Miguel Guedes | Jornal de Notícias
| opinião
A história fúnebre da Europa,
perto de se repetir aos nossos olhos. No momento em que alguns comemoram o mal
menor na Alemanha que permite - fruto do acordo entre a chanceler alemã e o seu
ministro do Interior - sustentar Ângela Merkel no poder, Portugal conta a quem
passa a ladainha mentirosa de que não é um país racista. Quando muito,
diferenciador. Tão diverso como o que se mostrou ser na agressão bárbara a uma
jovem colombiana por um fiscal da STCP na noite de S. João no Porto. O estigma
reside nessa diferença de pormenor que permite fechar os olhos a três campos de
internamento ao ar livre para refugiados, autorizados por Merkel à força de
querer evitar uma crise política interna que podia arrastar a Alemanha para
onde rasteja parte da Europa. Eis a barbárie da radicalização que se vive pela
ascensão ao poder da extrema-direita. Pela fraqueza das soluções de todo o
espectro político, a Europa rende-se à réplica dos piores momentos da história
do século XX e vamos todos fingindo que é uma atitude isolada de um fiscal numa
viagem. Fragilidade, temor e vergonha.
Fechando os olhos, divertimento e
rotinas diárias, a vida a correr costumeira. Os emigrantes portugueses em New
Jersey passaram boa parte do seu tempo de ócio no "Palace
Amusements", parque de diversões com 100 anos de história, onde gerações estacionaram
os seus veículos perto do passadiço de Asbury Park, gozando alucinação e
delírio com bilhete familiar. Mas a vida de emigração não é igual para todos na
relação luso-americana. Três décadas exactas depois do encerramento do parque
americano, um Palácio português serve uma só rainha pop, sendo a populaça a que
sofre com a portagem. O campo de concentração para veículos de Madonna avança
em Lisboa, sito nas traseiras do Palácio Pombal, propriedade da Autarquia
lisboeta. Um terreno público em saldo, sim.
Nada disto seria grave se não
fosse ultrajante para milhares de pessoas, lisboetas na sua esmagadora maioria,
que tentam estacionar na zona de Santos, um inferno bíblico-alfacinha de
enormes proporções. Sem auscultar nada nem ninguém, a decisão em velocidade vertigem
de Fernando Medina fez contrato no Palácio perto do Palacete onde a artista
vive. Não é uma visita, ela vive: Lisboa, a província de Madonna. E há quem, à
sombra da árvore do turismo, ache normal que um município escorregue nesta
casca de banana. O que agora resta do parque de diversões de Asbury Park é um
sombrio museu online. Sem tráfego mas onde ninguém aparca. Só fragilidade.
O autor escreve segundo a antiga
ortografia
*Músico e jurista
Sem comentários:
Enviar um comentário