Em homenagem aos camaradas Lúcio
Lara e Jorge Silva, “Sapo”, heroicos combatentes das justas causas
angolanas; as três fotografias em que aparece o camarada Lúcio Lara, foram
tiradas pelo camarada “Sapo” num “longínquo” Primeiro de
Maio, quando o MPLA era Partido do Trabalho e quando Angola era uma República
Popular
Martinho Júnior | Luanda
1- Terminou a VIII Cimeira das
Américas na capital do Peru, Lima, com um balanço que revela o ambiente de luta
que sem tréguas move a humanidade naquela parte do planeta.
A VIII Cimeira correspondeu
fundamentalmente aos estímulos das oligarquias americanas agenciadas pelos
Estados Unidos, acirrando-se dialeticamente contra os sectores progressistas
das Américas, numa autêntica corruptela de democracia e incapaz de elas
próprias terem hipótese de se defender de todo o tipo de acusações de corrupção
em que se debatem, protagonizam e elas mesmo tornam públicas.
A Venezuela Socialista e
Bolivariana, dilecto alvo da corruptela ao sabor da hegemonia unipolar, não foi
convidada e o seu processo democrático está a ser posto em causa por todas as
cumplicidades e conivências vassalas, pois o seu modelo, com toda a
legitimidade participativa e de dimensão popular, é um pavor para a “representatividade” apropriada
e moldada ao jeito dos interesses do império da doutrina Monroe e suas
agenciadas oligarquias, ainda que elas tantas contradições internas demonstrem
sem limites acarretar.
Cuba esteve pela segunda vez
consecutiva e chamou mais uma vez a si o papel de assumida vanguarda
progressista nesses contenciosos históricos.
Às oligarquias americanas
interessa o pântano das disputas entre seus artificiosos quão corruptos clãs,
marginalizando os processos de aprofundamento democrático-popular e inclusive o
do voto popular pelo que, tendo a Venezuela ao longo dos últimos 20 anos
multiplicado as iniciativas eleitorais, esse facto indesmentível e “insuportável”,
é por si considerado pela corruptela como uma afronta, pois faz cair pela base
qualquer veleidade “democrática” da estrita conveniência dessas
oligarquias fantoches.
Depois a Venezuela disseminou um
conjunto muito alargado e profícuo de missões…
O Comandante Hugo Chavez,
enquanto militar, soube aproveitar bem o termo “missões” para levar a
cabo a imensidão de tarefas que há “civilmente” a realizar para fazer
face ao subdesenvolvimento herdado do passado longínquo e do passado próximo,
missões que na generalidade estão vocacionadas para a melhoria das condições de
vida do seu povo, particularmente das classes mais desfavorecidas, exploradas
pela gritante desigualdade injectada durante séculos.
Com as missões ao mesmo tempo
abrem-se autênticas avenidas desburocratizadas capazes de mobilização e
aglutinação de vontades e aspirações com metas, com objectivos, com prazos, com
um inventário enorme de iniciativas que de fase para fase vão-se aperfeiçoando
e multiplicando sem remissão...
Face a isso, as cristalizadas
oligarquias americanas têm sentido um efeito de pânico, como se a terra fugisse
debaixo dos pés, por que o espaço sócio-político onde têm vindo a empenhar sua
base “de representatividade”, como nunca foi, não é, nem alguma vez será
dinâmico, inteligente ou criativo (é típico dos que assumem a bárbara cultura
do egoísmo capitalista), muito menos popular, é a percepção dum contínuo
terramoto de baixa intensidade que não conseguem fazer parar e as sacode até às
entranhas!
2- Os sectores progressistas
aproveitaram a VIII Cimeira da América para questionar de forma lúcida,
oportuna e directa o que se passa em relação à corrupção na América, tirando
partido dos “fenómenos” de entidades como o presidente deposto no
Peru, Pedro Pablo Kuczynski, da suja vulgaridade brasileira
identificada com o estado dirigido por Temer, da figura de proa da Organização
de Estados Americanos, Almagro, ou de Marco Rubio, da Florida, defensor
agenciado e acérrimo do “lobby” de armamento que tutela a Associação
Nacional do Rifle nos Estados Unidos, uma entidade que tem sido confrontada com
o massacre recente em Parkland, que deixou um saldo de 17 mortos e 20 feridos,
na sequência de muitos outros actos sangrentos similares ocorridos antes.
As oligarquias americanas desse
modo confrontadas, começam a ser despidas de sua tradicional arrogância,
uma “plataforma”psicológica e sócio-política cristalizada, utilizada até à
exaustão para barricar a sua “representatividade”.
Da “representatividade” se
ocupou o Vice-Presidente dos Estados Unidos, Mike Pence, “do alto do seu
pedestal”, fustigando em nome do Presidente Trump alvos como a Síria, Cuba e a
Venezuela.
Em relação a Cuba e à Venezuela
qualificou suas iniciativas do âmbito da democracia popular como “repressivas”,
de modo a apresentar os Estados Unidos como o grande “libertador”, a
máscara usada desde a proclamação da doutrina Monroe pelo império ao longo do
processo histórico de há mais de dois séculos a esta parte.
Aproveitaram também os progressistas
o facto de em paralelo se realizarem outras cimeiras de carácter social, entre
elas a Cimeira dos Povos, que permite atacar a alienação e o diversionismo
relativos à “sociedade civil”, aos “direitos humanos” e à “corrupção”segundo
a ótica e as conveniências da aristocracia financeira mundial e suas agenciadas
oligarquias.
Como as oligarquias mantêm
ideologias cristalizadas, conservadoras ou mesmo ultraconservadoras, racistas
ou xenófobas, desconexas em relação à multiplicidade cultural que se estende de
forma tão rica e variada sob seus olhos míopes e sob sua hipocrisia histórica,
também aí o terremoto se faz sentir, em especial quando as organizações de
jovens dos estados progressistas, com Cuba na vanguarda, se fazem ouvir de
forma acutilante, esclarecida e olhos nos olhos(os bois estão a ser chamados
pelos seus próprios nomes)!
Mesmo com a arrogância da “exclusividade
representativa”, mais uma vez também agora utilizada na VIII Cimeira das
Américas, o capitalismo neoliberal e o que resta dele disfarçado de “proteccionismo”,
está a ser confrontado até à sua perversa medula, tornando-se cada vez mais
transparente a fronteira entre a que é da civilização e o que é da barbárie,
inclusive quando se gladiam entre si os clãs de ocasião.
3- Agora que as vestes do
imperador são as do proteccionismo, à escala global, ainda de forma
aparentemente desarticulada, vão estalando as “lutas contra a corrupção”:
deitam a mão a todo o tipo de diversionismos, subversões e farsas, a fim de se
tentarem“defender”.
África reflecte essa “onda” a
nível da União Africana e de muitos dos seus membros, inclusive alguns da
África Austral (processos em curso no Zimbabwe, na África do Sul e em Angola).
Até que ponto se repetem a
propósito, os mesmos cenários que ocorrem nas Américas?
Como os processos de “luta
contra a corrupção” estão a ser levados a cabo por muitos dos implicados
nela, assiste-se a confrontações de interesses à superfície das águas, para que
nada seja alterado na profundidade causal do fenómeno sócio-político,
psicológico, económico e financeiro, quer dizer: ainda que se possam reduzir os
efeitos, a corrupção vai renascer sempre com uma geometria e com uma
intensidade variável, pois as lutas não põem em causa, antes estimulam,
os “mercados” neoliberais e por isso não se desperta para doutrinas,
filosofias e ideologias em alternativa, sobretudo para as de carácter
assumidamente socialista!
Em Angola notícias, análises e
interpretações públicas relativamente à corrupção, são correntes, mantendo-se
no entanto, salvo muito raras excepções, o mesmo tipo de abordagens doutrinais,
filosóficas e ideológicas (em regra abordagens social-democratas, ou
conservadoras, ou cristãs-democratas, ou neoliberais), típicas desses
mesmos “mercados”, ou seja, não pondo em causa as razões de casualidade
que na profundidade económica e social subsistem de acordo com os interesses
das classes que ocupam por via da usurpação o vértice da pirâmide das
desigualdades nacionais.
Pior ainda: têm levado para
dentro do próprio MPLA, esvaziado cada vez mais do seu sentido histórico, esse
tipo de ambientes e cenários, utilizando as catapultas e alavancas da tomada do
poder!
Poderíamos citar “n” exemplos
das batalhas que vão ocorrendo entre clãs de gladiadores nos pantanosos
cenários correntes do capitalismo neoliberal que ostentam o capítulo da “mudança”,
mas seleccionamos uma das últimas publicações do África Monitor, tendo em conta
que a abordagem ocorre por dentro e à volta do “suculento bife” da
Sonangol, a empresa estatal de petróleos de Angola, passo a transcrever:
“Manuel Vicente em plano
ascendente
(Pesquisa e análise)
Manuel Vicente (MV),
ex-presidente da Sonangol EP (SNL EP) e ex-vice PR, pela “mão” de José Eduardo
dos Santos (JES), tem vindo a assumir, um papel de crescente influência junto
da administração do PR João Lourenço (JL), na sequência de uma aproximação
entre JL e MV, e de distanciamento em relação ao ex-PR e família.
Reconhecido como detentor de uma
das maiores fortunas do país, e acusado pela Justiça portuguesa por
branqueamento de capitais e corrupção de um magistrado, MV assumiu-se ao longo
dos últimos meses como um dos principais conselheiros de JL, a título informal,
sobretudo para questões petrolíferas, e económicas em geral. Apesar de, para
efeitos públicos, estar dedicado aos seus negócios privados, o seu gabinete de
trabalho situa-se num edifício próximo da Presidência da República, que visita
com regularidade, para reuniões de trabalho com elementos da presidência e com
o próprio PR.
Principal sinal da crescente
influência de MV foi a sua interferência directa na destituição por JL de
Isabel dos Santos na presidência da SNL EP, e sua substituição por Carlos Saturnino
(CS), em Nov.2017. Por intercedência de MV, a escolha de JL para a SNL EP
recaiu sobre CS, e não sobre António (“Toninho”) Van-Dúnem (AVD), ex-secretário
do Conselho de Ministros, por quem JL demonstrou inicialmente preferência, e a
quem chegou a pedir um plano de reforma da SNL EP.
A exoneração por IS de CS, gestor
descrito como sendo da sua “máxima confiança”, (AM Intelligence 1077) de MV, da
comissão executiva da Sonangol Pesquisa e Produção, em Dez.2016, havia sido
interpretada em círculos políticos e empresariais como indirectamente visando a
gestão de MV. O próprio CS se insurgiu, de forma inédita, contra a decisão da
administração da SNL EP.
CS é quadro cuja ascensão nos
meios empresariais angolanos foi promovida e está intimamente ligada a MV, com
quem mantém uma relação próxima. Após a tomada de posse de CS, MV passou a
comparecer em reuniões e eventos da SNL EP, merecendo tratamento de deferência.
Também ligado de forma estreita a MV é José Lima Massano (JLM), nomeado por JL
para o cargo de governador do Banco Nacional de Angola (BNA). A carreira de JLM
no sector bancário está ligada sobretudo ao BAI, banco controlado pela SNL EP,
e sob o qual MV exerceu forte influência enquanto presidente da petrolífera.
MV vinha, nos meses que
antecederam as eleições de Ago.2017, evidenciando em círculos privados
desagrado pela forma como IS se referiu de modo depreciativo à sua
administração da SNL EP (AM Intelligence 1078), nomeadamente prolongando as
suas estadias no estrangeiro a título privado e não marcando presença em
eventos oficiais. No Comité Central do MPLA em que foram escolhidos os cabeças
de lista para as eleições de 2017 – e a que MV faltou – foi-lhe atribuída a 24ª
posição, não consentânea com o seu estatuto de ex-vice-PR.
Na cerimónia dos cumprimentos de
fim de ano ao chefe de Estado, MV não fez o discurso de agradecimento ao PR
José Eduardo dos Santos.
Foram também considerados parte de
uma campanha de descrédito contra MV ataques do Jornal de Angola, em 2017, à
construtora portuguesa Mota-Engil, que opera no país com o nome Mota-Engil
Angola. O capital da companhia está repartido entre a Mota-Engil, maioritária,
a Sonangol, o Banco Atlântico e uma empresa privada angolana. MV é referenciado
em meios políticos e políticos e empresariais locais como sendo, de facto, o
dono da referida empresa privada.
A forma dura como a administração
de JL tem visado a gestão de Isabel dos Santos (IS) na SNL EP é também
resultado da retaliação por MV em relação ao que considera terem sido ataques
de IS à sua gestão e à sua pessoa, ao longo dos últimos anos. Foram remetidas
pela SNL EP à Procuradoria-Geral da República, em Mar., indícios de crime pela
anterior administração – detalhados em conferência de imprensa pública por CS,
de forma particularmente acintosa em relação a IS.
A escalada de tensão entre ambas
as partes é evidente em procedimentos de segurança que, quer IS quer CS,
passaram a observar. A residência de ambos em Luanda está agora sob vigilância
permanente de um corpo de segurança privada. As cautelas observadas por IS
chegam ao ponto de evitar pernoitar em Luanda, preferindo chegar de manhã ao
Aeroporto e partir à noite, depois de uma série de reuniões. Londres continua a
ser o seu paradeiro mais frequente.
Em círculos independentes da
sociedade angolana, é identificada uma confluência de interesses entre JL e MV
em visar IS. Enquanto para o novo PR a exposição pública de IS como exemplo de
nepotismo e aproveitamento de fundos públicos para benefício pessoal serve
propósitos políticos – popularidade junto da opinião pública e fragilização do
ex-PR, por forma a forçar o seu abandono da presidência do MPLA (AM
Intelligence 1137), para MV a cooperação estreita com JL tem o duplo propósito
de sedimentar a sua posição no seio do regime e manter a sua influência, ao
mesmo tempo retaliando em relação a IS.
Outra evidência da importância
atribuída por JL a MV é a defesa intransigente do ex-presidente da SNL EP no
processo de que é alvo pela Justiça portuguesa - sob o argumento de que deve
ser a Justiça angolana a tratar o processo - ao ponto de ameaçar, por canais
privados, retaliação a interesses portugueses em Angola e mesmo na CPLP (AM
Intelligence 1134).
Além do processo em Portugal, MV
surgiu envolvido no processo da Cobalt, acusada pela Justiça norte-americana de
pagamento de subornos em Angola. Enquanto presidente da SNL EP, MV foi também
accionista da Nazaki Oil & Gas, parceira da Cobalt, e que contava
também entre os seus accionistas com Hélder Vieira Dias “Kopelipa” e Leopoldino
“Dino” do Nascimento, duas figuras próximas de JES.
Tem vindo a acentuar-se um
desfasamento entre a atitude das autoridades em relação ao processo judicial
que corre em Portugal contra MV, e o chamado “sentimento colectivo” (AM
Intelligence 1136). O protesto das autoridades tem dado lugar
na sociedade a sentimentos de regozijo em relação ao procedimento da Justiça
portuguesa.
Africa Monitor, # 1141,
12/4/2018”.
4- Como se não bastassem os
cenários e os intérpretes apalhaçados do pântano em que têm tentado transformar
o MPLA e o estado angolano, agora os gladiadores passaram também a exibir suas
armas e truques e jogos operativos, nos meios noticiosos nacionais e
internacionais, na Europa, nos Estados Unidos, onde quer que se aprouver, ali
onde se encontrem seus interesses, ou mesmo os vínculos dos negócios que marcam
sua passagem tão social-democraticamente “deslumbrada” quão perversa
pela Terra!
Os processos judiciais que foram
desencadeados em relação a alguns desses gladiadores em Portugal, são também
assuntos do estado português em resultado da assimilação que decorre desde o 25
de Novembro de 1975, que também tem contaminado inevitavelmente a “geringonça”.
Tudo isso se passa à margem da
legitimidade e dignidade dos interesses e aspirações do povo angolano e do povo
português, demonstrando que é em tudo um “produto” injectado em
sistemáticas doses pelo “mercado” capitalista neoliberal, por suas
alienações, por sua hipocrisia, pelo seu egoísmo sem escrúpulos, pelas suas “correntes” eticamente
decrépitas e avassaladas, pelo seu diversionismo de manchete: vale tudo para se
continuar mais do mesmo e não haver garantidamente mudança alguma, pois os
fantoches, quais palhaços ricos, ocupam os cenários sócio-políticos, conforme
os enredos das inteligências económicas das potências da hegemonia unipolar e
da vassalagem crónica dos governos portugueses a esse tipo de causas
assimiladoras!
Aplicaram a máxima de Karl Marx,
à sua maneira, ou seja à letra e a “camartelo”: “a propriedade é um
roubo” e quantos deles, o fundamentalismo a isso obriga, não o fizeram em
relação ao estado angolano e ao seu mais suculento manancial de petróleo e
diamantes, como inveterados “marxistas do mercado”?
É neste ambiente asfixiado, com
odor a enxofre e tocado por uma doença crónica, que estamos a expor uma ferida
que já vem de longe!...
Quantos dos guerrilheiros, por
exemplo, quando chegaram às cidades trocaram suas famílias camponesas da
guerrilha por famílias urbanas, com mulheres que tanto têm a ver com a
assimilação colonial e capazes de abrir as portas em direcção ao neocolonialismo,
ao enviarem-se a si e aos rebentos paridos desses laços, estudar para as mais
caras universidades dos Estados Unidos, da Grã-Bretanha, da Suíça, da “melóia” e
de outros vassalos da hegemonia unipolar, geração após geração, para tornar
ainda mais pérfida a ignomínia e rutilante a empreitada?!...
Martinho Júnior - Luanda, 17 de
Abril de 2018
Ilustrações:
Dois logotipos das Cimeiras do
Peru;
Três fotos gentilmente oferecidas
pela companheira Avane Teixeira, viúva do camarada Jorge Silva, “Sapo”
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