quinta-feira, 25 de março de 2021

Leis do Chega sobre perda da nacionalidade e castração química nas mãos de Ferro

Ferro Rodrigues, a exemplo do que já fizera quanto a outros diplomas do Chega em tivera dúvidas constitucionais, pediu um parecer à comissão sobre se a constitucionalidade dos projetos para serem admitidos

O presidente da Assembleia da República vai decidir se dois projetos de lei do Chega, sobre a perda de nacionalidade e a castração química, "chumbados" esta quarta-feira na comissão de Assuntos Constitucionais, vão ser debatidos.

A comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias discutiu esta quarta-feira, durante quase duas horas, os pareceres sobre os projetos do partido de André Ventura e, nos dois casos, concluiu que são inconstitucionais e, portanto, não admissíveis, conforme estipula o regimento da Assembleia da República.

Ferro Rodrigues, a exemplo do que já fizera quanto a outros diplomas do Chega em tivera dúvidas constitucionais, pediu um parecer à comissão sobre se a constitucionalidade dos projetos para serem admitidos.

O primeiro a ser discutido foi a lei para tirar a nacionalidade a cidadãos naturalizados condenados por crimes com penas de mais de cinco anos ou que "ofendam símbolos nacionais", mas que um parecer da ex-ministra da Administração Interna e deputada do PS Constança Urbano de Sousa conclui violar a Constituição, no princípio da igualdade, nos artigos 3.º e 26.º, entre outros.

Ou seja, os cidadãos com nacionalidade portuguesa têm todos os mesmos direitos, sendo apenas excecionado o direito a candidatar-se a Presidente da República aos cidadãos por naturalização.

"Direito à nacionalidade é um direito a ter direitos", sintetizou Constança Urbano de Sousa, para quem a Constituição "não estabelece a distinção entre portugueses pela forma como adquiriram a nacionalidade".

André Ventura, do Chega, argumentou que a perda de nacionalidade é para casos em que os cidadãos são condenados a penas superiores a cinco, por crimes graves, como tráfico de droga, crimes sexuais ou branqueamento de capitais, ou ainda em quem "passa a vida a ofender Portugal e a sua memória histórica".

E afirmou que vários países na Europa, como a Suíça ou o Reino Unido, retiram a nacionalidade, ao que Constança Urbano de Sousa respondeu que esses Estados não têm um artigo na Constituição que determina: "A privação da cidadania e as restrições à capacidade civil só podem efetuar-se nos casos e termos previstos na lei, não podendo ter como fundamento motivos políticos."

A generalidade dos partidos concordou com o parecer, embora BE e CDS tenham voltado a levantar reservas à comissão estar a fazer um escrutínio de constitucionalidade prévia a iniciativas legislativas.

Se Catarina Rocha Ferreira, do PSD, concordou que o diploma tem "inconstitucionalidades insanáveis" e que a Constituição "protege a cidadania", a que o cidadão "não pode ser privado por motivos políticos, opiniões, ainda que antipatrióticas", Telmo Correia, do CDS admitiu que "não o chocaria" discutir o assunto, mas num caso extremo.

Esse "caso extremo" seria se um cidadão que se tivesse naturalizado português, fosse acusado e condenado por terrorismo.

Luís Marques Guedes, presidente da comissão, do PSD, considerou que a proposta do Chega, a ser aprovada, criaria uma "espécie de nacionalidade precária, diminuída ou de rédea curta" para "cidadãos que ficavam condicionados".

No final, o parecer foi aprovado por larga maioria, com os votos do PS, PSD, PCP, BE, Joacine Katar Moreira e registou os votos contra do Chega e do CDS.

O parecer seguinte era sobre o projeto de lei do Chega de castração química para reincidentes em casos de violação, que é desproporcional e "redunda numa pena cruel, degradante e desumana" e, de novo, foi considerado inconstitucional.

O debate foi prolongado, quase uma hora, e começou com as conclusões do parecer, pela inconstitucionalidade, de Joacine Katar-Moreira, de que "a pena acessória de castração química, a aplicar ao agressor sem que este dê a sua anuência, não só não constitui uma sanção proporcional ou necessária" para "a concretização dos fins do Direito Penal, quer de prevenção geral, quer de prevenção especial".

Além do mais, é "manifestamente lesiva da dignidade da pessoa humana" e "redunda numa pena cruel, degradante e desumana" e, segundo Joacine, "diferenciar os cidadãos dos criminosos é incompatível com Estado de direito democrático".

O PS, através de Cláudia Santos, e o PCP, com António Filipe, concordaram com o parecer, Mónica Quintela, do PSD, também o afirmou, mas alertou haver propostas no projeto que não violam a Constituição, como o aumento de penas para a violação.

O que motivou a acusação de António Filipe de que, admitir esse aspeto, seria fazer "entrar pela janela" o não "entrou pela porta", ou, dito de outra maneira, "embrulhar uma proposta inconstitucional com outras e sancioná-la".

No final, ainda se votou um ponto de conclusões alternativo, para referir que algumas das propostas do projeto do Chega não são inconstitucionais, mas foi chumbado.

O texto restante parecer foi aprovado com os votos favoráveis do PS, PSD, BE, PCP e Joacine Katar Moreira e os votos contra do Chega.

O deputado único do Chega entregou, em 1 de março, um projeto que altera o Código Penal, aumentando a pena de prisão pelo crime de violação até 12 anos e introduzindo a castração química para agressores sexuais reincidentes.

Expresso | Lusa

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