Macau, China, 19 abr 2020 (Lusa)
- Portugueses a residirem na China queixaram-se à Lusa de discriminação por
parte de chineses por medo da covid-19, uma realidade que afeta a comunidade
estrangeira e ignorada por Pequim, confirmou a organização não-governamental
Human Rights Watch (HRW).
"O Governo central tem o
dever de proteger toda a gente (...) Este racismo tem de ser parado",
afirmou hoje à agência Lusa o vice-diretor da HRW para a Ásia, acrescentando
que a organização não-governamental (ONG) tem recebido várias denúncias de
estrangeiros barrados em vários serviços e que estão a sofrer ataques xenófobos
nas ruas e nas redes sociais do país.
A China desde há várias semanas
que tem registado cada vez menos casos da doença e estes têm sido, na maioria
das vezes, provenientes do exterior, os chamados casos importados. Ao
contrário, o resto do mundo, sobretudo fora da Ásia, tem visto o número de
infetados a subir exponencialmente.
A desconfiança para com os
estrangeiros vem precisamente por essa razão, explicou Phil Robertson,
acrescentando que estes incidentes se agudizam porque nem o Governo central nem
as autoridades provinciais estão a agir para prevenir esses comportamentos.
Na província chinesa de
Guangdong, adjacente a Macau, dois portugueses, que pediram à Lusa para não
serem identificados, denunciaram vários incidentes discriminatórios de que têm
sido alvo.
Um dos portugueses disse ter sido
impedido de alugar espaços desportivos pela simples razão de ser estrangeiro.
Os dois queixam-se de vários comportamentos discriminatórios. Entre alguns
exemplos, contam que os chineses saem propositadamente do elevador quando eles
entram.
Apesar de os casos mais graves
não terem acontecido com eles, os dois contam vários relatos que têm recebido
de amigos próximos, como o impedimento de entrar na loja da multinacional
norte-americana Walmart na cidade vizinha de Macau, Zhuhai, ou de outros que
foram expulsos de um hotel.
Questionado hoje pela Lusa, o
cônsul português na cidade chinesa de Cantão afirmou ter conhecimento de casos
discriminatórios para com estrangeiros, mas garantiu que não lhe foi reportado
qualquer queixa de cidadãos portugueses.
"O consulado enviou um questionário
a todos os cidadãos que estão aqui registados a perguntar se têm tido
problemas", disse André Sobral Cordeiro. Dos 203 portugueses registados no
consulado, apenas 20 responderam e nenhum deles comunicou ter sofrido de
comportamentos discriminatórios.
"Têm acontecido, de facto,
algumas situações [discriminatórias para com estrangeiros], mas, em relação aos
cidadãos portugueses, eles têm que nos dizer", sublinhou, apelando para
que os portugueses lhe comuniquem essas situações de forma a que o consulado
possa responder e intervir. "Caso contrário, não temos como saber",
reforçou.
André Sobral Cordeiro explicou
ainda que estão a ser discutidos entre vários Estados "uma ação
comum" sobre a forma como vão agir, acrescentando que nessa altura a
comunidade será informada.
O grupo que tem sofrido mais
xenofobia é o africano. Fotografias e vídeos difundidos, na semana passada, em
redes sociais, mostravam jovens e famílias de africanos a dormirem na rua em
Cantão, no sul da China, após terem sido forçados a deixar casas e hotéis pelas
autoridades, e proibidos de entrarem em lojas e em restaurantes.
Como consequência, vários
governos africanos convocaram os embaixadores chineses nos respetivos países
para manifestar preocupação, ao mesmo tempo que os embaixadores africanos na
China escreveram uma carta conjunta ao ministro dos Negócios Estrangeiros
chinês, Wang Yi, e ao Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações
Unidas a denunciar a "discriminação e estigmatização" dos africanos
em Cantão.
"A xenofobia e o racismo não
têm lugar num país civilizado", afirmou o responsável da HRW.
Da mesma forma, quando a situação
da pandemia estava invertida (com mais casos na China do que no resto do
mundo), Pequim criticou atos xenófobos e discriminatórios para com os
asiáticos. "Não pode agora olhar para o lado", frisou Phil Robertson.
A nível global, a pandemia de
covid-19 já provocou mais de 157 mil mortos e infetou mais de 2,2 milhões de
pessoas em 193 países e territórios. Mais de 502 mil doentes foram considerados
curados.
A doença é transmitida por um
novo coronavírus detetado no final de dezembro, em Wuhan, uma cidade do centro
da China.
MIM (JPI) // JH
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