O Curto do Expresso neste inicio
de semana. Parece que a anterior foi a pior semana desde Abril, para o
jornalista do Expresso. Inclui PSP, contar de cabeças, bons e maus da farda.
Enfim, o costume de agora na balbúrdia destes primeiros dias dos restos das
nossas vidas. Curta este Curto do Expresso da arte de Germano Oliveira. Siga,
leia, pense pela sua própria cabeça. Use-a e não aquilo com que por vezes
muitos a confundem, de nome próximo mas que é uma cabaça, oca, carente de miolos, já se sabe. Pena
que haja por aí muitas mais que os infetados de covid-19 em todo o mundo. Bom
dia e uma torrada. Fiquem bem, apesar de tudo que é descalabro. (PG)
A pior semana desde abril (e será
que tudo aquilo que não nos consegue destruir acaba mesmo transformado em
alegria?)
Germano Oliveira | Expresso
A paranoia é a “designação dada a diversas
perturbações psíquicas, geralmente associadas a desconfianças patológicas e erros
de interpretação da realidade”, fui vítima desses erros: a polícia expulsou-me
gente de casa no fim de semana porque uma queixa anónima desinformada é capaz
de provocar danos em gente identificada bem formada, foi o meu caso, tive de
resolver com a ajuda de um polícia bom o problema que estava a acontecer com um
polícia mau - o bom tinha olhos azuis fortes, cabelo de revista e corpo de
modelo, acho que não queria cansar a beleza dele com desentendimentos
desnecessários - e acabei depois num restaurante em que um polícia apareceu
também, “podem estar aqui dentro até às 00h, lá fora podem beber nas mesas até
às 23h mas só se estiverem a comer”, basta pedir um pão e já podemos beber
sentados no exterior, as leis estão a ficar esquisitas, este não era um polícia
bom nem mau mas um polícia informativo, fez rondas nos restaurantes que ficavam
antes do meu e continuou pelos seguintes, entretanto passou outro carro da
polícia que ficou a contar quantos éramos na rua, demorou-se mas estávamos
dentro da lei e eles seguiram entretanto para ir fazer contas de somar noutros
sítios de Lisboa, a cidade está tensa porque os números são intensos - há
mais 457 novos casos de covid-19 em Portugal, é o maior aumento diário
desde o início de maio, a região de Lisboa e Vale do Tejo tem 86% da subida,
por isso há mais 86% de necessidade de perceber e resolver estas cadeias de
transmissão da pandemia mas também mais 86% de probabilidade de desconfianças e
erros de interpretação da realidade (“todo o ser humano, não importa o quão
forte ou poderoso é, é frágil quando se trata de morte - penso nisso em termos
gerais, não de forma pessoal”, é do profeta-Nobel Bob Dylan, está AQUI no
Expresso, tem reflexões de covid mas é tão mais que isso).
Os dados dizem ainda que aumentou o número de doentes com covid internados nos hospitais (458 no domingo, mais 16 que no dia anterior mas “muito longe do pico de abril, quando superava os 1.300”), também há mais internados nas últimas horas nos cuidados intensivos (subiram de 70 para 75), as vítimas mortais são no total 1564 (entre sábado e domingo foram mais três), vamos em 41.646 infetados e 27.066 recuperados - o surto no país, em gráficos e mapas, está explicado AQUI pela saudável e excelente equipa de infografia do Expresso, enquanto outras formas de paranoia estão anotadas ALI (exemplos: “‘O coronavírus foi introduzido de propósito pelo poder corrupto’, ‘Bill Gates está por detrás disto tudo para vender vacinas’ e ‘o mundo é controlado por uma elite de esquerda que esconde uma rede de pedofilia’. Eis apenas parte das teorias da conspiração que circulam na Alemanha, onde já nasceu um movimento de protesto contra as medidas de prevenção sanitária. A extrema-direita alimenta-se da desinformação”).
Bom mesmo é ingerir os ingredientes da informação, “Dados melhoram resposta à pandemia”, titula o Expresso, e o texto conta que “retratar a mobilidade num determinado concelho para adaptar a oferta de transportes ou monitorizar os resíduos para agilizar o sistema de recolha são apenas duas análises que os dados permitem fazer a nível local. Na atual pandemia, as autarquias com maior nível de ‘inteligência urbana’, ou seja, melhor planeamento e gestão de dados municipais, conseguiram dar melhor resposta às necessidades da população, concluiu o Urban Analytics Lab, um centro de investigação da NOVA Information Management School (IMS)” - ter informação e saber usá-la é portanto uma boa técnica de antiparanoia e até de futurismo, porque este mesmo artigo do Expresso tem algo de “Minority Report”, aquele filme com um polícia também com cabelo de revista e corpo de modelo, o Tom Cruise, em que há gente que é detida antes de cometer o crime que um algoritmo prevê (no caso das melhores autarquias no combate à covid elas também podem antecipar o futuro): “Em algumas situações, a governação local conseguiu perceber em tempo real as alterações dos hábitos de mobilidade nestes meses e assim saber em que pontos tinha de agir para responder às necessidades. No caso de Viseu, por exemplo, o facto de a autarquia ter um levantamento de todos os locais com lares e unidades de cuidados continuados foi útil, pois a Segurança Social conhecia apenas os que faziam parte da sua rede. Essa gestão de dados permite compreender o que aconteceu no passado e identificar padrões, mas não só. ‘Passa a ser possível usar esse conhecimento para prever o que vai acontecer’”.
O que ainda não se sabe exatamente é o que vai suceder a quem viajar entre Portugal e o Reino Unido e vice versa - temos ou não de cumprir quarentena à chegada?, os britânicos vão poder ou não viajar para cá? A lista de países bons e maus escolhidos pelo Governo de Boris Johnson é conhecida em breve, hoje mesmo porventura, a BBC diz que Portugal está entre os rejeitados mas o espanhol “El País” tem um relato melhor: “Portugal está entre os países que terão direito a uma ‘luz amarela’ no semáforo britânico, ou seja, que não verão os seus cidadãos obrigados a cumprir quarentena em solo britânico”, lê-se nesta notícia do Expresso, cujo site tem outro artigo com fonte espanhola, o “
OUTRAS NOTÍCIAS
. Um dos árbitros assistentes está infetado: Equipa de arbitragem do Marítimo-Benfica trocada devido a infeção de covid-19
. “É a vez de Diego enrolar o charro para o grupo de amigos que passa a tarde à entrada do café. Fá-lo com gestos lentos e meticulosos. Ali ninguém tem especial pressa. Estão quase todos desempregados e os dias são passados de forma monótona a olhar para a estrada. ‘Tínhamos de sair de casa. Já não dava mais para estar fechado por causa do vírus’”: reportagem Expresso em duas freguesias na lista negra da covid-19 - para ler AQUI
. Notícia SIC: Dois militares portugueses infetados na República Centro-Africana (há outros 37 que estão em quarentena)
. Mais covid: Marques Mendes diz que as expectativas foram altas e falsas - critica o Governo e a Direção-Geral da Saúde, considera que “houve facilitismo”
. Novamente Marques Mendes: TAP: “Estamos na iminência de um acordo” entre o governo e os acionistas privados (e ainda TAP é a única companhia na UE que tem de reestruturar e António Costa e Pedro Nuno Santos: divididos e a reinar)
. O primeiro-ministro a fazer humor no programa de Ricardo Araújo Pereira: Costa ironiza sobre o julgamento de Tancos: “[Parece que] o verdadeiro crime é a recuperação das armas. É tal a originalidade da narrativa” (e também Advogados de Tancos fazem queixa do juiz Carlos Alexandre)
. Treinador do Benfica pede desculpa pelas insinuações que fez sobre jornalistas: Bruno Lage: “Se essas declarações ofenderam, e pelos vistos parece que sim, aqui estou eu a lamentar o sucedido e a retratar-me” (as polémica declarações iniciais estão AQUI)
. Bruno Lage já agradeceu ao treinador do FC Porto por ter dito isto: Sérgio Conceição: “Se gosto de ver discutido na praça pública um colega de profissão, que é o Bruno Lage, não gosto. Tenho esse respeito”
. Uma grande entrevista Expresso: Sérgio Moro: “Espero que nada me aconteça” (e ainda: Sérgio Moro: “Não vejo perspetiva de uma solução autoritária no Brasil”)
. Os sindicatos estão incomodados: Banco Montepio fecha 31 balcões sem anunciar efeito nos trabalhadores
. Um ‘slogan’ racista associado aos supremacistas brancos: Trump ‘retweeta’ vídeo de apoiante a gritar “poder branco” e depois apaga
. Veja bem a segunda foto deste artigo, é triunfante, e leia tudo porque é bom: Centeno, o homem para todos os bancos?
. O sempre magnífico “Casa às Costas” da Tribuna Expresso: Pacheco, parte II: “Ó mister Queiroz, desculpe lá, diga-me, você não tem vergonha de gravar as conversas que tem com os jogadores?”
. Vai estar acompanhada de uma orquestra: Björk vai dar concertos com público em agosto. E todo o mundo pode ver
. Entrevista Blitz a um dos promotores do Paredes de Coura: João Carvalho: “Depois do primeiro Paredes de Coura que deu lucro, lá fomos os três pacóvios a Paris. Depois de anos a contar tostões”
. Multimédia Expresso: Foi há 80 anos que a França caiu após uma guerra relâmpago nazi. Conheça aqui o dia a dia dessas seis semanas sangrentas
. Artigo mais lido no Expresso durante o fim de semana (e decore este nome - João Pedro, ele aparece a meio do texto): “Ó André, não levantes a mão assim que eles vão já fotografar”. A marcha de Ventura para chamar os “portugueses comuns”
. Tabela interativa: Ranking nacional das Escolas Expresso/SIC
FRASES
“A Vida também é feita de momentos difíceis. E Bruno [Lage], para ti, para mim e para todos, é nos momentos menos fáceis da vida que a Ética e a Solidariedade se devem manifestar, talvez até com uma alegria que possa parecer arrogante. Para se conviver em sociedade (Boa) é imprescindível adotar algumas condutas e entre elas a solidariedade. Estrondoso o gesto magnífico do Sérgio Conceição. Fantástico! E aqui os Clubes ficam naturalmente de fora. Por baixo dos Fatos de treino dos treinadores mora sempre um humano. Claro que fizeste erros, eu também os cometi e espero voltar a cometer. (...) Força, Amigo” Manuel Cajuda, treinador de futebol, numa mensagem nas redes sociais de solidariedade para com Bruno Lage, treinador do Benfica, e de elogio ao facto de Sérgio Conceição, treinador do FC Porto, ter demonstrado o seu apoio público a Lage num momento em que ambos estão a lutar pelo título
“O perfil dos novos infetados é o de uma região [Lisboa] que, apesar de ser tratada como privilegiada, é vítima do crescimento unipolar do país” Daniel Oliveira no Expresso sobre o facto de a região de Lisboa continuar a ter a maioria dos novos casos registados de covid-19
“A crise vai doer nas almas e as feridas não vão ser iguais para todos. O desemprego e a ausência de um mínimo de recursos financeiros é um preditor muito forte do agravamento da saúde mental. Quem clamou, e bem, por mais e melhores apoios na saúde mental tem agora a oportunidade de pôr em prática esta preocupação. Mas temo que esta preocupação seja, mais uma vez e passado o ‘entusiasmo pandémico’ pelo sofrimento psicológico, cativada. Poderemos então falar de entradas de leão e saídas de sendeiro…” José Gameiro no Expresso
“Quero muito perceber como será o mundo pós-pandemia. Se vier aí uma nova normalidade, o mais certo é que a vida que tínhamos antes do vírus seja lembrada nostalgicamente como uma idade de ouro. O que não deixará de ser irónico” Manuel Vilas, escritor, no Expresso
O QUE EU ANDO A LER
Creio que o fim da adolescência é uma circunstância: não acontece aos 18 da maioridade legal ou aos 21 da licenciatura nem aos 30 dos empréstimos à habitação, não é certamente aos 40 das lipoaspirações e dos implantes de cabelo ou aos 50 dos despedimentos amigáveis nem aos 60 do temor de um tumor, há adolescentes licenciados endividados calvos gordos desempregados doentes com as idades todas, creio que a adolescência, a genuína adolescência, aquela além-envelhecimento e antientorpecimento, a que é determinada pela expectativa de tornarmos o nosso mundo um lugar transformado pelas nossas intervenções, essa adolescência tão vaidosa de esperança e desejosa de feitos só é desfeita pela introdução da morte, quando as infinitas ilusões juvenis se tornam repentinas desilusões adultas assim que atendemos o telefonema que anuncia a finitude das nossas pessoas:
- ele morreu
ou
- ela morreu
e depois silêncio, o rigoroso silêncio da dor, nenhum adolescente sabe manter o diálogo da morte, nem os envelhecidos tão-pouco, ficar subitamente crescido é ser vítima-sobrevivente da colisão de nos noticiarem a primeira morte da nossa intimidade de avós pais tios maridos mulheres cunhados sogros namorados irmãos amigos e demais prolongamentos de afinidade: a adolescência é ir passar o fim de semana a casa da mãe ou do pai ou de ambos se ainda estiverem juntos e trazer melancias para guardar no frigorífico e hambúrgueres no congelador, é almoçar um assado ao domingo à tarde enquanto a avó conta a história do baile em que o avô esse galã a seduziu em 1925, é chamar o cunhado que sabe mudar pneus quando temos um furo no Volkswagen, é fumar um cigarro com o sogro enquanto ele se intumesce com o tempo da tropa em que entrou num bar e acabaram todos à porrada (ele saiu-se bem claro que se saiu), é ouvir a adjetivação viçosa da sogra sobre os novos músculos do Ricardo Araújo Pereira, é receber uma chamada do irmão-muito-mais velho camionista a dizer que se sente sozinho na viagem para Itália porque lá caramba há tanto covid, é insistir com o namorado para não deixar a tampa da sanita levantada e ficarmos furiosos-enternecidos por ele nunca o fazer, é estar no Primavera Sound e aquela amiga que não conseguimos encontrar na multidão escrever “a vida vai acabar num instante. merecemos estar todos juntos!”, exclamação, merecemos sim, a adolescência é estar com gente gente gente, toda a nossa e tão querida gente, mas um dia o telefone toca e fica gente-1, é subtração irreparável, e depois fica-se com medo, tanto mas tanto tanto medo, todo o tanto e tão maldito tanto, do dia do segundo telefonema, gente-2, eles morrem-nos, meu Deus, mas os números deles continuam no nosso telemóvel, 91 qualquer coisa, o que se faz ao número de um morto?, digam-me o 5G do além e eu fundo uma operadora de telerressurreição, que frase adolescente, eu sei, mas apesar de adulto ainda me recordo das técnicas juvenis, é da saudade desse tempo, todo esse distante mas tão bem lotado tempo que acaba com um telefonema - e então não se perde a expectativa de tornarmos o nosso mundo um lugar transformado pelas nossas intervenções, o mundo é um lugar demasiado imperfeito para o abandonarmos aos seus defeitos, mas perde-se a inocência, essa fundamental condição adolescente, porque a cada feito notável da nossa vida lembramo-nos de quem faz falta, toda a aguda e tão insuperável falta, para celebrar connosco essas conquistas esporádicas, os adolescentes não têm tempo para emoções destas, estão demasiado ocupados da gente toda, não sabem como dói uma memória, é nisto que creio porque ficar adulto é isto que li:
“Um dia alguém morre apressadamente e as referências
estruturais da memória são elementos geométricos
e decorativos no interior das casas, impressos
nos fragmentos de luz. E o amor
cabe dentro da morte como punhados de terra
em mãos fechadas”,
está na “Autópsia” do José Rui Teixeira, poeta da minha terra, o Porto onde acabou a minha adolescência, foi lá que fiquei adulto que é sentir desta maneira:
“a morte dos outros é mais difícil do que a nossa, porque vivemos a morte deles e não viveremos a nossa. E porque a morte dos outros significa o desmantelamento do nosso passado, a inexistência do nosso passado, do qual deixa de haver prova indiscutível. Ficam imagens, objectos, detritos, coisas em gavetas que nada dirão aos vindouros. E os nossos mortos fazem-se não apenas pó mas nevoeiro, figuras extintas, indistintas, irrecuperáveis”,
é das “Imagens Imaginadas” do Pedro Mexia, ando a folhear, o Mexia é do Expresso que é o jornal da minha vida adulta, o meu gente-1 ia ter orgulho de eu publicar onde o Mexia escreve, é preciso lembrar o que os mortos sentem por nós, reparem no verbo: “sentem” terceira pessoa do plural do presente, não é amor passado mas amor presente, é amor até com data, gente-1 faria anos daqui a dias, parabéns:
“O passado de qualquer ser humano transforma-se num fantasma, mas temos de fazer um esforço e recordar, porque recordar engrandece-nos, eleva-nos para lá da vida e da morte, para lá da História, da política e da humilhação. Quem recorda e o faz com toda a profundidade devida transforma-se num deus”, é do Manuel Vilas e do seu “E, de repente, a alegria”, é o que ando a ler, o Manuel Vilas sofreu gente-1 e depois gente-2, pai e mãe, gosto muito do arranque do livro, é assim, todo este aparentemente adulto mas na verdade tão adolescente assim: “Tudo aquilo que amámos e perdemos, que amámos imensamente, que amámos sem saber que um dia nos seria roubado, tudo aquilo que, após a sua perda, não conseguiu destruir-nos — embora tenha insistido com forças sobrenaturais e procurado a nossa ruína com crueldade e afinco — acaba, mais tarde ou mais cedo, transformado em alegria”.
Tenha um bom dia.
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