Pedro Lains | Diário de Notícias
| opinião
O populismo de direita está em
ascensão, na Europa, na Ásia e nas Américas, podendo agora vencer a presidência
do Brasil. Como se explica esta tendência preocupante? A resposta pode estar na
procura de padrões comuns, exercício que infelizmente ganha profundidade com o
crescente número de países envolvidos. A conclusão é que os pontos comuns não
se encontram na aversão à globalização, à imigração ou à corrupção política, mas
sim numa nova era de campanhas eleitorais que os políticos democráticos não
estão a conseguir acompanhar, ao contrário de interesses políticos e económicos
de tendências não democráticas. A solução não é fácil, mas tudo é mais difícil
se não forem identificadas as verdadeiras fontes. É isso que devemos procurar
fazer.
Nesta paradoxal era de expansão
da democracia, as forças populistas de direita têm conseguido poder pelo voto,
através de campanhas bem organizadas. Não é a primeira vez que tal acontece na história
moderna, mas o número e a diversidade de países atingidos é inédito.
Perceber um fenómeno global como
este implica procurar causas comuns. As causas podem ser diferentes de caso
para caso, mas as mais fortes, as que dão a chave da resposta, serão sempre as
causas comuns ao maior número de casos, se não a todos os casos.
Na Europa, o populismo de direita
governa a Polónia, a Hungria e a Itália, e ameaça a Alemanha e a França. No
Reino Unido, o brexit é também filho dessa vaga. A leitura destes
casos levaria a concluir que as origens do populismo estão no impacto da
globalização e no medo da imigração. Essa mesma conclusão seria confirmada pela
vitória de Trump nos Estados Unidos. Todavia, temos de ter em atenção o facto
de a Polónia ou a Alemanha serem países que globalmente ganharam com a
globalização, dada a capacidade exportadora. Assim, desde já, sem sairmos da
Europa, ficamos reduzidos a uma só causa comum, a imigração.
Todavia, ao viajarmos para a
Ásia, com o caso das Filipinas, ou para a América do Sul, com o Brasil,
claramente a imigração sai da lista das causas comuns, assim como, digamo-lo
enfaticamente, a globalização. Na verdade, o Brasil tem menos de 0,5% de
imigrantes residentes, e é das economias que mais têm ganho com a expansão
global, sobretudo através de uma impressionante resposta das exportações agrícolas.
A corrupção, outra causa muitas
vezes invocada, também não passa o teste de entrada na lista das causas comuns,
uma vez que o conjunto de países ameaçados pelo populismo de direita inclui a
Alemanha, o Reino Unido e a França, onde a corrupção, em termos absolutos, tem
expressão mínima. A insatisfação com os partidos do "sistema" não é
uma causa, é um sintoma e a acusação aos movimentos alternativos, ao chamado
"politicamente correcto", nem sequer merece ser mencionada.
Se o fenómeno é global ou
aceitamos que não pode ser cabalmente explicado, ou que as causas também têm de
ser globais. Restam assim duas.
Na falta de poder militar, a
Rússia de Putin tem procurado influenciar a política mundial através de
campanhas nas redes sociais, em particular no Facebook, como aconteceu nos
Estados Unidos e em outras partes. Forças políticas internas usam estratégia semelhante,
contratando empresas como a Cambridge Analytica, cuja actuação foi detectada nas
campanhas de Trump e do brexit, e na Índia, no Bangladesh e no Sri Lanka. Problema semelhante
se coloca no Brasil, através do WhatsApp. As campanhas populistas de
direita são também largamente apoiadas por televisões e jornais, como a Fox
News, com Trump, a Sky News e um número considerável de tablóides, com o brexit,
ou a Record, com Bolsonaro.
A causa comum global da ascensão
do populismo de direita deve ser procurada nas campanhas eleitorais
orquestradas e sem escrúpulos. São campanhas que navegam sobre ondas de
insatisfação, mas são elas, as campanhas, que definem o modo de contestação. O
populismo não passa de uma arma política nas mãos de agentes que não hesitam em
utilizá-lo. É isso que marca a diferença e é para isso que devemos encontrar
soluções.
A insatisfação popular sempre
existiu, sempre existirá e é saudável. O que é novo é o sucesso com que a
insatisfação é usada em campanhas sem escrúpulos por agentes não democráticos. O futuro da força da democracia depende da atenção que for dada
às novas formas de fazer campanhas. O resto pode ser mera distracção.
*Economista. Escreve
quinzenalmente e de acordo com a antiga ortografia
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