João Gonçalves* | Jornal de Notícias
| opinião
Em Maio do ano passado, Álvaro
Santos Pereira, director do Departamento de Estudos da OCDE e ex-ministro da
Economia e do Emprego do XIX Governo Constitucional, escrevia no Twitter que
tinham sido "políticas erradas, a corrupção e o compadrio entre a política
e os privados que nos levaram à bancarrota" de 2011. Em Julho,
acrescentava: "já passaram quatro anos desde que se desvendou a maior
fraude financeira da nossa História. Quem foi preso? Quem foi responsabilizado?
Também já passaram mais de sete anos após o país (e grande parte dos nossos
bancos) ter ido à bancarrota. Quem foi preso? Quem foi responsabilizado?"
Boas perguntas. Santos Pereira e o seu departamento escolheram as exportações e
a relação entre a justiça e a actividade económica como temas para o seu
relatório deste ano acerca da economia portuguesa. Quanto a este último item, o
destaque vai para a reforma do sistema de justiça e o combate à corrupção.
Segundo o semanário "Expresso", o Governo já terá conhecimento do
"draft" do relatório e não apreciou o exercício.
"Pressiona", escreveu aquele jornal, para que o "tópico
corrupção" caia. Porquê? Santos Silva, o MNE, receia um relatório de
"ideias feitas, percepções e estereótipos" que levaria o Executivo a
protestar formalmente. De que é que, afinal, o Governo tem medo? De alguma
"mancha" menos "própria" no longo manto eleitoral que se
avizinha e que requer folguedo e boas notícias? Esta mania nacional de rasurar
ou de passar uma borracha cínica por cima dos problemas não leva a lado algum.
Portugal, como um todo, seguramente não é mais nem menos corrupto que outros
países. Mas evitar falar da corrupção, deixando-a descansada num limbo
profundamente assassino para a confiança na justiça, prejudica a sociedade e a
economia portuguesas. A corrupção tem várias maneiras de se apresentar e nem
sempre tem a ver com dinheiro. Há a moral, a da "facilidade", a da
"palavrinha", a pequenina por baixo da mesa ou a do mero "passar
à frente", a que se esconde em relatórios oficiais "redondos" ou
de "chapa" que ninguém leva a sério, etc., etc. A corrupção é uma
chaga social e cultural que tanto atinge o Estado como a chamada
"sociedade civil", ou cada um de nós individualmente e na nossa
relação com os outros. Nas palavras de Agustina, "nós vivemos cada vez
mais nessa espécie de permissão da corrupção. Hoje, já não há praticamente
barreiras entre um comportamento ou outro". Ou seja, é quase tudo
"natural" onde não devia ser.
O autor escreve segundo a antiga
ortografia
*Jurista
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