Rafael Barbosa* | Portugal |
opinião
Não foi ontem que as condições de
atendimento na pediatria do Hospital do S. João (incluindo a oncologia) se
tornaram "indignas" e "miseráveis". Não foi ontem que
começou a degradação do Serviço Nacional de Saúde. Não foi ontem que se
percebeu que há escolas a cair aos pedaços, e outras luxuosamente reformuladas
mas sem dinheiro para pagar o ar condicionado. Não foi ontem que se confirmou
que as linhas de caminho de ferro estão caducas, razão pela qual os
descarrilamentos se vão repetindo. Não foi ontem que professores, trabalhadores
da recolha do lixo, enfermeiros, funcionários administrativos ou polícias se
afirmaram desmotivados.
Não foi ontem que o Estado se
começou a tornar (ainda mais) disfuncional. A degradação dos serviços públicos
começou com os excessos de Sócrates, que aceleraram a bancarrota; prosseguiu
com a imposição vinda de fora (troika) e a crença vinda de dentro (Passos)
relativamente à austeridade; e mantém-se com Costa e Centeno, ainda que o
défice esteja melhor (e está), ainda que o país cresça (e cresce), ainda que
haja mais emprego (e há), ainda que se reduzam os impostos sobre o trabalho (e
reduzem). A degradação que começou com Sócrates, acelerou com Passos e se
mantém com Costa não foi nem é ditada, no essencial, por razões ideológicas
(menos Estado); foi e é ditada sobretudo por razões de emergência financeira
(Estado falido). Numa frase, não havia, nem há, dinheiro para mandar cantar um
cego.
Podemos deitar foguetes quando se
anuncia um défice de 0,7% do PIB, mas não vale a pena ir apanhar as canas.
Quando há défice, a dívida cresce. Pior, a dívida cresce porque não há dinheiro
suficiente para pagar os juros dos empréstimos anteriores. Não fosse isso e
poder-se-ia dizer que o país dá lucro (o tal saldo primário). Mas não dá. Nem
há folga, como ontem argumentavam deputados bloquistas e comunistas, fazendo as
contas à diferença entre os objetivos de défice de Centeno (0,7%) e o que
estava combinado (1%): 800 milhões de euros. Não é folga, são 800 milhões que é
preciso pedir emprestado. Pagam juros. Somam dívida.
É mau? Depende. Mais défice (e
dívida) pode representar maior sufoco no futuro (às vezes ao virar da esquina),
com corte de salários e pensões, com desemprego e precariedade laboral, com
emigração. Menos défice (e dívida) representam uma vida mais difícil no
presente, para os que precisam dos hospitais, tribunais, escolas, esquadras ou
camiões de recolha do lixo. Como dizia ontem Centeno aos deputados, o dinheiro
não é infinito. É preciso fazer escolhas. Ser ou não ser Centeno, eis portanto
a questão...
*Editor-executivo
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