A crise política em Espanha
ensina-nos que o país vizinho nada aprendeu com a experiência portuguesa.
Pedro Tadeu | TSF | opinião
Os resultados eleitorais de abril
deram à esquerda política espanhola a possibilidade de formar uma solução
governativa semelhante à da geringonça portuguesa, ou seja, uma solução que
permitisse aos socialistas fazerem um governo com apoio parlamentar para as
questões principais do Unidas Podemos e de outras formações de esquerda.
Se tivesse havido uma geringonça
espanhola, provavelmente o maior problema que a Espanha enfrenta - a questão da
Catalunha - teria uma possibilidade de solução. E as eleições de ontem
teriam sido evitadas.
Mas o Unidas Podemos quis ter
ministros, não aceitou estar apenas no Parlamento, e o PSOE não abriu a
porta a uma possibilidade de entendimento mínimo.
Com os resultados de ontem à
noite, a esquerda, se quiser governar, terá agora de encontrar um entendimento
entre o PSOE, o Unidas Podemos, o MAS (uma cisão do Podemos), os
independentistas da Catalunha da ERC e um dos 12 pequenos partidos do novo
Parlamento.
É uma missão impossível, pois
arranjar nesta altura uma solução política com a ERC significaria admitir a
independência da Catalunha.
Como o PSOE fez toda a
campanha tentando demonstrar que era totalmente contra o independentismo catalão (tanto
quanto os partidos à direita, o Partido Popular e o VOX) entraria numa
contradição insanável, que mataria rapidamente um acordo desse tipo.
O timing em tática política é
quase tudo. Pedro Sánchez e Pablo Iglésias não aprenderam isso com António
Costa, Jerónimo de Sousa e Catarina Martins.
Provavelmente a única solução
política de curto prazo para a Espanha, que não implique novas eleições, será a
formação de um governo de "bloco central" entre PSOE e PP (isto
se aceitarmos que o Partido Popular é hoje um partido do centro e não de pura
direita, com traços autoritários), mas, como é óbvio, esse eventual acordo,
dada a competição e as diferenças programáticas entre os dois partidos, corre
o risco de se esboroar em três tempos, até pela desconfiança que há entre os
dirigentes dos dois partidos.
Se PSOE e PP se entenderem para
formar governo, então a questão catalã irá agravar-se ainda mais. A
tendência desse eventual governo não será a de negociar mas a de tentar esmagar
completamente, mesmo com recurso à violência, os protestos dos independentistas.
Acontece, porém, que os
resultados eleitorais de ontem mostram também que há um reforço na Catalunha do
voto pela independência.
Os partidos puramente
independentistas conquistam no Parlamento espanhol mais espaço e elegem na
província da Catalunha 30 lugares. Nesta província os que são totalmente contra
a independência elegem apenas 18 deputados para o Parlamento espanhol, sendo que
12 desses 18 lugares são do PSOE que, em tempos, admitia o reforço da autonomia
catalã.
Estes resultados parecem reforçar
a ideia de que os independentista catalães não vão parar a sua luta e que a
capacidade de obter um compromisso que impeça a independência total, mas
garanta a autonomia do território e o perdão aos condenados à prisão pela
declaração de independência de há dois anos seja praticamente impossível.
Espanha, à esquerda, não aprendeu
com a experiência portuguesa mas, já agora, talvez a esquerda portuguesa
pudesse aprender alguma coisa com a experiência espanhola.
Por exemplo, a volatilidade dos
novos partidos: o Podemos e o Ciudadanos, que tiveram nos últimos anos subidas
extraordinárias, têm quedas eleitorais graves (no caso do Ciudadanos é mesmo
uma hecatombe), o que demonstra que o êxito de novos partidos não é tão sólido,
não está tão enraizado no eleitorado como tantas vezes parece e que os partidos
tradicionais (veja-se a subida do PP) são, afinal, resilientes.
E o crescimento da
extrema-direita em Espanha, através do VOX, demonstra que quando os problemas
das populações não têm uma solução, quando se arrastam no pântano das não
decisões, das tricas palacianas, dos adiamentos, dos fingimentos, a tendência,
legítima, é as pessoas virarem-se para quem parece mais decidido e comprometido
em encontrar um final para essa história.
O VOX subiu eleitoralmente porque
é claro e promete decisão (mesmo que esteja errado) da questão catalã e de
muitas outras que preocupam os espanhóis.
Portugal devia, por esta via
indireta, aprender com a Espanha - se lá a questão a Catalunha ajuda o
extremismo à direita, aqui é a fragilidade do combate à corrupção política
e ao crime de colarinho branco que dá força ao autoritarismo que os saudosos do
fascismo empurram para a arena política.
O combate à corrupção é decisivo
para o futuro político de Portugal.
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