João
Galamba – Expresso, opinião
Vale
a pena consultar o que a Fitch foi dizendo ao longo dos últimos dois anos sobre
Portugal e os bancos portugueses para perceber a razão pela qual o rating da
dívida pública portuguesa não seguiu a trajectória que, durante o ano de 2015,
se esperava que viesse a ocorrer em 2016 e 2017. Não é porque este Governo
existe, como Maria Luís Albuquerque afirmou num evento da JSD, é porque a
verdadeira dimensão dos problemas e desafios no sector financeiro só se tornou
conhecida após as eleições. A 25 de Setembro de 2015, a poucos dias das
eleições, a Fitch dava um rating BB+ com outlook positivo à dívida pública
portuguesa. Portugal, dizia
a Fitch em comunicado, tinha a economia a crescer em linha com a média da
zona euro, ia ter um défice abaixo dos 3%, o que permitiria sair do
procedimento por défices excessivos, e apresentava um sector financeiro
estável. O único risco era o adiamento da operação de venda do Novo Banco que
criava “um risco elevado do Novo Banco ser vendido por menos do que o valor da
sua capitalização (4,9 mil milhões de euros)”. Até na Caixa Geral de Depósitos
o discurso do então Primeiro-Ministro era sobre o reembolso do dinheiro
injectado pelo Estado, e não de qualquer necessidade adicional de capital. Ou
seja, até às eleições, o que se discutia era quanto é que o Estado ia reaver do
dinheiro injectado no sector financeiro, não quão mais é que teria de injectar
no futuro. Desde então, tudo mudou.
O Banif, que a Fitch considerava estável, foi resolvido a 20 de Dezembro, menos de um mês após a tomada de posse do actual Governo.
Também em Dezembro, no dia 29, por determinação do Fundo de Resolução, o Novo Banco foi recapitalizado em mais 2 mil milhões de euros. Em menos de uma semana um banco tido como estável desapareceu e um banco tido como sólido e uma resolução tida como irrepreensível resultaram em algo que a Fitch classifica de “restricted default”. 6900 milhões de euros de capital depois, a melhor oferta pelo Novo Banco implica que o Estado tenha de pagar para vender. A estabilidade de Setembro de 2015 revelava-se, assim, uma ilusão. Isto teve impacto na credibilidade do país, levou a um ajustamento (em alta) da trajectória da dívida pública e, em março, a uma degradação do outlook do rating, que passou de positivo a estável. Desde então, e até ao presente, a Fitch diz que a situação melhorou. Sim, melhorou. É certo que a realidade é pior do que se esperava, mas, depois de desfeita a ilusão da saída limpa alimentada até às eleicões, os problemas têm sido enfrentados e estão resolvidos ou em via de resolução: o problema da recapitalização da Caixa foi resolvido, o BCP foi recapitalizado e as dúvidas em torno da estrutura accionista do BPI desapareceram. O maior problema, que vem de trás, e que a oposição não parece considerar ser um problema, muito menos uma prioridade, é a questão do crédito mal-parado, que a Fitch reconhece ser uma prioridade política do actual Governo. Uma solução sistémica para este problema parece ser, para a Fitch, um evento que melhoraria as perspectivas para a evolução do rating Português. Se tal vier a acontecer, será seguramente por causa de medidas do actual Governo, medidas que deviam ter sido tomadas no passado e cujo adiamento prejudicou o financiamento da economia portuguesa.
Ao contrário do que afirmou Maria Luís Albuquerque, a situação não se deteriorou face a 2015, deteriorou-se face previsto (e anunciado) até às eleições, mas está agora melhor face ao que a Fitch previa quando, em Março, já sem a ilusão da saída limpa, baixou o outlook da dívida portuguesa de positivo para estável. O sector financeiro está estabilizado ou em vias de estabilização. O défice, com ou sem medidas extraordinárias, vai ficar bastante abaixo do que a Fitch previa em Março, permitindo – finalmente - a saída do procedimento por défices excessivos. O emprego e as contribuições sociais crescem acima do que cresceram em 2015 e bastante acima do que a Fitch achava possível. A economia está melhor do que estava quando o actual Governo assumiu funções: estava a desacelerar, baixando para 1.4% no segundo semestre de 2015, e agora está (em termos homólogos) a crescer acima do que cresceu em 2015 e a acelerar, terminando o ano a crescer mais do que os 1,6% do terceiro trimestre. A Fitch prevê que a economia cresça 1,5% em 2017, exactamente o mesmo que previa para este ano, em 2015, quando o outlook era positivo.
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