Miguel Guedes | Jornal de Notícia
| opinião
O episódio folclórico da
passadeira arco-íris na Avenida Almirante Reis, em Lisboa, é sintomático. O que
os representantes do CDS de Arroios conseguiram fazer aprovar por unanimidade
na Assembleia de Freguesia foi unanimemente destruído por esta nova versão
espanholada "à lá VOX" do CDS.
Para homenagear a comunidade
LGBTI no dia 17 de Maio (foi este o dia, em 1990, que a Organização Mundial de
Saúde retirou a homossexualidade da Classificação Internacional de Doenças),
nada melhor então do que retirar os esqueletos do armário. A doença do
extremismo populista está à solta e o CDS procura arrumar-se à Direita,
deixando o conservadorismo na gaveta, para soltar o Nuno Melo que tem em si.
Cai assim por terra o pequeno percurso progressista de Assunção Cristas,
caminho tão mal-amado no partido que nem precisou de perder eleições internas
para perder terreno na liderança.
À medida que esbranquiça
passadeiras para todos, recusando o simbolismo folclórico de uma passadeira
colorida mas ilegal face às regras do trânsito interno do partido, os barões
assinalados do CDS juntam-se aos sectores VOX para reclamar aquilo a que têm
direito: o direito à convivência e à mudança de rumo. O partido que permite que
a "Tendência Esperança em Movimento" evolua internamente com um
líder, Abel Matos Santos, que defende que o 25 de Abril comemora "a
liberdade de abortar, de mudar de sexo de manhã e à tarde", saudoso do
tempo de Salazar em que "Portugal era um país a sério e governado por
gente a sério", psicólogo clínico que considera que os homossexuais
"têm mais doenças e sofrem mais", não pode queixar-se, um dia que não
virá longínquo, de que a tendência vire poder ou cresça o suficiente para
cindir com o partido para se autonomizar. Criar um monstro. Foi assim que o VOX
espanhol surgiu, pela mão das pessoas às quais o PP espanhol deu guarida em
nome da "velha" Espanha de cinzas. Nuno Melo, ao recusar o rótulo de
extrema-direita ao VOX, sabe bem no que o CDS se está a tornar ou está a
permitir criar. Estranho é que o CDS de Cristas vá atrás.
Como uma VOX colorida entre as
mãos de uma criança, este CDS lava mais branco. Quando o próprio PP espanhol
acusa o VOX de extremismo à Direita, é quase cândido ver como Nuno Melo defende
a família, secundado por todo o partido (mesmo as correntes mais liberais do
CDS...), ao não considerar de extrema-direita um partido racista e xenófobo,
ultranacionalista, que pretende acabar com a lei de violência de género,
liberalizar o porte e uso de armas, implodir as autonomias, perseguir
imigrantes, construir muros "intransponíveis", ilegalizar partidos e
organizações independentistas e fazer tábua rasa da Constituição espanhola.
Este é o "novo" CDS, o carro-vassoura da democracia-cristã que deixa
os "bastas e chegas" partirem primeiro para varrer o caminho.
*Músico e jurista
O autor escreve segundo a antiga
ortografia
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