terça-feira, 9 de julho de 2019

Caso Manuel Chang: A faca e o queijo agora na mão da sociedade civil moçambicana?


O poder sobre a reversão da extradição de Manuel Chang para Moçambique está neste momento nas mãos da sociedade civil moçambicana. Entretanto, esta diz que ainda não tomou uma decisão, mas já pensa na possibilidade.

Embora o Ministério da Justiça da África do Sul tenha decidido pela extradição de ex-ministro das Finanças de Moçambique para o seu país, e não para os EUA, não significa que seja uma posição irreversível, recursos de vária ordem podem ainda ser apresentados.

E uma ação da sociedade civil moçambicana no momento é provavelmente o passo determinante para reverter a decisão. É que segundo a legislação da África do Sul, a sociedade civil moçambicana pode pedir que o Ministério da Justiça sul-africano reveja a sua decisão.

Andre Thomashausen é especialista em direito internacional confirma que "é de facto verdade, qualquer parte que possa demonstrar interesse no assunto pode pedir essa revisão judicial, semelhante ao processo de revisão administrativa no direito português ou moçambicano. E agora, se uma organização da sociedade civil resolver fazer o pedido terá de ser aceite pelo tribunal e este terá, ou o Ministério da Justiça da África do Sul, tal como a outra parte, terá de ver se irá se opôr ao pedido ou não."

Mas lembra: "E claro, terá de haver bons motivos ou justificação para mostrar que a decisão administrativa tomada pelo antigo ministro da Justiça foi com base em factos errados, não comprovados ou de forma viciada."

E a sociedade civil já se mexe?

Até agora o CIP, Centro de Integridade Pública, uma ONG moçambicana que luta por transparência, é a única a monitorar de perto o processo judicial e também a fazê-lo de forma destacada.

Inclusive ofereceu-se para ser amigo do tribunal, que é quando uma instituição fornece subsídios às decisões dos tribunais, oferecendo-lhes melhor base para questões relevantes, oferta entretanto recusada pela justiça sul-africana.

Mas quando questionada pela DW África sobre uma possível revisão, o CIP remeteu-nos ao Fórum de Monitoria do Orçamento (FOM), plataforma de que faz parte.

Paula Monjane, respondeu em nome do FMO: "Não temos ainda discutida essa perspetiva, mas pode ser que aconteça. Achamos que a volta de Manuel Chang para Moçambique não seria do interesse do povo moçambicano."

Contudo está claro para o Fórum o seu poder de impugnar a extradição de Manuel Chang para Moçambique. Mas uma discussão entre os 21 membros nesse sentido seria o próximo passo. Entretanto, no final a faca e o queijo continuariam nas mãos do ministro da Justiça da África do Sul.

O peso da política interna sul-africana no caso

E a política interna sul-africana pode ser determinante na decisão, o especialista em direito internacional lembra que as relações entre a África do Sul e os EUA não estão no seu melhor momento, com críticas frequentes do Presidente Cyril Ramaphosa à Washington.

Será que Ronald Lamola, que assumiu o cargo recentemente, poderia tomar a mesma decisão que o seu antecessor Michael Masutha?

Thomashausen deixa tudo em aberto: "Não se pode excluir, só que então terá de se fazer um esforço para se dar uma motivação que estaria correta e em linha do que está previsto no acordo de extradição e isso é possível, a argumentação pode ser diferente e a decisão continuar a ser a mesma."

Além disso "também é uma questão de oportunidade e já disse antes, a África do Sul não tem interesse e ser visto como um país que dá cobertura a grande corrupção", ressalta o especialista. 

Aproximação dos EUA à sociedade civil?

Já que o poder de reverter a extradição de Chang para Moçambique está nas mãos da sociedade civil moçambicana os EUA acredita-se estariam já a encetar contactos com ela. E uma ação da sociedade civil nesses  moldes seria cara, de acordo com o especialista em direito internacional.

Entretanto, os EUA estranhamente não apresentaram recurso à decisão do ministro a Justiça sul-africano, apesar da legislação sul-africana assim o prever. Terá este país preferido optar por uma pressão política? Thomashausen responde:

"É uma pergunta realmente chave neste processo, todos os observadores estão a estranhar o argumento da parte dos diplomatas americanos, que começou a circular, em como eles achavam que como não havia precedente na lei da África do Sul para uma tal decisão resolveram não arriscar uma derrota num processo judicial, mas é um argumento fácil porque a África do Sul tem muitos antecedentes", responde Thomashausen.

Nádia Issufo | Deutsche Welle

Sem comentários:

Mais lidas da semana