segunda-feira, 29 de junho de 2020

Brasil | Há 193 anos nascia a Imprensa gaúcha


"Onde a imprensa é livre e todo homem é capaz de ler, tudo está a salvo." - Thomas Jefferson (1743-1826).
  
Carlos Roberto Saraiva da Costa Leite* | Porto Alegre | Brasil 
       
Neste ano de 2020, a imprensa gaúcha completou 193 anos de fundação. No dia 1º de junho de 1827, começou a circular o Diário de Porto Alegre (1827-1828), o primeiro jornal da Província de São Pedro (RS), depois de transcorridos dezenove anos do lançamento, na Inglaterra, em português, do Correio Braziliense (1808-1822), de Hipólito José da Costa (1774-1823), que inaugurou a imprensa brasileira. Embora tenham sido lançados em períodos distintos, ambos os jornais começaram a circular em 1º de junho. 

Criado sob a proteção do presidente da Província, o brigadeiro Salvador José Maciel (1781-1853), era impresso em duas páginas e media 13 cm x 29 cm. De circulação diária, com exceção dos domingos e feriados, seu título foi uma homenagem a capital gaúcha.  Na loja de José Justiniano de Azevedo, estabelecido à Rua da Praia nº 85 (Rua dos Andradas), o jornal começou a ser vendido a 40 réis. 

A circulação do Diário de Porto Alegre tornou-se possível graças à participação dos franceses Dubreuil e Estivalet, respectivamente impressor e tipógrafo, em seu país de origem, que desertaram, durante a Guerra da Cisplatina (1825-1828), das tropas do Gen. argentino Carlos Maria de Alvear. Segundo o cronista de Porto Alegre, Antônio Álvares Pereira Coruja (1806-1889), estes franceses apareceram na Província “ainda de fardeta argentina“. 
                                                     
O primeiro redator e administrador do jornal foi João Inácio da Cunha, seguido por Vicente Ferreira Gomes, cuja alcunha era “Carona”. Este último - jornalista de ideias liberais-, foi biografado pela jornalista Célia Ribeiro no livro O Jornalista Farroupilha / Vicente Ferreira Gomes (2012). O Diário de Porto noticiava os atos oficiais do governo da Província, as notícias acerca do Comércio e Navegação e anúncios variados, incluindo os de venda e aluguel de escravizados.

Na realidade, o primeiro prelo a funcionar, na então Província de São Pedro (RS), foi a Imperial Tipografia do Exército, trazida do Rio de Janeiro pelo Marquês de Barbacena, que acompanhava as forças sob o seu comando na Guerra da Cisplatina (1825-1828). Esta imprimiu apenas dois boletins de guerra e uma proclamação, pois, durante a Batalha do Passo do Rosário, em 20 /02/1827, foi apreendida pelas forças inimigas.

A Tipografia Rio-Grandense, responsável pela impressão do Diário de Porto Alegre, localizava-se na Rua da Igreja nº 113, atual Duque de Caxias. Comprada, em 1821, por meio de subscrição pública, no Rio de Janeiro, sob o patrocínio do presidente da Província Carlos de Saldanha de Oliveira e Daun, esta chegou a Porto Alegre, no dia 04 de agosto de 1822, a bordo do bergantim Reino Unido.  Segundo Dr Sérgio da Costa Franco, em seu livro Porto Alegre Ano a Ano / Uma cronologia histórica 1732/1950, lançado em 2012, transcorreram cinco anos, para que finalmente o prelo imprimisse nosso primeiro jornal, que circulou até 30 de junho de 1828, totalizando 292 edições.

A demora é atribuída, por alguns pesquisadores, ao fato de que não havia ninguém, na Província, capacitado para colocar em funcionamento o mecanismo tipográfico. Outra explicação quanto ao atraso, em publicar o nosso primeiro jornal, justifica-se pela prisão, por motivos políticos, do presidente da Província e seu envio para o Rio de Janeiro.

O surgimento da imprensa, no Rio Grande do Sul, esteve, por longo tempo, envolto de equívocos históricos. A partir da publicação do trabalho A origem da Imprensa no Rio Grande do Sul, em março de 1941, do pesquisador e jornalista Nestor Ericksen, na Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande Sul, ano XXI, puderam, enfim, ser elucidadas algumas questões. O Museu de Comunicação Hipólito José da Costa (MuseCom), instituição voltada à memória da comunicação gaúcha, tem sob a sua guarda apenas um exemplar original.

Infelizmente, de acordo com a pesquisa de Ericksen, a coleção completa e original do Diário de Porto Alegre, doada pelo Dr. Alfredo Varela (1864-1943) para o Arquivo Histórico do Estado, encontra-se desaparecida desde a década de 1970, embora os procedimentos jurídicos para averiguação, que foram, na época, devidamente realizados.

Publicado no jornal gaúcho Zero Hora em 20 /06/2020

Bibliografia
ERICSEN, Nestor. O Sesquicentenário da Imprensa Rio-Grandense. Porto Alegre:  Sulina, 1977.
 MIRANDA, Marcia Eckert; LEITE, Carlos Roberto Saraiva da Costa. Jornais raros do Musecom: 1808-1924. Porto Alegre: Comunicação Impressa, 2008.
 VIANNA, Lourival.  Imprensa Gaúcha (1827-1852). Porto Alegre: Museu de Comunicação Social HJC, 1977.

*Pesquisador e responsável pelo Núcleo de Pesquisa do MuseCom

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