Relatório
sobre investimentos privados realizados com recurso a "avultados fundos
públicos" dá conta da perda de 4.100 milhões de euros.
A
cidade do Lobito, na província de Benguela, acolheu esta quinta-feira (14.03.)
a cerimónia de abertura do novo ano judicial em Angola, ato que contou com
a presença do Presidente angolano, que efetuou paralelamente uma curta
visita de trabalho à região.
Além
de participar na cerimónia, que teve como lema "Pela Independência do
Poder Judicial e a Autonomia Administrativa, Financeira e Patrimonial dos
Tribunais", João Lourenço inaugurou, também no Lobito, o Tribunal de
Comarca da mesma cidade, que se tornará o primeiro do género no país.
João
Lourenço, considerou "no mínimo, chocante e repugnante" o
relatório sobre os investimentos
privados realizados com recurso a "avultados fundos
públicos", que dá conta da perda de 4.700 milhões de dólares (4.100
milhões de euros)
Reaver
o que pertence aos angolanos
No
seu discurso o chefe de Estado angolano, referiu que, após os seis meses de
graça que a lei conferiu aos visados, até 26 de dezembro de 2018, no quadro
do Repatriamento
Coercivo de Capitais, o Estado "está no direito de utilizar todos os
meios ao seu alcance para reaver ao que ao povo angolano pertence".
A
Lei de Repatriamento de capitais foi aprovada a 26 de junho de 2018 com o
objetivo de devolver a Angola os montantes investidos no exterior do país,
ilegalmente colocados em paraísos fiscais e outras praças financeiras, prazo
que terminou a 26 de dezembro do mesmo ano e cujo total já eventualmente
retornado ainda está por revelar.
"Passados
que são três meses [desde o final do prazo, tendo entrado em vigor a Lei de
Repatriamento Coercivo de Capitais]], estamos empenhados a trabalhar nesta
direção, com o concurso dos cidadãos que denunciam, dos competentes serviços de
investigação, do Ministério Público e dos tribunais, que intervirão
quando chegar o momento", referiu João Lourenço.
Estado
angolano lesado
Na
quarta-feira (13.03.), no comunicado final do Conselho de Ministros
Extraordinário, é indicado num só parágrafo que o Estado angolano foi lesado em
mais de 4.700 milhões de dólares (4.100 milhões de euros) em investimentos
privados feitos com fundos públicos.
Segundo
o documento, que não avança quaisquer pormenores sobre nomes dos investidores,
o montante foi apurado por uma Comissão Multissetorial criada pelo Presidente
angolano, João Lourenço, em dezembro de 2018, com o objetivo de identificar os
investimentos feitos com fundos públicos antes de chegar ao poder, em setembro
de 2017.
Esta
quinta-feira, João Lourenço foi mais longe e indicou que o grupo de trabalho
que tinha como responsabilidade proceder ao levantamento com toda a informação
dos investimentos realizados com recursos a avultados fundos públicos
identificou tratarem-se de "alguns dos grandes grupos empresariais
privados" da praça angolana.
"No
essencial, o trabalho está concluído e em posse do executivo, sendo o conteúdo
do relatório, permitam-me dizê-lo, no mínimo chocante e repugnante",
frisou.
Segundo
o Presidente angolano, o Estado terá perdido perto de cinco mil milhões de
dólares, "que beneficiava
uma elite muito restrita".
"Estamos,
assim, em condições de, nos próximos dias, acionarmos os mecanismos para o
Estado reaver o património e os ativos que lhe pertencem a abrigo da Lei 15/18
de 26 de dezembro sobre o Repatriamento Coercivo, apenas na sua componente
interna da perda alargada de bens", referiu.
Justiça
cada vez mais célere
Na
sua intervenção, João Lourenço apontou a necessidade uma justiça "cada vez
mais célere, mais acessível à esmagadora maioria dos cidadãos, mais capacitada
para responder aos grandes desafios do combate ao crime no geral, de combate à
corrupção e à impunidade", contribuindo para a moralização de toda a
sociedade e tornar o mercado nacional mais competitivo e seguro para a atração
do investimento privado nacional e estrangeiro.
Em
2018, na cerimónia de abertura do novo ano judicial realizada em Luanda, o
Presidente de Angola destacou no discurso então proferido que um dos objetivos
da governação é dotar o sistema de justiça de maior capacidade, em termos
materiais e de recursos humanos, indicando que serão criados 60 novos tribunais
de comarca e cinco da relação.
Segundo
a lei orgânica sobre a organização e funcionamento dos tribunais de jurisdição
comum, que entrou em vigor a 02 de fevereiro de 2015, serão criados, numa fase
inicial e experimental, os tribunais (primeira instância) das províncias de
Luanda, Bengo, Cuanza Norte, Benguela e Huíla.
Da
mesma forma, serão implementados os tribunais de relação (primeiro recurso) de
Luanda e de Benguela, inicialmente com uma área de intervenção geográfica mais
alargada.
Adaptar
administração da Justiça à Constituição
A
nova legislação surge, lê-se no preâmbulo da Assembleia Nacional, porque
"urge conformar a administração da Justiça angolana à Constituição da
República de Angola".
Os
tribunais de Comarca podem compreender o território de "um ou de vários
municípios da mesma província judicial", tendo jurisdição na respetiva
área e que pode ser desdobrada em salas de competência especializada ou de
pequenas causas e criminais, designando-se pelo nome do município sede.
"A
instalação dos tribunais de relação e dos tribunais de comarca em todas as
províncias é precedida de um período experimental e obedece a um gradualismo
que é estabelecido em função das condições humanas, materiais e técnicas
existentes", prevê igualmente a legislação já em vigor, cuja proposta foi
elaborada pela Comissão de Reforma da Justiça e do Direito (CRJD).
Tribunal
Provincial de Luanda
Na
prática, os 18 tribunais provinciais atuais, que julgam sobre todas as
matérias, vão dar lugar - tal como os municipais - a 60 tribunais de comarca de
competência genérica, de primeira instância.
A
título de exemplo, na capital angolana deixará de existir o Tribunal Provincial
de Luanda, passando a funcionar quatro de comarca, em Luanda, Cacuaco, Viana e
Belas.
A
lei implica a criação de cinco regiões judiciais, com um tribunal de relação
próprio, abrangendo as províncias judiciais de Luanda (sede), Bengo e Cuanza
Norte (Região I); Uíge (sede), Malanje, Zaire e Cabinda; (Região II); Benguela
(sede), Bié, Cuanza Sul e Huambo (Região III); Huíla (Sede), Cuando Cubango,
Cunene e Namibe (Região IV); e Lunda Sul (sede), Lunda Norte e Moxico (Região
V).
Mantêm-se
as províncias judiciais, que correspondem à divisão político-administrativa do
país e o Tribunal Supremo como última instância de recurso da jurisdição comum.
A
reorganização prevê igualmente a independência financeira dos tribunais, o que obrigará
à criação de unidades de gestão para cada uma das 18 províncias.
Agência
Lusa, ar | em Deutsche
Welle / 14.03.2019
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