Martinho Júnior | Luanda
1- Em resultado dos longos
processos coloniais, quer em África quer na América Latina, verifica-se:
- Que continuam a prevalecer os
conceitos geoestratégicos da colonização, inerentes à chegada pelo mar dos
colonizadores europeus;
- Que em resultado disso, nos
países com fronteira marítima, as regiões de ocupação humana foram-se
concentrando fundamentalmente junto ao litoral, ocorrendo povoamentos dispersos
em função das linhas de penetração e havendo regiões onde ainda só pode haver
intervenção, em resultado da muito baixa densidade populacional, na
profundidade continental, junto dos limites territoriais;
- Que algumas questões de ordem
físico-geográfico-ambiental concorreram também para a inaptidão colonial em
combater as assimetrias, entre elas a existência de desertos e a de formações
geológicas pouco atractivas para a agricultura e florestas plantadas pelo
homem;
- Que as capitais, quase sempre
as primeiras cidades a serem fundadas no território colonizado, se encontram no
litoral, ou muito próximo dele, influenciando de muitos modos e até hoje, na
continuidade da perspectiva geoestratégica colonial, pelo que as regiões de
intervenção estão situadas à ilharga, diametralmente opostas;
- Que o conjunto desses
fenómenos, determinaram acentuadas assimetrias nos territórios nacionais, que
ancoram o subdesenvolvimento crónico herdado da colonização nos novos estados
formados a partir dela;
- Que com as independências e o
exercício das respectivas soberanias, necessário se torna de criar uma nova
perspectiva geoestratégica, única forma de, combatendo as assimetrias, se poder
levar a cabo a longa luta contra o subdesenvolvimento.
2- Quer Angola, quer a Venezuela
enfermam ainda do “diktat” da geoestratégia colonial que perdurou
durante séculos e até aos nossos dias, não tendo havido ainda suficientes
capacidades para implantar uma geoestratégia nacional capaz de diminuir as
assimetrias, ampliar as regiões de ocupação humana, diminuir o espaço das
regiões sob intervenção e vencer o subdesenvolvimento crónico herdado do
passado.
O território angolano, grosso
modo um quadrado, tem nos triângulos leste e sul (Lunda Norte, Lunda Sul,
Moxico, Cuando Cubango, Cunene e Namibe), as suas maiores regiões de
intervenção, com densidades populacionais ao nível de 5,58 habitantes por km2.
Essas 6 províncias possuem no
total uma extensão de 747.901 km2, ou seja, 60% do território nacional,
todavia, possuem 4.173.337 habitantes, apenas 16% da população angolana.
Angola possui 1.600km de costa e
as seguintes fronteiras terrestres:
- Congo (a norte) – 231km;
- República Democrática do Congo
(norte e leste) – 2.646km;
- Zâmbia (leste) – 1.427km;
- Namíbia (sul) – 1.065km.
O território venezuelano por seu
turno, um imenso triângulo com base na costa do Mar das Caraíbas a norte (2.800
km) e vértice a sul (estado do Amazonas), possui as seguintes fronteiras
terrestres:
- Colômbia (a oeste) – 2.341km;
- Brasil (a sul) – 2.137km;
- Guiana (a leste) – 789km.
As três províncias do sul (Apure,
Bolivar e Amazonas), compõem o seguinte quadro:
- Área total de 494.645 km2, o
equivalente a 53% do território nacional;
- População de 2.706.032, ou
seja, apenas 8% do total nacional;
- Densidade média de 5,47
habitantes por km2 (muito similar às regiões de intervenção em Angola) e apenas
o cômputo de 8% da população nacional.
3- Se levarmos em linha de conta
os aspectos físico-geográficos-ambientais-hidrográficos da Venezuela,
verifica-se em relação ao maior fluxo hidrográfico nacional (o Orinoco, com
2.100 km de extensão e um delta muito largo na foz):
- Que é fundamentalmente desde a
sua margem direita até à fronteira a leste, correspondendo a toda a meseta
geológica planáltica da Guiana (a mais antiga formação geológica da América),
onde a densidade de ocupação humana é menor;
- Que a bacia do Orinoco perfaz
um imenso arco em torno da Meseta da Guiana, contornando essa meseta, à
excepção lógica da fronteira com a Guiana;
- Que é a sul, na região
geográfica mais diametralmente oposta a Caracas (Estado do Amazonas), onde se
regista precisamente a mais baixa densidade populacional da Venezuela;
- Que essa bacia é por
conseguinte fundamental para melhor se discernir a limitação entre a região de
maior ocupação humana e político-administrativa da Venezuela, a norte (421.800
km2, correspondendo a 47% do território nacional, com 92% da população, ou
seja, 29.069.339 habitantes) e a região de intervenção a sul (Estados de Apure,
Bolivar e Amazonas, a sul).
Em Angola, um fenómeno similar
ocorre com o curso do rio Cuanza (960 km), inteiramente em território nacional,
mas nascendo no fulcro da rosa dos rios angolana, a região central das grandes
nascentes, fulcro onde nascem outros importantes rios:
- Que é nos triângulos leste e
sul (a leste e a sul do Cuanza), que existe a menor densidade populacional e a
malha político-administrativa é mais alargada, o que corresponde a uma imensa
região para intervenção com 747.901 km2, ou seja 60% do território nacional,
com 4.173.337 habitantes, apenas 16% da população total de Angola;
- Que o arco da bacia do Cuanza
contorna o maciço de serras a ocidente, região planáltica e de altitude que
possui habitat mais disperso e de maior densidade em termos de ocupação rural
do território em Angola;
- Que é relativamente próximo de
sua foz (estuário) onde se situa a capital, cuja província é a mais densamente
povoada de Angola;
- Que é precisamente a sudeste da
capital, na região mais diametralmente oposta a ela, situada a sudeste (Moxico
e Cuando Cubango), onde se registam as mais baixas densidades demográficas.
4- Há portanto entre a Venezuela
e Angola muitos aspectos similares relativos às assimetrias regionais:
- Sob o ponto de vista
hidrográfico, ao delimitar as regiões de maior ocupação humana e as de
intervenção, a valorização geoestratégica do Orinoco e do Cuanza são “plataformas” que
se aproximam de tal modo que são referências comuns para uma geoestratégia para
um desenvolvimento sustentável, ao nível dum exercício saudável de
independência e soberania de cada um dos países, com vista a esbater as
assimetrias;
Sob o ponto de vista humano e
tendo em conta as necessidades dessa geoestratégia vocacionada para a projecção
dum desenvolvimento sustentável garante de independência, de soberaniae gerador
duma cultura de inteligência, ao mesmo tempo eliminando assimetrias, as bacias
dos dois rios são incontornáveis para ter basicamente em conta e fundamentar
todas as projecções vocacionadas para o futuro.
(Para ver melhor clique nas imagens)
(Continua)
Martinho Júnior - Luanda, 23 de Março de 2018
Mapas:
- Os dois primeiros referem-se à
orografia e à hidrografia dos territórios de Angola e Venezuela;
- Os 3 e 4 dão uma ideia sobre as
regiões de ocupação e as de intervenção em ambos os países (densidade
populacional);
- O 5º refere-se à limitação das
regiões de ocupação com as de intervenção em Angola, publicado por Martinho
Júnior no Página Global - aqui: http://paginaglobal.blogspot.pt/2016/01/geoestrategia-para-um-desenvolvimento.html
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