Dentro da RENAMO, há quem
questione o nível de preparação do próprio partido nas eleições de 10 de
outubro. António Chichone, membro do partido na diáspora, diz que faltou mais
organização para evitar a fraude.
António Chicone, membro do maior
partido da oposição moçambicana na diáspora, a residir em Portugal, considera
que a RENAMO deveria, por exemplo, ter apresentado os seus resultados paralelos
da contagem dos votos imediatamente, como forma de travar a fraude eleitoral
nas eleições de 10 de outubro.
Em entrevista à DW África, o
membro da RENAMO entende que há conformismo em relação aos alegados ilícitos
eleitorais.
DW África: Como avalia o processo
de votação em Moçambique?
António Chichone (AC): Várias
críticas. É preciso frisar que tudo começou no ato da votação. Ocorreram vários
ilícitos que foram sendo denunciados por populares, membros e fiscais dos
partidos. O processo em si, no geral, foi uma fraude de um descaramento total.
É importante também realçar que isto poderia ter sido evitado, na minha óptica,
se a denúncia fosse feita consoante a apresentação de elementos por parte dos
fiscais. As pessoas iam denunciando que estavam a circular camiões, editais,
que havia movimentação de pessoas de um lado para o outro com a intenção de
votar e a própria CNE e o STAE são cúmplices desse processo todo. Falhou, num
geral, mais pressão, mais fiscalização séria e cerrada deste processo todo.
DW África: Como membro da RENAMO,
acha que o seu partido estava devidamente preparado para este processo? Não
falhou em nada?
AC: O partido, segundo as
informações que tenho, prepara-se como os outros partidos neste processo. Creio
que toda a preparação tem de ser cuidada. Agora, até que nível o partido se
preparou nesse aspecto? Deixo aqui as minhas dúvidas. Podia ser uma preparação
mais séria. Note-se, por exemplo, a contagem paralela: na minha opinião, deviam
ser logo apresentados os resultados paralelos, caso houvesse dúvidas. A CNE,
até aqui, apresentou os seus resultados adulterados e ainda não há uma resposta
em termos do que é o resultado verdadeiro. Quando falo de preparação, é neste
sentido. A RENAMO devia ter um resultado muito bom se estivesse muito preparada
em termos de organização. Faltou uma organização a 100% para que a questão da
fraude não fosse efetivada.
As coisas estão a andar
naturalmente e há um conformismo nesse sentido: 'está feito, está feito, deixa
estar assim'. A população que defendeu a RENAMO, votou na RENAMO, que andou em
massa a fazer campanha durante os quinze dias, sem transportes, sem meios, fica
sem resposta. Não estou a dizer que devia ser uma resposta em termos de
violência, mas convocar a comunidade internacional, apresentar evidências, no
sentido de dizer que houve violações e editais adulterados.
DW África: Fez referência ao
eleitorado da RENAMO. Há relatos de que alguns destes eleitores atacaram alguns
cabeças de lista na província de Cabo Delgado na sequência de resultados que
indicam a derrota da RENAMO em alguns municípios. Como vê essa reação?
AC: É indignação frustrada,
porque votaram na RENAMO e percebem que o partido, efetivamente, ganhou. Muitos
estão a entender aquela lógica do presidente [Afonso] Dhlakama, quando dizia 'a
RENAMO está sendo roubada', as pessoas agora estão a entender. O povo, sentindo
isso, reagiu – porque são eleições locais. Agiram violentamente, mas não porque
a RENAMO determinou.
DW África: As organizações da
sociedade civil e indivíduos é que têm reportado a maior parte dos ilícitos
eleitorais. Dos observadores internacionais que estiveram no país, há pareceres
positivos, como é o caso da CPLP, por exemplo. Como é que vê o trabalho dos
observadores?
AC: Apesar do Acordo Geral
de Paz ter como uma das exigências as eleições livres, justas e transparentes,
não há, neste momento, quem possa dizer ‘sim, as eleições em Moçambique foram
livres'. Há aquilo a que chamamos de interesses económicos da comunidade
internacional que, muitas vezes, validam as eleições. Isto não poderia
acontecer. Com uma pequena suspeita nos Estados Unidos ou na Europa, as
eleições seriam anuladas. Acho que deve haver uma recontagem dos votos quando
há suspeita.
DW África: Comparando com os
anteriores processos eleitorais, acha que a RENAMO evoluiu em termos de
fiscalização, agilidade e empenho no processo de votação?
AC: Sem sombra de dúvida, há
uma evolução muito importante. Isto mostra que há um crescimento. Se a RENAMO
não tivesse uma organização a esse respeito, as eleições autárquicas seriam uma
catástrofe. Mas há que evoluir ainda mais. Os partidos devem fazer uma formação
contínua, não apenas esperar pelos momentos eleitorais e, na véspera, fazer
formação de fiscais. Com dados concretos, para que a comunidade internacional
seja posta em causa nas suas análises. Até agora, isto não está a acontecer.
Por isso, depois de fazerem a sua observação, os observadores dão pareceres que
não são justos.
Nádia Issufo | Deutsche Welle
Sem comentários:
Enviar um comentário