Entre repulsa e determinação,
manifestantes antirracistas reuniram-se hoje no centro de Washington para
exigir o fim da violência policial contra a minoria negra, após uma série de
incidentes que reabriram as feridas raciais nos Estados Unidos.
"Estamos fartos de promessas
que não cumpriram", afirmou o reverendo Al Sharpton diante do
memorial erigido em honra de Abraham Lincoln, o antigo Presidente
norte-americano que aboliu a escravatura nos Estados Unidos há cerca de século
e meio.
Cerca de 57 anos depois do
emblemático discurso do líder da luta pelos direitos cívicos Martin Luther King
-- "I have a dream" (Eu tenho um sonho) -- dezenas de milhares de
pessoas desfilaram novamente pelas ruas da capital federal para reclamar a
igualdade entre todos.
"As vidas dos negros contam
e não nos vão deter até que contem em todo o mundo", acrescentou o
reverendo norte-americano.
Entre a multidão, muito diversa,
Don Carlisle, um negro na casa dos 50 anos deixou filtrar a mesma
amargura.
"Há 300 anos que esperamos
pela igualdade. Tecnicamente, construímos o país e somos tratados de forma
injusta", resumiu.
"Tira o teu joelho dos
nossos pescoços" é a palavra de ordem da manifestação, aludindo à morte de
George Floyd, um afro-americano asfixiado às mãos de um polícia branco em
Minneapolis (Minnesota), cujo calvário desencadeou um movimento de protesto
inédito nos Estados Unidos há décadas.
"Submergido" pela
emoção, o irmão de George Floyd, Philonise, agradeceu aos manifestantes
pela mobilização.
"Adoraria que George
estivesse cá para vos ver. A mudança está a chegar porque nós o exigimos, os
nossos líderes devem-nos seguir", afirmou Philonise.
Presente esteve também o pai de
Jacob Blake, gravemente ferido pelo polícia domingo em Kenosha (Wisconsin),
que gritou palavras de ordem como "sem justiça não há paz", lembrando
os sete tiros disparados contra o filho por um agente que "não foi nem
detido nem acusado".
O drama com Blake, que ficou
paralisado da cintura para baixo, é o mais recente de uma longa série e
reacendeu as chamas da contestação, desencadeando também atos de
violência durante três noites seguidas em Kenosha, no Estado de Wisconsin,
onde duas pessoas foram abatidas a tiro por um jovem de 17 anos.
Os ferimentos infligidos a Jacob
Blake desencadearam paralelamente um movimento de protesto sem precedentes no
mundo do desporto. Após a decisão dos basquetebolistas dos Milwaukee Bicks de
boicotar um jogo, a NBA reportou também vários casos idênticos entre
quarta-feira e hoje.
Hoje, em Washington, os oradores
saudaram os atletas e reprovaram o discurso do Presidente norte-americano,
Donald Trump, que, há várias semanas, insiste na questão da violência existente
à margem das manifestações, sem ter dito uma única palavra sobre as
reivindicações dos afro-americanos.
Em campanha para a sua reeleição,
Trump apresenta-se como um defensor "da lei e da ordem" face ao rival
democrata, Joe Biden, a quem acusa de querer deixar os Estados Unidos num
caos.
"Se o Partido Democrata quer
ficar do lado dos anarquistas, agitadores, desordeiros, saqueadores e
queimadores de bandeiras, isso é problema deles, mas, como presidente, eu
recuso", disse Trump quinta-feira à noite, no discurso de aceitação da
nomeação do Partido Republicano como candidato à sua própria sucessão.
"Todas as famílias
denunciaram as pilhagens, mas não vimos ninguém a denunciar as balas
disparadas", retorquiu o reverendo Al Sharpton.
"Não estamos em segurança
com ele [Trump] no poder", acrescentou Tracy Williams, uma militar negra
na reserva que participou na marcha com todos os membros da família.
Também numa linha política,
vários oradores convidaram os manifestantes a votarem maciçamente em
03 de novembro, dia das presidenciais norte-americanas.
"Devemos marchar para as
urnas para defender as liberdades pelas quais as gerações precedentes se
bateram duramente", declarou o filho de Martin Luther King, cujo pai foi
assassinado a 04 de abril de 1968, quando tinha apenas 10 anos.
"Se vocês procuram um
salvador, ponham-se diante de um espelho", afirmou, apelando aos
manifestantes para que não idolatrem o pai.
Notícias ao Minuto | Lusa |
Imagem: Lusa
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