sábado, 6 de agosto de 2016

Cabo Verde. DESIGUALDADE SOCIAL: O DESAFIO QUE PERSISTE




Numa altura em que se discute o Estado da Nação e neste início de legislatura em que, uma vez mais, se assumem as desigualdades sociais como o principal desafio do país, quisemos deitar um certo olhar a este fenómeno que, de acordo com os números de relatórios internacionais sobre Cabo Verde, tende a diminuir, mas que no dia-a-dia traz evidências de contrastes cada vez mais acentuados, com as consequências que já se conhecem.

Nesta que é a primeira de uma série de três reportagens, fomos ouvir o ponto de vista de sociólogos e especialistas sobre algumas particularidades da desigualdade social no país.

Reza o relatório do Banco Mundial sobre Cabo Verde, actualizado em Abril último, que entre 2003 e 2008, o índice nacional de pobreza baixou de 37% para 27%, e a taxa de pobreza extrema foi reduzida de 21% para 12% (utilizando definições nacionais). O crescimento do turismo terá sido o principal responsável por estes números relativamente positivos.

Este mesmo relatório garante - estribado na diminuição do coeficiente Gini (uma medida de desigualdade desenvolvida pelo estatístico italiano Corrado Gini que consiste em um número entre 0 e 1, onde 0 corresponde à completa igualdade e 1 corresponde à completa desigualdade) de 0,55 em 2003, para 0,48 em 2008 - que “têm-se feito consideráveis progressos no sentido de promover a prosperidade partilhada”.

Embora estes dados apontem que o rendimento dos 40% mais pobres da população cabo-verdiana, em percentagem do rendimento total, aumentou 9,9% nesse mesmo período de 5 anos, o sentimento do cidadão comum é de que em Cabo Verde têm aumentado as desigualdades.

Esta também é a percepção dos sociólogos Crisanto Barros e Redy Wilson Lima, ambos com trabalhos de investigação que levam em conta este tópico.

Para Redy W. Lima, que integra um grupo transnacional de académicos cujo principal foco de estudo é a desigualdade social nas suas diversas facetas, a desigualdade social não está a diminuir. “Pelo contrário, a tendência é aumentar”.

“Quando se vê o surgimento dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)… Acho que reconhecem isso, que os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) acabaram por ser um reprodutor da desigualdade. O modelo de desenvolvimento era um modelo de crescimento económico, de ir para frente… Só que crescer numa lógica em que se esquece de alguns, uma lógica que ignorava quem não conseguia acompanhar esse crescimento e que no fundo reflecte aquela velha ideia de que o pobre é preguiçoso. Não é à toa que o grande slogan dos ODS é “Não deixar ninguém para trás”. Acho que reconheceram que houve afinal um aumento”, analisa o académico.

De facto, assim é. A nível global, os ODM da Organização das Nações Unidas não conseguiram atender a desigualdade estrutural. Aliás a chamada Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável vem admitir a “enorme disparidade de oportunidades, de riqueza e de poder”.

Voltando aos números, Crisanto Barros faz a sua própria leitura dos mesmos. “A nossa desigualdade está a ser brutal, enorme. O último índice consistente que temos, que é de 2001 [os novos dados são feitos sob uma outra metodologia] e mede o acesso a recursos através do consumo, mostrava que 10% da população mais pobre despende 1% e os 10% mais ricos despendem 47%. Ou seja, os 10% que têm mais condições económicas gastam 47 vezes mais do que gastam os mais pobres. Isto é, 70% da nossa população tem uma participação equivalente a 28%, o que significa que temos uma sociedade muito desigual”.

O sociólogo reconhece que o país, nestes 41 anos de independência, “conseguiu enormes progressos sociais em quase todas as áreas”. E cita a saúde, a educação, o acesso a água e energia como algumas das áreas exemplares. No entanto, Barros reitera a “presença” inescapável da desigualdade.

“Se analisarmos globalmente todos os indicadores, há melhorias significativas, mas a desigualdade é uma questão social. A sociedade constrói as desigualdades. É um fenómeno universal, embora haja comunidades com menos desigualdades.”

O académico adjectiva de “brutais” os processos de mudança pelos quais o país passou e faz lembrar que todos os processos de mudanças aceleradas geram desigualdades. “O nosso grande problema é que o crescimento não se tem traduzido na redução de desigualdades”, nota.

Desigualdades que o colega Wilson Lima vinca serem amplas, ultrapassando o campo económico, que é o que normalmente sobressai e, na perspectiva de vários estudiosos, está na origem de todas as outras.

“Por exemplo, já no processo de povoamento de Cabo Verde houve desigualdades. Era uma sociedade escravocrata e racial. Essa desigualdade foi reproduzida e a sociedade que temos hoje é reflexo deste passado”. O autor de “Praia, cidade partida: apropriação e representação dos espaços” aponta as investigações de António Correia e Silva e Iva Cabral que, na esteira de António Carreira, aprofundam esta análise histórica.

Lima, que tem feito das periferias urbanas e da juventude citadina o seu campo de pesquisa de eleição, relaciona no seu trabalho a desigualdade e a violência, uma violência que caracteriza como simbólica e que hoje denomina de violência política, “porque temos políticas que na verdade acabam por reproduzir as desigualdades históricas de Cabo Verde”.

Estas desigualdades, frisa por sua vez Crisanto Barros, assumem duas facetas: “a material e, a mais importante, a simbólica, a que as pessoas constroem”. Na perspectiva deste investigador esse é o problema maior de Cabo Verde, uma vez que países há onde se pode crescer menos, mas em que o sentimento em relação a desigualdade é menor porque o referencial cultural que estas sociedades criam são aqueles com os quais as pessoas conseguem lidar.

Expectativas e percepção de pobreza

Aí Barros toca num ponto crucial que são as tensões que se sentem na sociedade Cabo-Verdiana, derivadas muitas vezes dos desajustes entre os referenciais e a realidade dos recursos.

“Em Cabo Verde o referente de uma pessoa pobre é alguém que ela nunca pode ser se agir correctamente, do ponto de vista ético e legal. Essa pessoa tem mesmo ao lado um indivíduo cujos rendimentos não vêm de meios lícitos, alguém que vem do mesmo meio social que ele, mas com alto rendimento, um rendimento que não resulta de um trabalho e esforço dignos”, observa.

“É essa alteração de referente do pobre e da classe média cabo-verdiana que observamos. Uma classe média que é constituída maioritariamente por funcionários públicos e que se impôs um estilo de vida equiparado a empresários europeus”, acrescenta Barros.

Batendo na tecla da falta de uma “regulação social das expectativas”, o estudioso aponta o exemplo dos EUA, onde “um indivíduo num carro de luxo paga imposto de luxo. Aqui não! Na Europa, um funcionário público paga uma habitação e tem um automóvel social. Os automóveis que a nossa classe média possui são automóveis que um professor universitário na Europa não consegue ter, porque custa caro”.

Ainda teorizando sobre a classe média nacional, Barros caracteriza-a como detentora de um padrão de vida que resulta muitas vezes de cargos político-administrativos sazonais que ela luta a vida toda para manter.

“É uma classe média estruturalmente dependente do Estado. Sempre cresceu em torno do Estado, em torno da lealdade ao Estado. É por isso que hoje ela mantem-se e quer manter-se pendurada ao Estado”, enfatiza ao mesmo tempo que vaticina que as mudanças políticas afectam o estilo de vida de alguma dessa classe média que “cai do seu estilo de vida e passa a ‘quase pobre’. Então a pobreza também toca esse ciclo da classe média”, conclui.

O Estado e as desigualdades

Redy W. Lima corrobora que a política é em Cabo Verde, ao lado da emigração e do narcotráfico, um dos três principais veículos de ascensão social e aumento de rendimento.

“Na ascensão politica há uma elite que se perpetua”, faz notar o jovem investigador discorrendo desta feita sobre a desigualdade com base nas classes sociais. “Há uma tensão entre a ‘verdadeira’ elite e os ‘novíssimos quadros’. E mesmo entre os quadros acontece uma diferenciação entre os que têm ‘berço’ e os que não têm”, constata.

A ideia de desigualdades estruturadas em torno do Estado é também analisada por Barros, coordenador do mestrado em Ciências Sociais da Uni-CV que resultou na obra “Desigualdades Sociais e Dinâmicas de Participação em Cabo Verde”, para quem a presença do Estado é o elemento que permite acesso a recursos.

Afinal o Estado continua a ser o maior empregador, ainda que o estudo Balanço Social do Capital Humano da Administração Pública cabo-verdiana, de 2015, revele que o número de funcionários públicos em Cabo Verde diminuiu 16% numa década, passando de quase 22 mil em 2006 para mais de 18 mil em 2015.

“Tivemos várias vagas. Houve uma vaga em que pessoas pobres ascenderam via Estado. Por exemplo, através da colocação de professores e mais recentemente através de formação de agentes policiais e enfermeiros. O problema é que isso saturou. O drama é que os pobres agora não conseguem ascender”, observa Barros para quem a mobilidade social devia ser via mercado, “mas para isso era preciso haver uma estrutura produtiva. O que nós temos é uma cultura rentista, de importar para depois revender”.

E no entanto, facilmente se pode observar que o acesso ao Estado enquanto empregador é mais fácil para a classe média, detentora de uma maior rede de contactos.

Redy Lima resume assim a questão: “Temos sim uma sociedade segregada, com desigualdades de oportunidades. ‘Descobres’ que a única maneira de ascender é ter uma militância, ter nome de família (“raça”) ou ainda através de amizades sexuais. A violência surge também, em certas esferas, como um veículo. A desigualdade social é um processo que vem depois de se criar exclusão e empobrecimento. Porque quando tens uma sociedade segregada, com oportunidades restringidas, não tens interesse em diminuir as desigualdades. É uma lógica histórica”.

Este cenário fatalista é também reproduzido por Crisanto Barros. “O Estado que deve combater a desigualdade é reprodutor da desigualdade”, diz. E aponta como exemplo o facto da disparidade de salários ser muito mais acentuada no sector público do que no privado.

“No Estado encontras quem ganhe seiscentos contos e depois tens as cozinheiras que ganham sete mil escudos”.

O crescimento económico tido, a nível mundial, como a primeira resposta para o combate às desigualdades, deve traduzir-se num aumento do tecido empresarial que permita absorver (empregar) a classe mais pobre. Para o investigador isto é um problema para Cabo Verde já que acredita que ainda vá demorar muito para se atingir este nível de crescimento.

“Vamos ter já licenciados, mestrados e doutorados desempregados. Essa questão à volta da dita despartidarização da Administração Pública no fundo é uma disputada por cargos no Estado. A questão da regionalização é disputa por mais Estado. Toda essa conversa a volta destes assuntos é só com o fim de reproduzir o Estado e ter acesso a rendimento em cima de um sector improdutivo”.

Uma constatação na contramão da meta definida pelo Estado nos ODM de “alcançar o pleno emprego e assegurar a todas as pessoas, incluindo as mulheres e os jovens, um trabalho digno e produtivo”.

Moçambique está preso a uma tradição de administração centralizada - historiador



O historiador alemão radicado em Moçambique Gerhard Liesegang defende que o país africano está refém da tradição de um modelo de governação centralizado, apontando a falta de vontade política como o principal problema nas negociações para a paz.

"Estamos presos a uma tradição de administração centralizada em Moçambique", disse à Lusa Gerhard Liesegang, considerando que o modelo de administração atual não respeita as novas dinâmicas socais e beneficia a elite no poder.

O pesquisador alemão entende que a causa da crise política em Moçambique está na incapacidade de ceder entre as partes, Governo e Resistência Nacional Moçambicana (Renamo) e alerta para as consequências da intensificação das atuais confrontações militares.

Lusa

FALTA DE VONTADE POLÍTICA PARA A PAZ EM MOÇAMBIQUE



Observadores independentes acusam a RENAMO e o Governo de assumirem comportamentos e posicionamentos incompatíveis com o objetivo de paz.

Os analistas acusam as duas partes de estarem determinadas em resolver este conflito com o recurso às armas. Consideram ainda que o ódio e a intolerância política estão a eternizar o conflito armado em Moçambique e que diálogo tarda a acontecer.

A ver dos observadores, as posições do Governo e do maior partido da oposição, a Resistência Nacional Moçambicana, (RENAMO) são difíceis de conciliar. Acresce que o conflito em Moçambique se está a alastrar para outras regiões. O politólogo João Pereira diz que o cenário é comparável com aquele que dividiu o Sudão: “O Sudão era um Estado unificado, que a partir desse tipo de conflitos acabou por degenerar num conflito étnico, regional e tudo isso. Aqui há indicação clara por exemplo, por parte da RENAMO e do Governo de que não estão criadas condições necessárias para uma reconciliação”.

Critica do discurso positivista

Em entrevista ao canal privado de televisão moçambicana STV, Pereira critica o Governo por fazer um discurso positivista, quando no mato a realidade é outra. A suspensão da circulação dos comboios no corredor da Beira, no centro do país, reduziu ainda mais a credibilidade de Moçambique junto dos parceiros: “Quer dizer, praticamente os centros de poder a nível internacional começam a avisar grande parte dos investidores de que o país não é viável para o investimento”.

A repentina expansão dos ataques da RENAMO para outras províncias mais a norte, como nos últimos dias em Mopeia, na Zambézia e Maúa, no Niassa, mostram desinteresse pelo diálogo, defende o analista político Tomás Vieira Mário: “Eu penso claramente que isto é uma demonstração que a RENAMO quer mostrar de força porque os processos de diálogo ainda estão extremados. E é essa mensagem muito triste que nos dá esses ataques”.

Motivo de preocupação

Aliás, acrescenta, as duas partes deixaram uma má imagem diante dos mediadores ao provarem que estão a apostar na força das armas: “O diálogo com os mediadores não permitiu qualquer suavização das posições. E essa falta de posições suavizada exprime-se no aumento de ataques até em zonas não previsíveis como era o Niassa”.

Nesta situação, o Governo esforça-se por tranquilizar a população. O que para Tomás Vieira Mário é um erro: “Eu acho que não há como não se preocupar. A situação está tão dramática que todo o mundo hoje está um pouco expetante sem saber bem qual é a visão de amanhã”.

Romeu da Silva/Maputo – Deutsche Welle

"A paz em Moçambique não pode ser exclusiva do Governo e da RENAMO!"



O presidente do Parlamento Juvenil, Salomão Muchanga, reforçou a sua exigência de uma maior participação da sociedade civil nas negociações de paz em Moçambique. As delegações do governo e da RENAMO já aceitaram.

As delegações do Governo moçambicano e da RENAMO aceitaram a participação de personalidades da sociedade civil nas negociações de paz em Moçambique, informaram, nesta quinta-feira (04.08.2016) membros de organizações não-governamentais reunidas no Painel de Monitoria do Diálogo Político.

Uma das organizações envolvida nesta plataforma civil que exige a participação nas conversações é o denominado "Parlamento Juvenil", presidido por Salomão Muchanga, e que foi entrevistado pela DW África.

DW África: O que levou a sua e outras organizações a exigirem uma maior intervenção da sociedade civil no processo de pacificação do país?


Salomão Muchanga (SM): Esta ideia é uma decisão da conferência nacional Pensar Moçambique, organizada pelo Parlamento Junvenil, que teve lugar de julho, em que exigimos a presença da sociedade civil como observadora na mesa do diálogo para a paz. Estamos perante o ideal da paz, que para nós representa o sonho mais íntimo, a aspiração mais ardente dos moçambicanos. E se nós queremos uma paz sustentável e duradoira temos que envolver os moçambicanos. A paz não pode ser objeto exclusivo de dois atores, nomeadamente o governo e a RENAMO, mesmo que tenha a mediação da comunidade internacional!

DW África: Quer isso dizer que os partidos envolvidos no conflito têm-se mostrado incapazes de resolver esse mesmo conflito?

SM: Não se trata de constatar a incapacidade. Estamos, sim, a dizer que não é bastante! Precisamos de envolver todos os quadrantes da sociedade, porque a paz é a coisa mais preciosa da humanidade e de todos os moçambicanos. E a paz não é apenas de um ou dois atores. Tem que ser uma paz dos moçambicanos. E é aqui onde nós queremos entrar: precisamente fazer uma distribuição criativa dessa situação, uma partilha de poderes e responsabilidades, para que não sejam apenas dois atores a fazer a paz. Nós somos todos moçambicanos e todos nós queremos participar no processo: estudantes, mulheres, trabalhadores, religiosos! Juntos iremos encontrar um paradigma social, um paradigma político, que possa aproximar as partes e colocar o estandarte do progresso da nação com o objetivo de uma paz duradoira.

DW África: As delegações do Governo moçambicano e da RENAMO aceitaram nesta quinta-feira precisamente a participação de personalidades da sociedade civil nas negociações de paz em Moçambique, exigidas pela sua organização. Trata-se, pois, de uma vitória para a sociedade civil moçambicana?

SM: Sim. É uma grande vitória. E por isso saudamos a aceitação por parte de ambas as partes. A nossa preocupação é agora de que possamos trabalhar para que as nossas propostas, as nossas ideias, a nossa energia, sejam encaminhadas para a resolução definitiva deste diferendo.

DW África: E quais são as suas propostas, as suas ideias concretas para fortalecer o diálogo?

SM: A proposta e a ideia imediata que o Painel de Monitoria do Diálogo Político para paz emite é que se chegue rapidamente à trégua e que se volte à mesa de negociações num ambiente suadável e numa base ética favorável ao processo. Esperemos que todas as ideias que temos sejam sistematizadas, para que no decurso deste processo de diálogo possam ser apresentadas às duas delegações e aos mediadores internacionais.

DW África: Quais serão os passos seguintes preconizados pela sociedade civil moçambicana?

SM: Vamos continuar com a pressão. Vamos aumentar a pressão a nível nacional. Há um movimento nacional de pressão! Já no dia 27 de agosto vamos realizar na capital do país (Maputo) uma “marcha popular pela paz”. Trata-se de um aumento de exaltação do estímulo de cidadania, para que se compreenda o valor da cultura de paz! Será o momento certo em que todos os moçambicanos poderão gritar em uníssono: basta!

António Cascais – Deutsche Welle

Angola. DEMOCRACIA? ONDE? ONDE?



Os partidos políticos estão para as democracias (quando estas existem) como o sangue está para o corpo humano (quando este está vivo), razão pela qual o funcionamento organizado e com elevado sentido de Estado dos partidos constitui um ganho inestimável… nas democracias.

Orlando Castro* – Folha 8

Numa altura em que, supostamente, nos aproximamos do período de realização de actos que devem levar às próximas eleições gerais, não há dúvidas de que urge enaltecer uma coexistência política pacífica, deste que os subalternos não ponham em dúvida a supremacia de quem está no poder.

E nisto, os partidos políticos enquanto forças que lutam por meios democráticos (quando há democracia) para alcançar, exercer e manter o poder político devem dar exemplos claros, inequívocos e firmes de tolerância, convivência na diversidade, entre outros. Isto é, repita-se, quando se vive em democracia.

Todos os sectores políticos (com excepção dos afectos ao poder) percebem melhor a importância da adopção das melhores práticas, baseadas essencialmente na tolerância, na aceitação da diferença e no pressuposto de que acima estão (ou deveriam estar) os interesses de Angola. Essa deve ser, entre outros gestos, a mensagem que os partidos (fica na dúvida se o MPLA se pode incluir) têm que passar para a sociedade angolana, sobretudo nesta altura em que Angola se encontra na fase de um dia chegar a uma democracia de facto e não apenas formal.

Temos um histórico, relativamente aos esforços para implementação do processo democrático “imposto”, segundo as palavras do próprio presidente do MPLA, que um dia permitirá a cada angolano encarar a democracia como uma conquista de todos, mau grado a alergia do partido no poder desde 1975. Não está a ser um processo fácil chegarmos aos níveis de coabitação política. É que se o poder corrompe, o poder absoluto corrompe de uma ponta à outra.

Como sabemos, tratou-se de uma caminhada que podia, naturalmente, acarretar desafios para todos os intervenientes atendendo a que a vida em democracia implica, ou deve implicar, sempre ajustes a todos os níveis. As autoridades angolanas (o MPLA desde a independência) abraçaram o repto da democracia (“imposta”, repita-se, segundo José Eduardo dos Santos) e, tal como reza a História, foram as primeiras a pôr em causa os fundamentos em que devia assentar o futuro do país.

Acreditamos que o alcance da paz, em 2002, que contribuiu para a retoma do processo democrático sempre defendido pela oposição, em todo o país, permitiu a todos os actores políticos fazer uma avaliação positiva das vantagens do jogo democrático, mau grado seja um sistema que não agrada ao MPLA cujo ADN só vê os tempos áureos do partido único.

As formações políticas, acompanhadas de todos os outros actores que, exceptuando a conquista do poder político, desempenham o papel cívico e interventivo de influência, constituem uma espécie de espinha dorsal da democracia, quando ele existe. E precisam de continuar a fazer prova das suas atribuições e responsabilidades na medida em que os partidos políticos representam a esperança de milhares de angolanos, sem esquecer que para quem manda… o MPLA é Angola e Angola é o MPLA.

Por isso é que a Constituição da República determina que os partidos devem, no âmbito das suas atribuições e fins, contribuir para a consolidação da nação angolana e da independência nacional, para a salvaguarda da integridade territorial, para o reforço da unidade nacional, para a protecção das liberdades fundamentais e dos direitos da pessoa humana, entre outros. Determinar, determina. Mas acima da Constituição está, tem estado sempre, a vontade do MPLA.

Vai começar em todo o país o processo de actualização do registo e o registo eleitoral propriamente dito, uma realidade em que se vão envolver representantes de vários partidos, segundo as regras determinadas por quem está no poder. A nossa expectativa é que as formações se engajem para, como as disposições legais assim o requerem, haja maior participação, maior democraticidade, transparência, entre outros factores.

É preciso que as instituições do Estado (e não as do regime que, até agora, são uma e a mesma coisa) reforcem os mecanismos de sensibilização junto das populações para que estas, tal como no passado, estejam à altura dos desafios que o país volta a testemunhar com a preparação do processo eleitoral.

Mas insistimos que maiores desafios recaem sobre os principais actores da cena política, nomeadamente os partidos políticos que deverão fazer advocacia da coexistência pacífica entre todas e diferentes sensibilidades políticas, lembrando-se uma das regras de ouro do MPLA: Olhai para o que dizemos e não para o que fazemos.

Não é exagerado pedir e esperar que as formações políticas (será que se pode incluir o MPLA?) contribuam para que a disputa política não se transforme numa espécie de arena em que impera o vale tudo… sendo que quem manda tem poderes que nega aos outros. É que as bases de apoio, os militantes e os simpatizantes dos partidos políticos sejam capazes de aperfeiçoar as normas de convivência que os caracterizam.

Independentemente das falhas que resultam da condição da natureza humana limitada, não há dúvidas de que podemos ainda assim fazer prova das boas práticas em sociedade, assim o MPLA dê um sério exemplo de que está interessado nisso. As diferenças ideológicas, se as há, as diferentes perspectivas de cada segmento relativamente às fórmulas para desenvolver Angola contidas nos programas e estratégias, não superam todo o conjunto de pressupostos que unem os angolanos. Não é assim, mas deveria ser assim.

Os objectivos que todos perseguimos para ver Angola crescer para que o bem-estar de todas as famílias seja uma realidade não são predicados de partidos, mas são metas de todos os angolanos. Acreditamos que a construção de uma sociedade livre, justa, democrática, solidária, de paz, igualdade e progresso social é uma meta de todos os partidos políticos. O passo e o presente mostram e demonstram o contrário. Veremos.

Esperamos que nesta fase em que nos aproximamos do registo eleitoral, os partidos políticos se engajem num processo de mobilização com grande teor pedagógico junto das suas bases de apoio, dos seus militantes, simpatizantes e todos os angolanos. Que o empenho para o sucesso do registo eleitoral por parte dos partidos políticos não se verifique apenas no acompanhamento e fiscalização do processo, mas que sirva para provar que poderemos ser aquilo que ainda não somos, uma democracia e um Estado de Direito.

Nota: Texto baseado num artigo anónimo (presume-se que seja da autoria da Direcção) publicado hoje no Pravda, Boletim Oficial do regime ou Jornal de Angola, sob o título “Uma democracia forte”.

*Diretor-adjunto

Angola. JOÃO PINTO: “MPLA NÃO TEM MEDO DAS ELEIÇÕES” - com áudio



O Presidente Eduardo dos Santos “é o único presidente na história da humanidade que extinguiu e extirpou o terrorismo”, disse o deputado do MPLA João Pinto.

Pinto, um dos vice-presidentes da bancada parlamentar do MPLA defendia o chefe de estado angolano durante um muito concorrido e animado “Angola Fala Só”.

O Presidente, disse João Pinto “acabou com a guerra, fez uma democracia florescente, de um país destruído conseguiu reconstruí-lo, integrou a oposição e não os levou a tribunais marciais perdoando-os”.

“É um homem raro e excepcional e é isto que intimida a UNITA”, acrescentou.

O deputado respondia a uma pergunta de um ouvinte que quis saber porque é que o MPLA insiste em manter o Presidente no poder quando este já afirmou estar cansado.

Para João Pinto, José Eduardo dos Santos está “ao serviço do MPLA” e se este lhe pede e “roga” para ele continuar “a manter o rumo dos objectivos do programa” do partido, então “não vejo nada de anti democrático”.

O deputado do MPLA rejeitou peremptoriamente acusações da oposição de que o registo eleitoral a iniciar este mês será viciado por estar a ser levado a cabo pelas instituições do estado e não pela Comissão Nacional Eleitoral (CNE).

João Pinto disse que o sistema seguido por Angola é igual ao de muitos outros países.

“O nosso sistema administrativo é um sistema executivo como acontece em França e como acontece em Portugal”, disse este dirigente parlamentar do MPLA.

"É também o governo que regista óbitos e nascimentos. No caso do registo eleitoral a Comissão Nacional de Eleições pode fiscalizar ao registos", continuou.

“Se for a CNE a efectuar o registo quem é que vai fiscalizar? O governo?”, interrogou João Pinto para quem a autonomia da CNE “parte do pressuposto que ela não se envolve”.

A oposição, disse, tem sempre meio de fiscalização e controlo “porque para além dos actos administrativos e executivos pode recorrer ao Tribunal Constitucional se detectar que os actos do registo eleitoral estão viciados ou violam preceitos constitucionais”.

João Pinto disse ainda que “uma Comissão Eleitoral independente não faz registos”.

“Quem organiza eleições em França é o governo, quem organiza eleições em Portugal é o governo, pelo Ministério do Interior”, afirmou acrescentando que Angola tinha feito “uma grande inovação” ao criar a comissão eleitoral independente.

Quem tem os dados de óbitos e nascimentos é o estado, sublinhou rejeitando a acusação de um ouvinte que o MPLA tem medo das eleições.

“O MPLA não tem medo nenhum das eleições”, disse recordando as vitórias eleitorais em anteriores pleitos.

“O MPLA vai sempre ao jogo democrático”, acrescentou apelando aos cidadãos “para não se deixarem levar por um discurso que visa desacreditar as instituições por parte sobretudo de quem não está preparado para governar Angola ou por quem teme mais uma derrota eleitoral”.

Durante o “Angola Fala Só” o deputado abordou também questões relacionadas com a crise financeira afirmando que o parlamento já discutiu a redução de privilégios de funcionários do estado, como o direito a um carro por parte de alguns deles, e rejeitou acusações de intolerância política.

Para João Pinto os actos de intolerância que se registam são o resultado de casos de “excesso de zelo” ou de “ajustes de contas” não refletindo por exemplo o que passa no parlamento onde há respeito por todos os deputados.

Voz da América, em Angola Fala Só


Angolanos tentam "aldrabar o estômago" sem pão a "mata-bichar" com arroz e chá



A crise no preço do pão em Angola, que disparou em poucas semanas, está a levar as famílias de Luanda a mudar o hábito do "mata-bicho" pelo início da manhã, agora com arroz e chá, para "aldrabar o estômago".

É que devido às alegadas dificuldades na importação de farinha de trigo, pela falta de divisas, o custo deste produto subiu em flecha, repercutindo-se nos preços do pão em pouco mais de um mês.

Um pão pequeno que antes custava à volta de 20 kwanzas (10 cêntimos de euro) chega a valer agora entre 70 a 100 kwanzas (37 a 53 cêntimos), enquanto um cassete, maior, passou para o dobro, 100 kwanzas. Além disso, é já costume formarem-se filas à porta destas padarias de bairro e mesmo nas grandes superfícies.

A tradição de "mata-bichar", um pequeno-almoço que em Angola obriga a ter à mesa pelo menos pão com manteiga ou com omelete, está agora dificultada para famílias que já estavam a braços com o aumento generalizado dos preços de todos os restantes produtos.

"Os meus filhos gostam mais é de pão com leite ou com chá. Quando você dá um 'mata-bicho' de arroz com lambula [sardinha maior] eles dizem que não 'mata-bicharam'", queixa-se à Lusa Paula Marques, de 32 anos, a viver em Luanda.

Comprava habitualmente, todos os dias, logo pela manhã, pelo menos 10 pães, mas a subida de preço dos últimos dias já só permite levar cinco: "Não chega para nada. Eu só queria saber porque é que o trigo subiu desta forma", questiona.

Em média, o preço do saco de 50 quilos de farinha trigo disparou de pouco mais de 3.000 kwanzas (16 euros) para quase 30.000 (160 euros), em menos de dois meses, com os fornecedores a alegarem dificuldades de importação, por falta de divisas tendo em conta a crise que Angola atravessa.

António Bula, de 31 anos, recorda que gastava há poucas semanas à volta de 100 kwanzas (53 cêntimos) em pão para o "mata-bicho" dos três filhos, quando hoje não chegam 300 kwanzas (1,6 euros) diários.

"E não serve, por causa do preço, está muito caro", afirma, admitindo que sem pão, resta o arroz seco com lambula e chá para começar o dia: "Estamos a sofrer muito", lamenta.

À conversa com a Lusa, Fernando Paulo da Costa, de 29 anos, dá voltas para tentar explicar a subida dos preços e as dificuldades que enfrenta: "Foi subindo sem a gente perceber porquê", diz.

Mora em Luanda e compra um pão por 100 kwanzas, algo que a sua bolsa não permite: "Antes comprava 10 só para o pequeno-almoço e agora apenas três ou quatro, mas não tem chegado para nada".

"Às vezes fazemos um arroz com chá, só para tentar aldrabar o estômago", desabafa.

Literalmente do outro lado do balcão está Alfa Amoro, nascido há 31 anos na Guiné-Bissau e naturalizado angolano, atualmente gerente de uma padaria de bairro, em Luanda.

No seu pequeno negócio cada pão custa entre 70 a 200 kwanzas (37 cêntimos a um euro), o dobro desde junho, aumentos que tenta explicar com o preço galopante da farinha de trigo.

"Não sei, fico admirado com a subida do preço. Uma coisa que era 3.000 subiu para 20.000 e tal", conta à Lusa.

O negócio, admite, também já não é o mesmo, até porque os clientes -- quer seja ao balcão ou para revenda na rua - começam a arranjar outras alternativas ao pão. "Antes tinha mais negócio, agora não", afirma.

Como exemplo refere a caixa de pão que as mulheres compravam na padaria para depois revenderem nas ruas, durante o dia, que ainda há poucas semanas custava 800 kwanzas (4,20 euros).

"Hoje tenho de vender por 2.800 kwanzas [15 euros]", remata.

Dos 13 produtos alimentares que constituem a cesta básica, a farinha de trigo foi a mais importado por Angola em 2016, ascendendo a quase 800 milhões de dólares (715 milhões de euros).

PVJ // EL - Lusa

Eleições presidenciais. Hoje é dia de reflexão antes da 2ª volta em São Tomé e Príncipe



Liliana Henriques, São Tomé - RFI

Depois de um pouco mais de uma semana de campanha eleitoral para a segunda volta das presidenciais deste domingo em São Tomé e Príncipe, escrutínio com um único candidato, Evaristo Carvalho, da ADI no poder, este sábado marca é dia de reflexão.

No termo de dias de intensa controvérsia em torno dos resultados da primeira volta que levaram o presidente cessante Manuel Pinto da Costa e a antiga primeira-ministra Maria das Neves, respectivamente o segundo e a terceira mais votados, a pedirem a anulação do escrutínio –pedido ao qual a justiça não acedeu- Evaristo Carvalho que obteve um pouco mais de 49% dos votos na primeira volta de 17 de julho, ficou a ser o único candidato na corrida para a presidência, após o seu mais directo adversário, Pinto da Costa, ter desistido de concorrer à segunda volta.

Neste quadro já por si complexo, os partidos da oposição anunciaram esta semana que retiravam todos os seus representantes da Comissão Eleitoral Nacional, uma situação inusitada que não deixou de agudizar as fricções no seio da sociedade são-tomense ao ponto da ONU ter mandatado esta semana para o país um enviado especial do Secretário-geral para África Central, Abdoulaye Bathili.

Após ter-se avistado com todos os actores políticos do país, o enviado especial não escondeu algum receio e expressou o desejo de que a tensão não atinja os níveis de outros países africanos onde as crises são manifestas.

É por conseguinte num clima de expectativa redobrada que se perspectivam as eleições de amanhã. 111.222 eleitores são chamados às urnas este domingo, 7 de agosto, em S. Tomé Príncipe, num escrutínio para o qual a sociedade civil não envia observadores informais em sinal de protesto contra o acto que consideram ilícito.

Também ausentes estão a União Africana e a União Europeia que não enviaram nenhum observador, a CEEAC e alguns dos países com representação diplomática no pais sendo os únicos a estarem presentes, totalizando o número de aproximadamente 20 observadores internacionais nestas eleições.

Brasil. SÓ A ELEIÇÃO NOS SALVA



A marcha do golpe se acelera e sua natureza vai se revelando despudoradamente. A flagrante violação das regras do Estado de Direito, combinada com a natureza autoritária que o governo interino já não dissimula, precipitam o Brasil numa ditadura civil

Tereza Cruvinel, de Brasília:- em Correio do Brasil

Desta tragédia só podemos nos salvar por uma nova eleição presidencial, como um sal purificador. E o caminho para as urnas não tem atalho, senão pela convocação de um plebiscito que, revelando o anseio nacional pela escolha de um presidente legítimo, force o Congresso a fazer a alteração constitucional necessária. Se o Congresso tivesse mesmo compromisso com a voz das ruas, fazendo sempre o que ela pede, como apregoa, não estaria o Senado legalizando o golpe, mas tratando de viabilizar a saída pelas urnas.

É este o clamor que as pesquisas de opinião revelam. Ao longo das próximas semanas o Senado escolherá entre o papel que representou em 1964, quando avalizou a deposição militar do presidente Goulart, e o alinhamento com a vontade popular e a legalidade.

Dilma vem apontando o caminho certo, o do plebiscito. Precisa enfatizar mais que deve ser absolvida porque não cometeu crime mas que, uma vez restaurado seu mandato, seu compromisso será com a realização de um novo pleito.

Nas últimas horas o traço golpista do impeachment expôs-se em toda sua extensão. O relator na comissão especial, Antônio Anastasia, ao condenar novamente Dilma à cassação, ignorou todas as demonstrações de que ela não cometeu crime de responsabilidade. Ignorou a perícia do próprio Senado e a palavra de um procurador federal, afora todas as argumentações da defesa e a palavra de outros depoentes.

O vice-presidente em exercício pressiona o presidente do Senado a antecipar a votação do parecer em plenário para que ela ocorra antes da cassação de Eduardo Cunha. E assim, quando e se Cunha atirar contra Temer, as favas já estão contadas. Muito embora, como já dito aqui, Temer é uma figura descartável pelo status quo, que não hesitará em fazê-lo se Cunha o ferir de morte. Mas se isso acontece no ano que vem, teremos a lamentável eleição indireta de um presidente pelo Congresso apodrecido que aí está, golpeando a própria democracia que lhe deu origem.

Na segunda-feira saberemos se o presidente do STF, Ricardo Lewandowski, a quem a Constituição reserva a condução do processo, concordará com esta manobra. Sorrateiramente, uma comissão aprovou hoje o aumento dos vencimentos dos ministros do STF, que ganham o teto salarial do setor público. O aumento se reproduzirá em cascata, gerando mais gastança, apesar do discurso oco da austeridade.

Ao olhar externo, o Brasil vai se afigurando como um país antidemocrático e autoritário. Vai se isolando. O presidente de Portugal chegou ontem ao Rio e se isolou no Palácio São Clemente. Não quer contatos com o governo golpista, para não contrariar a opinião pública portuguesa. A Venezuela lançou ontem um comunicado que explicita a destruição dos laços de amizade pela chancelaria interina de José Serra. Da vizinhança sul-americana, poucos chefes de governo virão para as Olimpíadas. Não reconhecem o governo interino de Temer, que age como efetivo.

E aqui, se consumado o golpe pelo Senado, vamos mergulhar não apenas na ditadura, mas no retrocesso social, por artes de uma política neoliberal que planeja subtrair direitos e entregar os problemas sociais à mão impiedosa do mercado. Tudo o que Brasil conquistou em matéria de redução da desigualdade nos últimos anos irá pelo ralo, com a restauração do velho padrão em que a renda e a riqueza são para poucos.

De toda esta tragédia, só a nova eleição nos salva. Um conservador, se eleito, será um presidente legítimo. É sobre esta escolha entre o arranjo golpista e a vontade popular que os senadores devem refletir nos próximos dias, conversando com as tradições republicanas da Casa que integram, pelo voto popular.

*Tereza Cruvinel, é jornalista.

Brasil. PARA UM MAPA DOS HOMICÍDIOS EM SÃO PAULO



Ponte Jornalismo analisa novos dados do governo paulista. Dos 338 mortos, em apenas um ano, 75% são pretos e pardos; 99%, homens; quase todos pereceram nas periferias

Kaique Dalapola, na Ponte – Outras Palavras

Boletins de ocorrências divulgados pelo Portal da Transparência da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo apontam que 73% dos mortos em decorrência de suposta oposição à intervenção policial no município de São Paulo, entre 1º de junho de 2015 e 31 de maio de 2016, são pardos ou pretos. Nos 326 boletins registrados, ainda constam a idade de 247 pessoas mortas. Conforme os BOs, 45% das vítimas na capital paulista têm entre 18 e 24 anos. Dos 338 mortos, 336 eram homens.

Ainda de acordo com os dados, tais ocorrem, em sua imensa maioria, nas periferias da cidade. Os seis bairros que atingiram ou ultrapassaram o número de 10 óbitos do tipo nesse período de um ano são todos periféricos. Itaim Paulista está em primeiro, com 15 mortes; em segundo, Itaquera, com 14; seguido por Cachoeirinha, com 13; e Brasilândia, Jardim Angela e Sapopemba, com 10 mortes em cada bairro.

A classificação dada pela Secretaria de Segurança Pública de São Paulo como “Morte Decorrente de Oposição à Intervenção Policial” foi criada pela Resolução nº 5/2013 (baixe na íntegra) sob o argumento de padronizar os registros dos casos que tenham havido morte de pessoas que supostamente entraram em confronto com policiais, denominados anteriormente como “auto de resistência” ou “resistência seguida de morte”.

A alteração dos termos ocorreu por pressão de familiares de vítimas e coletivos de direitos humanos, que denunciavam que estes eram utilizados para ocultar execuções sumárias realizadas por policiais e, consequentemente, impedir sua punição.

Mesmo com a mudança, especialistas e grupos de defesa dos direitos humanos acreditam que não houve alteração na mentalidade do Estado em tratar cidadãos como inimigo, sobretudo quando são negros e de regiões periféricas, mantendo, assim, o acobertamento de práticas de execuções.

O portal da Transparência da SSP foi lançado pelo Governo do Estado de São Paulo em 9 de maio deste ano, com boletins de ocorrências desde janeiro de 2013, atualizado até o mês de maio de 2016. 

Nos boletins, são fornecidas informações pessoais dos mortos, além de data e local da ocorrência. No entanto, os históricos dos B.Os devem ser solicitados separadamente, via SIC (Serviço de Informação ao Cidadão).

Brasil contra Rio2016. Polícia reprime manifestantes em São Paulo e detém 35 pessoas



A Polícia Militar brasileira reprimiu na sexta-feira, com cassetetes e gás pimenta, manifestantes que iniciaram uma caminhada na Avenida Paulista, em São Paulo, para protestar contra a realização dos Jogos Olímpicos no país, e deteve 35 pessoas.

Desde o início que o protesto, iniciado ao final da tarde, foi acompanhado por policiamento ostensivo, com carros, motos e elementos da Tropa de Choque, escreve a Agência Brasil.

Numa longa faixa que os manifestantes exibiam lia-se: "Juventude combatente contra o massacre olímpico".

Imagens televisivas mostram o uso da força contra alguns dos participantes no protesto e dezenas deles sentados no chão, cercados pela polícia.

Segunda a polícia, citada pelo portal G1, 35 pessoas foram detidas.

A polícia justificou que os manifestantes lançaram pedras e paus contra os agentes e não definiram um itinerário.

O protesto decorreu pouco antes do início da cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos 2016, no Rio de Janeiro, que terminarão a 21 de agosto.

A organização do evento no país tem sido alvo de vários protestos, por ocorrer numa altura em que o Brasil enfrenta uma profunda recessão e uma taxa de desemprego de 11,3%.

ANYN // MP

JOGOS OLÍMPICOS DEPOIS DO GOLPE DE ESTADO NO BRASIL. OLIMPICOS DA CORRUPÇÃO?




Mário Motta, Lisboa

Foi pela meia-noite em Lisboa que os jogos olímpicos abriram no Rio de Janeiro. Cerimónia que com mais pormenor menos pormenor não é diferente dos jogos anteriores, nem a organização, nem os que compõem o comité olímpico, nem nada. Fala-se de corrupção no Brasil, fala-se de corrupção nas olimpíadas. Estão todos muito bem uns para os outros. No país do golpe que elevou corruptos e golpistas aos poderes a podridão dos jogos olímpicos (sem maiúsculas por representarem tanta pequenez) assenta bem. Que é desporto, não é política. Pois. Então vejam bem o que aconteceu com os atletas da Rússia, por exemplo. Se não é política da mais suja que existe aproveitando o desporto o que é?

O Brasil é um dos países onde mais são violados os Direitos Humanos. Onde a elite ressabiada e saudosa dos “coronéis”, marcadamente neoliberal-fascista, corrupta, criminosa na completa acessão do termo, golpista, e mesmo assim tem o reconhecimento e os mimos do mundo ocidental, dito civilizado e desenvolvido. Assim como do resto do mundo onde preponderam os ditadores, os criminosos, os corruptos, os da alta finança que dominam e beneficiam da exploração dos povos, suas doenças, guerras, êxodos e sua mortandade. E mesmo assim apelam ao tal “espírito olímpico”, à paz, com as máscaras da hipocrisia que tão bem lhes reconhecemos.

Preparem-se para daqui por uns tempos lerem em grandes manchetes sobre negociatas ilícitas e corrupções nestes jogos olímpicos do Rio. Repetem-se os crimes das elites, os crimes dos de colarinho branco e mãos abundantemente sujas. Estamos cá para ver e relembrar esta nossa previsão. Previsão que não tem nada de extraordinário, ainda para mais com os “jogos” a ocorrerem no Brasil do presidente, governo e tribunais golpistas.

Entretanto as manifestações de protesto abundam pelo Brasil vítima do golpe e dos atropelos à democracia e ao povo, aos Direitos Humanos. A repressão aos manifestantes é soberba. Só isso, quando não é o caso da polícia decidir assassinar brasileiros como é seu hábito. Brasileiros, de preferência, de pele negra. O racismo à solta juntamente com o golpismo dos que se auto-intitulam… governantes e presidente. Há ainda juízes cúmplices que também condenaram ao limbo a democracia brasileira e justiça social em desenvolvimento. Agora, mais que antes, a corrupção anda à solta no Brasil, de mãos dadas com a impunidade dos criminosos do colarinho branco.

Da TSF a breve descrição da abertura dos tais jogos.

Começaram os Jogos Olímpicos

Cerimónia oficial de abertura no estádio Maracanã fez referência às caravelas portuguesas que chegaram ao Brasil.

A cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos Rio2016 começou às 00:00 de Lisboa no estádio do Maracanã.

O espetáculo contou com a participação de 5.500 voluntários e 200 bailarinos que interpretaram diversas coreografias multimédia contando a história do Brasil desde o tempo pré-descobrimentos até aos dias de hoje, incluindo referências às caravelas portuguesas que chegaram ao país.

Com o estádio cheio de público mas com uma presença limitada de chefes de Estado, comparando outras olimpíadas, apenas 4 Presidentes marcaram presença: Marcelo Rebelo de Sousa (Portugal), François Hollande (França), Mauricio Macri (Argentina), Horacio Cartes (Paraguai).

Também assistiram à cerimónia, o secretário norte-americano de Estado, John Kerry, e o vice-presidente de Angola, Manuel Domingos Vicente.

As Nações Unidas fizeram-se representar por Ban Ki Moon, secretário-geral da ONU.

TSF

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