Rui Sá | Jornal de Notícias |
opinião
Se há coisa que detesto e que, na
minha opinião, é o fator que mais contribui para a descredibilização da nobre
atividade política é a incoerência, ou seja, a defesa, hoje, de uma posição
sobre um determinado assunto para, amanhã, defender o seu contrário.
Mário Soares, com o seu
proverbial à-vontade procurava safar-se das suas constantes contradições (não
creio que fosse, sequer, para aplacar a sua consciência...) com a frase
"só os burros não mudam de opinião". Mas, sendo legítima essa mudança
de opinião (embora poucos sejam os que o assumem), a maior parte das
incoerências resultam do hábito e da naturalidade com que muitos agentes
políticos mentem.
A propósito de alguns episódios
que se passaram esta semana, são inúmeros os casos que me vieram à cabeça.
Foi assim que vimos mais um
reaparecimento de Cavaco (confesso que eu próprio fico preocupado porque o meu
sentimento sobre ele está a passar para o dó...) a dizer que fez uma das suas
investigações sobre os três governos que dirigiu e não viu relações familiares
nos mesmos. Azar do homem, que raramente se engana (e, pelos vistos, não sabe
investigar): logo vieram a lume as inúmeras relações familiares que enxameavam
os seus gabinetes ministeriais, com as esposas de ministros e secretários de
estado a chefiarem os gabinetes (uns dos outros). E Marques Mendes, que agora
se arvora em "grilo falante" do regime, esqueceu os seus próprios
telhados de vidro, dado que a sua esposa também por lá passou quando ele era
secretário de Estado.
Rio também saiu à liça, esquecendo
que, como presidente da Câmara do Porto, nomeou a irmã do seu vice-presidente
para a gestão do Rivoli (e, face à polémica, passou-a a adjunta de um dos seus
vereadores)... Mas, agora, consideram um problema ético as nomeações de
familiares para os gabinetes ministeriais. Assunção Cristas, cada vez mais
parecida com Paulo Portas (o rei das incoerências irrevogáveis), distinguiu-se,
neste campeonato, por, enquanto candidata autárquica em Lisboa, bramar contra
os despejos - que, no entanto, tinham origem numa lei que ela própria tinha
elaborado e aprovado enquanto ministra! Não satisfeita com a vergonha, veio,
agora, levantar a voz contra a situação inadmissível de o Governo não ter um
plano B para a seca! Logo vieram a público as suas declarações, quando era
ministra da Agricultura, e que, enquanto tal, perante a seca, afirmava o seu
plano B anunciando "que só lhe restava rezar para que chovesse"...
Talvez estes políticos devam
fazer como os seus amigos gestores e banqueiros que têm passado pelas comissões
de inquérito da Assembleia da República: aleguem problemas de memória e...
calem-se, poupando-se(nos) à vergonha das vossas incoerências.
*Engenheiro
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