segunda-feira, 8 de abril de 2019

Portugal | Mentirosos


Rui Sá | Jornal de Notícias | opinião

Se há coisa que detesto e que, na minha opinião, é o fator que mais contribui para a descredibilização da nobre atividade política é a incoerência, ou seja, a defesa, hoje, de uma posição sobre um determinado assunto para, amanhã, defender o seu contrário.

Mário Soares, com o seu proverbial à-vontade procurava safar-se das suas constantes contradições (não creio que fosse, sequer, para aplacar a sua consciência...) com a frase "só os burros não mudam de opinião". Mas, sendo legítima essa mudança de opinião (embora poucos sejam os que o assumem), a maior parte das incoerências resultam do hábito e da naturalidade com que muitos agentes políticos mentem.

A propósito de alguns episódios que se passaram esta semana, são inúmeros os casos que me vieram à cabeça.


Foi assim que vimos mais um reaparecimento de Cavaco (confesso que eu próprio fico preocupado porque o meu sentimento sobre ele está a passar para o dó...) a dizer que fez uma das suas investigações sobre os três governos que dirigiu e não viu relações familiares nos mesmos. Azar do homem, que raramente se engana (e, pelos vistos, não sabe investigar): logo vieram a lume as inúmeras relações familiares que enxameavam os seus gabinetes ministeriais, com as esposas de ministros e secretários de estado a chefiarem os gabinetes (uns dos outros). E Marques Mendes, que agora se arvora em "grilo falante" do regime, esqueceu os seus próprios telhados de vidro, dado que a sua esposa também por lá passou quando ele era secretário de Estado.

Rio também saiu à liça, esquecendo que, como presidente da Câmara do Porto, nomeou a irmã do seu vice-presidente para a gestão do Rivoli (e, face à polémica, passou-a a adjunta de um dos seus vereadores)... Mas, agora, consideram um problema ético as nomeações de familiares para os gabinetes ministeriais. Assunção Cristas, cada vez mais parecida com Paulo Portas (o rei das incoerências irrevogáveis), distinguiu-se, neste campeonato, por, enquanto candidata autárquica em Lisboa, bramar contra os despejos - que, no entanto, tinham origem numa lei que ela própria tinha elaborado e aprovado enquanto ministra! Não satisfeita com a vergonha, veio, agora, levantar a voz contra a situação inadmissível de o Governo não ter um plano B para a seca! Logo vieram a público as suas declarações, quando era ministra da Agricultura, e que, enquanto tal, perante a seca, afirmava o seu plano B anunciando "que só lhe restava rezar para que chovesse"...

Talvez estes políticos devam fazer como os seus amigos gestores e banqueiros que têm passado pelas comissões de inquérito da Assembleia da República: aleguem problemas de memória e... calem-se, poupando-se(nos) à vergonha das vossas incoerências.

*Engenheiro

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