis pelo fato de que, desde os anos 1980, as rendas do capital tenham aumentado às custas da redução das rendas do trabalho (ver meu artigo“Capital-Trabalho: a origem da crise atual” no Le Monde Diplomatique, edição espanhola, julho de 2013). Criou-se um grave problema de demanda, que demorou a expressar-se em forma de crise devido à enorme dívida contraída pela classe trabalhadora e outros setores das classes populares (e das pequenas e médias empresas). Esse endividamento criou a grande expansão do capital financeiro (os bancos), os quais investiram em atividades especulativas, pois seus investimentos financeiros nas áreas da economia produtiva (onde se produzem os bens e serviços de consumo) eram de baixa rentabilidade, precisamente em consequência da escassa demanda. Os investimentos especulativos criaram as bolhas que, ao estourar, produziram a crise atual, conhecida como Grande Recessão. Essa é a evidência de que o que vem ocorrendo (ver meu livro Ataque a la democracia y al bienestar. Crítica al pensamiento económico dominante, Anagrama, 2015).

Daí que a saída da grande crise em que ainda estamos imersos passe por uma reversão de tais políticas, ampliando os rendimentos do trabalho às custas das rendas do capital. Esta é a grande contribuição de Kalecki, que mostra não só o que está acontecendo, como também por onde as forças progressistas deveriam orientar suas propostas de saída desta crise. Elas requerem uma grande mudança nas correlações de força Capital-Trabalho em cada país. Se não se fala muito disso, é porque as forças conservadoras dominam o mundo do pensamento econômico e não permitem a exposição de visões alternativas. E assim estamos, indo de mal a pior. Os últimos dados econômicos são os piores que temos visto ultimamente.

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