sexta-feira, 24 de agosto de 2018

Angola | João Lourenço: "FMI não é um bicho papão"


O Presidente angolano promete aumentar o orçamento para a educação e a saúde e diz que a "nova Angola" só tem a ganhar com o apoio do Fundo Monetário Internacional. E espera eleições tranquilas na RDC.

O Presidente angolanoJoão Lourenço, terminou esta quinta-feira (23.08) uma visita de dois dias à Alemanha, dedicada sobretudo aos negócios. Antes de deixar Berlim, João Lourenço concedeu uma entrevista à DW África, em que fala sobre o pedido de assistência financeira ao Fundo Monetário Internacional (FMI), que Angola acaba de fazer, e garante que não é motivo para alarme e que o país só tem a ganhar.

O chefe de Estado promete também aumentar o orçamento para a educação e a saúde em Angola. Quanto a Cabinda, afirma que acompanha "com tranquilidade" a situação no enclave, onde tem havido denúncias de repressão e prisões arbitrárias.

No encontro que manteve com a chanceler alemã, Angela Merkel, João Lourenço também abordou a situação na República Democrática do Congo (RDC). À DW África, o Presidente diz que o seu homólogo congolês, Joseph Kabila, "foi inteligente" em não afrontar a lei e em não se recandidatar nas próximas eleições, que foram adiadas várias vezes e estão agora marcadas para dezembro.

DW África: O FMI disse esta semana que espera um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) para este ano "mais moderado do que o esperado". E agora o Governo pediu para se ajustar o programa de apoio do FMI e pediu apoio financeiro. Porquê agora este apoio e não apenas a assistência técnica, como previsto?

João Lourenço (JLo):Vamos beneficiar desse financiamento, em condições que são melhores que o crédito de outros bancos comerciais. Vamos ganhar com isso, não temos receios. Sabemos que quando se fala de Fundo Monetário Internacional tem-se a ideia de que é um bicho papão, que é preciso ter cuidado. Depende… Os programas do FMI não são todos iguais. Não estamos a falar de um resgate, a exemplo do que se passou com alguns países europeus, nomeadamente com Portugal e a Grécia. Não é disso que se trata. É um outro tipo de ajuda financeira, que não tem a gravidade que tem um programa de resgate.

DW África: O que espera das negociações com o FMI marcadas para outubro?

JLo: O que esperamos é a consolidação deste casamento, por assim dizer, entre esta nova Angola e esta instituição financeira internacional, o FMI. Aliás, não só teremos essas conversações em outubro, como eu conto receber a presidente do Fundo Monetário Internacional [Christine Lagarde], em Luanda, no próximo mês de dezembro.

DW África: O FMI disse, por exemplo, em julho, na sua avaliação anual, que o dinheiro para a educação não chega. Disse também que é preciso uma fatia maior para o Orçamento para combater as desigualdades sociais em Angola e muita gente espera mudanças neste domínio. O que é que está a ser feito para combater a pobreza no país?

JLo: Para combater a pobreza no país é necessário um conjunto de medidas, não apenas uma. Uma delas é exatamente a aposta na educação e nós estamos atentos a isso. Queremos melhorar a qualidade do ensino. Foram abertos concursos de admissão de professores para a educação, o mesmo se passa na saúde. Portanto, estamos a prestar uma atenção particular ao setor social, educação e saúde.

DW África: No próximo Orçamento vai haver mais dinheiro para a educação e a saúde?

JLo: Sim, com certeza. Com certeza.

DW África: Houve recentemente um caso descrito como uma execução sumária de um cidadão, que foi filmado a ser atingido por um agente do Serviço de Investigação Criminal (SIC). O Ministério do Interior decidiu, entretanto, responsabilizar este agente. Há novidades sobre este caso? O que é que o Governo está a fazer para fazer com que casos como este não se repitam?

JLo: Este caso em concreto está entregue à Justiça. Há outros casos… Há um caso recente de um agente do SIC que foi condenado. Portanto, este processo está a decorrer os seus trâmites junto das instâncias competentes e vamos aguardar. Não tenho outros comentários a fazer.

DW África: Em janeiro deste ano, a Frente de Libertação do Estado de Cabinda (FLEC) lamentava a falta de sinais de mudança em Cabinda com o novo Governo angolano. Como vê a situação de Cabinda?

JLo: Eu vejo a situação de Cabinda com tranquilidade. Às vezes procura-se fazer muita tempestade num copo de água. Porque é que nos acusam, não sei. Para responder, temos de responder a questões muito concretas. O que é que se passa em Cabinda? O que de mal fez o Governo em Cabinda, contra o povo que reside em Cabinda, que me digam. E eu estou disposto a responder.

DW África: Ainda em agosto, a FLEC falava, por exemplo, em repressão,intimidação, prisões arbitrárias...

JLo: As pessoas têm nomes. Prisões arbitrárias sim, têm nomes de pessoas. Houve no passado o caso de um padre de Cabinda, que esteve detido e depois foi solto, hoje até se meteu na política. Acabou por ser eleito deputado, está no Parlamento. É alguém que tem nome, é um caso concreto. Agora, falar no ar... eu também não posso responder...

DW África: A situação na República Democrática do Congo foi também um tópico que abordou com a chanceler Angela Merkel. O Presidente Joseph Kabila anunciou que não vai concorrer nas próximas eleições de dezembro. Espera mudanças na RDC?

JLo: Nós esperamos. Vamos ser otimistas, temos de ser otimistas. Em princípio, há garantia de que a 23 de dezembro do corrente ano haverá as tão esperadas eleições, que deviam ter sido realizadas há algum tempo. Mas como se costuma dizer, antes tarde que nunca. Vão acontecer e com novos atores políticos. O Presidente Kabila cumpriu a Constituição, cumpriu os acordos de São Silvestre, assinados com a oposição e mediados pela Igreja Católica. Agora só temos de desejar que o processo decorra dentro da maior tranquilidade. Em princípio, um dos fatores que poderia concorrer para a falta de tranquilidade já foi removido, que seria o caso do Presidente Kabila recandidatar-se. Ele foi suficientemente inteligente para não afrontar a Constituição, não afrontar a lei, não afrontar o povo congolês e nós só temos de aplaudir.

Guilherme Correia da Silva (Berlim) | Deutsche Welle

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