sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Banco Nacional de Angola está a "arrumar a casa"


Só este ano, já foram encerrados três bancos em Angola. Em entrevista à DW, economista aplaude decisões e diz que devia haver ainda mais bancos a fechar. Assegura ainda que os angolanos não precisam de ficar preocupados.

Fechou mais um banco em Angola - o terceiro este ano. O Banco Nacional de Angola (BNA) revogou a licença do Banco Angolano de Negócios e Comércio (BANC) - cujo principal acionista é o general Kundi Paihama, antigo ministro da Defesa e ex-governador do Cunene - por estar em "falência técnica". O BNA já prometeu aos clientes que os "depósitos estarão garantidos" e "serão devolvidos aos clientes assim que a Procuradoria-Geral da República emitir um acórdão em que dará ao próprio BNA a comissão liquidatária".

Antes, foram o Banco Mais e o Banco Postal que viram a licença revogada, por "insuficiência de capital social". Segundo a imprensa angolana, Eduane Danilo dos Santos, filho do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, é sócio do Banco Postal. José Filomeno dos Santos, outro dos filhos do ex-Presidente, é apontado como tendo interesses no Banco Mais.

Em entrevista à DW África, o economista angolano Francisco Miguel Paulo defende que deviam ser encerrados ainda mais bancos, a começar pelo Banco de Poupança e Crédito (BPC). O BNA está a "arrumar a casa" e os angolanos não precisam de ficar preocupados, diz o economista.

DW África: Há motivos para preocupação com o encerramento de três bancos só este ano?
Francisco Miguel Paulo (FMP): Não há razões para estarmos preocupados porque não afeta a estabilidade do sistema financeiro. São bancos pequenos, que não fazem parte dos 10 ou 5 maiores. E o próprio BNA, ao deixar cair esses bancos, sabe o impacto que terá. Quando um Banco Central deixa cair um banco comercial, é porque é necessário, porque o Banco Central é quem zela pela estabilidade do sistema financeiro.

DW África: O que é que se passa na banca angolana para tantos bancos estarem a fechar?

FMP: Acho que o problema foi aquando da constituição destes bancos. O Banco Central exigiu, desde o ano passado, que todos os bancos comerciais aumentassem o seu capital social, que passasse dos 3,5 mil milhões de kwanzas para 7 mil milhões de kwanzas, quase o dobro. Os dois primeiros bancos [Banco Mais e Banco Postal] aos quais o Banco Central retirou a licença não conseguiram cumprir o requisito de aumentar o capital social. No caso do BANC, o que aconteceu é que, desde julho do ano passado, o banco estava a ser administrado por administradores propostos pelo BNA.

O Banco Central teve de criar uma administração para poder gerir o banco, porque o banco não tinha bons indicadores financeiros. Indiretamente, o Banco Central estava a tentar organizar o banco, por seis ou sete meses, mas parece que, segundo o parecer do próprio BNA, a situação era tão má que nesses seis meses não houve alterações significativas e, por isso, o Banco Central decidiu retirar a licença. E os acionistas não têm disponibilidade financeira para recapitalizarem o banco.

DW África: O BANC tem como principal acionista Kundi Paihama, ex-ministro da Defesa. Esta decisão do Banco Central é meramente técnica? Tem a ver com o estado do banco? Ou pode também ser interpretada como política?

FMP: Eu vejo o Banco Central como uma instituição técnica. Os argumentos apresentados sãoargumentos técnicos. No caso do BANC, o BNA disse que retirou a licença pelo facto de o banco estar numa situação de falência técnica. Ou seja, os seus fundos próprios não são suficientes para cobrir o passivo. Tecnicamente, em termos contabilísticos, o banco não tem capacidade para funcionar porque os acionistas não têm dinheiro para injetar no banco.

DW África: Há mais bancos na calha que se poderão seguir?

FMP: O último pronunciamento do governador do BNA dizia que poderia haver. Acho que o Banco Central devia também apertar o BPC. O Banco de Poupança e Crédito não está em boas condições técnicas. Este mês, vão ser emitidas mais obrigações a favor do BPC, que é o banco comercial no país com a maior percentagem de crédito malparado. Cerca de 80% do crédito malparado do sistema bancário está no BPC. Vamos ver qual será a decisão que o Banco Central vai tomar em relação ao BPC, porque não está em boas condições.

DW África: Até agora, estas são boas decisões do Banco Central? Têm sido corretas?

FMP: O Banco Central tem a responsabilidade de zelar pela estabilidade do sistema financeiro. Se está a tomar essas decisões, acredito que sejam decisões necessárias para poder manter o sistema financeiro sólido e estável. Porque não vale a pena termos bancos que não funcionam bem, que poderão provocar o chamado efeito contágio noutros bancos.

DW África: É uma maneira de solucionar, de alguma forma, erros cometidos no passado?
FMP: Claro. E agora terão de cumprir com o seu papel e não deixar passar erros graves que ponham em risco a estabilidade do sistema financeiro.

Guilherme Correia da Silva | Deutsche Welle

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