sexta-feira, 21 de agosto de 2020

Portugal | O pior não é a segunda vaga


Manuel Molinos | Jornal de Notícias | opinião

"Em setembro, vamos ter muitos vidros partidos por aqui. Muita fome e desespero". A antevisão é de uma empresária do ramo da restauração, proprietária de um estabelecimento em Olhos de Água, Albufeira. No ano passado tinha 18 empregados. Este ano tem dois. "Só mantenho o restaurante aberto porque o imóvel é meu. Caso contrário, fazia como os outros: fechava a porta", explicou-me em demorada conversa, já que se contavam os clientes daquela noite pelos dedos de uma só mão.

Confesso que se não tivesse passado uns dias de férias naquela zona algarvia, não teria a exata dimensão do forte impacto económico que se instalou também naquela região, que, como sabemos, tem no turismo e serviços o seu sustento.

O preocupante é o que vem aí, depois de setembro, mesmo que, entretanto, os turistas britânicos nos visitem. Ali e por todo o país, com as despesas das famílias a aumentarem com o regresso às aulas e aos locais de trabalho e com o fim das moratórias.

São por isso assustadores, mas infelizmente pouco surpreendentes, os dados divulgados pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional, que mostram um agravamento dramático do desemprego.

Ninguém se iluda nem espere que o "vai ficar tudo bem", tantas vezes enunciado durante o confinamento, realmente aconteça. Não vai ficar tudo bem quando os que ainda resistem, na esperança de que agosto e setembro lhes salve os negócios já moribundos, fecharem as portas por falta de clientes. Não vai ficar tudo bem quando muitas empresas regressarem de férias e não tiverem encomendas nem como pagar ordenados. Não vai ficar tudo bem para muitos portugueses que acabarão sem trabalho.

A segunda vaga de covid-19 não será, portanto, o maior problema que se afigura no futuro próximo. António Costa avisou, e bem, que não vamos poder voltar a encerrar escolas e empresas, o que representaria a destruição do funcionamento da sociedade tal como a conhecemos. Resta-nos a esperança de que os milhões que virão de Bruxelas sejam bem usados. Não só para diminuir o impacto desta terrível pandemia, mas sobretudo para nos preparar para um futuro mais seguro e que não nos coloque sempre numa humilhante posição de pedintes da Europa.

*Diretor-adjunto 

1 comentário:

mitro disse...

Os milhões de Bruxelas hão de ir parar aos bolsos dos mesmos de sempre.

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