segunda-feira, 15 de abril de 2019

Portugal | A trabalhar com os pés para a cova


Rui Sá | Jornal de Notícias | opinião

Foi esta semana notícia a apresentação de um estudo, encomendado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos a um grupo de investigadores do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, que defende o aumento, já em 2025, da idade de reforma para os 69 anos. São cíclicos os estudos que apontam para a "inevitável falência" do sistema público de Segurança Social. Que se baseiam em dois factos facilmente compreensíveis: por um lado, o aumento da esperança de vida média dos portugueses (o que faz com que aufiram mais anos da reforma) e, por outro lado, com a diminuição da natalidade, o que fará com que haja menos população ativa e, consequentemente, menos pessoas a descontar para a Segurança Social.

Mas se estes dois factos são irrefutáveis é evidente que as soluções propostas para a resolução do "problema" são distintas. Pelo que li noticiado na Comunicação Social (não tive acesso ao estudo propriamente dito), as "soluções" vão todas no mesmo sentido: penalizar os assalariados, obrigando-os a trabalhar mais anos, a descontar mais e a receber menos de reforma! Presumo que estas soluções serão do agrado do Grupo Jerónimo Martins (promotor da Fundação) que, é bom recordá-lo, deslocalizou a sede fiscal para a Holanda (para pagar menos IRC) e cujo presidente-executivo foi também notícia recente - ganha 120 vezes mais do que a média dos seus trabalhadores!...



Mas pondo de lado esta coincidência, aborrece-me que, ciclicamente, avancem com esta visão catastrofista sobre o futuro do sistema público de Segurança Social, lançando o pânico naqueles que, atualmente, trabalham e descontam para a Segurança Social, levando-os a desvalorizar este efetivo direito social conquistado com o 25 de Abril.

Mas quais são as alternativas, então? Em primeiro lugar, e como tem sido provado nestes três últimos anos (em que a Segurança Social teve o maior saldo positivo das últimas três décadas), a diminuição do desemprego e o aumento dos salários têm um impacto muito positivo no sistema (mais gente a contribuir e a contribuir mais). Por outro lado, torna-se necessário diversificar as receitas da Segurança Social: e, para além de medidas já tomadas, é fundamental que a riqueza gerada em empresas sem (ou com pouca) mão de obra sejam chamadas a contribuir solidariamente com um sistema que é um dos esteios do Estado Social.

Não se pode é apostar em baixos salários, na desregulação dos horários, na precariedade, no convite à emigração, na falta de resposta da rede pública de apoio à infância e, depois, gritar "aqui-d"el-rei" que não nascem bebés e que não há dinheiro para a Segurança Social, defendendo a penalização daqueles que, na sua vida de trabalho, já tanto contribuíram para o sistema.

* Engenheiro

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