A
catástrofe de Pedrógão Grande constitui expressiva fonte de aprendizagens e
ensinamentos, no que concerne ao sistema de proteção civil, tal como se
encontra estruturado em Portugal. Este é o momento para se parar e refletir
sobre o sistema que temos e o sistema de que o País necessita.
Duarte
Caldeira | AbrilAbril | opinião
A
catástrofe de Pedrógão Grande ocorrida no passado dia 17 de Junho constitui uma
expressiva fonte de aprendizagens e ensinamentos, no que concerne ao sistema de
proteção civil, tal como ele se encontra estruturado em Portugal.
Estão
em curso múltiplos relatórios, inquéritos e estudos tendo em vista, sobretudo,
apurar responsabilidades. Deste modo, procuram-se alguns bodes expiatórios
sobre os quais se possam imputar todas as culpas. Com o processo em curso,
corre-se o risco de se perder uma excelente oportunidade para ir ao âmago do
problema. E qual é o problema?
Passaram
dez anos desde a última reestruturação do sistema de proteção civil, ocorrida
em 2006-2007. Após um início de século marcado pela instabilidade política e a
sucessiva mudança de responsáveis dos serviços do sistema, foi possível
conceber e estabilizar o modelo e a estrutura do mesmo, centrado nas
competências da Autoridade Nacional de Proteção Civil, entretanto criada.
No
período em análise ocorreram quatro momentos de provação do sistema, todos
associados a um dos riscos identificados no território do Continente. Refiro-me
aos incêndios florestais de 2003, 2005, 2013 e deste ano de 2017.
Pela
sua natureza espacial, meios empenhados, multiplicidade de entidades e
instituições envolvidas, complexidade do comportamento do fogo, avaliação
sistemática de variáveis científicas – como a meteorologia e outras –,
delimitação de competências e responsabilidades dos vários níveis do exercício
do poder democrático – central e municipal – e a grande exigência no domínio da
decisão estratégica, o combate a um grande incêndio é uma operação de proteção
civil. Mas é também um teste à eficácia e eficiência do sistema no seu todo.
É
aqui que a questão se centra. Em todas as quatro ocorrências anteriormente
referidas revelaram-se fragilidades, que se repetiram, uma após outra, com
trágica gravidade no incêndio de Pedrógão Grande, dado que neste perderam a
vida 64 cidadãos indefesos.
Numa
primeira avaliação, o colapso da capacidade de evacuação das populações
ameaçadas pelas chamas, em várias povoações e na triste Estrada Nacional 236-1;
a fragilidade da organização dos serviços municipais de proteção civil e a
falta (ou inoperacionalidade) de instrumentos de planeamento e intervenção como
o Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios e o Plano Municipal de
Emergência; a deficiente interpretação da função de Comando de Operações de
Socorro nas várias fases da operação; a falência das comunicações em decisivos
momentos, com particular responsabilidade para as vulnerabilidades –
conceptuais? – do Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de
Portugal (SIRESP) e a deficiente aplicação do Sistema de Gestão de Operações na
organização do Teatro de Operações são algumas das debilidades sistémicas que
exigem ponderada análise e sustentada solução.
Face
ao quadro exposto, entendo que este é o momento para se parar e refletir sobre
o sistema que temos e o sistema de que o País necessita.
Apurados
os resultados eleitorais das autárquicas e empossados o novos eleitos dos
órgãos municipais e de freguesia; concluídos os relatórios e os inquéritos em
curso sobre os incêndios de Pedrógão Grande e outros ocorridos este ano na
região Centro; com um governo detentor de tempo até ao fim da atual
legislatura, o ano de 2018 deve ser uma inadiável oportunidade para se
revisitar o sistema de proteção civil, avaliar as suas fragilidades e
robustecê-lo com um conjunto de medidas – não exclusivamente legislativas – que
ataquem as causas das suas debilidades. E essas são facilmente identificáveis.
Abordá-las-ei
em próximo texto.
O
autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990
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