terça-feira, 21 de junho de 2022

Angola | SOMBRAS E AMEAÇAS À FESTA DAS ELEIÇÕES – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

A festa das eleições já começou e os eleitores mostram a sua alegria por, mais uma vez, poderem escolher quem vai dirigir os destinos de Angola nos próximos cinco anos. A festa tem luz, colorido, muita imaginação e o brilho único, inapagável do fabuloso Mosaico Cultural Angolano. Em Camacupa até as Mais Velhas rufam o tambor. Em Luanda é a dança trepidante em honra da obra feita e em saudação ao muito que ainda falta fazer. Em Cabinda é o colorido que envolve o mundo em ondas de vida que se libertam do Maiombe. Em Benguela é o ritimo do vento nas casuarinas da Praia Morena. No Cuando Cubango a altivez de quem foi capaz de destruir o regime racista da África do Sul. No Lucala a vida envolvida em magia. No Dundo o brilho da tradição. Aí está a festa. A nossa festa da democracia.

Ninguém tem mais vontade de entrar na festa do que os militantes e votantes no MPLA. A festa só existe porque o MPLA pegou na batuta e regeu a orquestra da luta de libertação, desde os anos 50, até hoje. O maestro é nosso. Os instrumentos foram criados e construídos por nós. A música foi composta por nós. A dança é nossa. A alegria é de todos, mesmo os que não querem entrar na festa ou detestam a alegria do Povo Angolano, os êxitos do Povo Angolano, as conquitas do Povo Angolano, sob a bandeira do MPLA.

Onofre Martins dos Santos é meu Mais Velho do Liceu Salvador Correia. Quando estava no segundo ciclo ele era finalista. Depois foi para o Puto e de lá voltou com o curso de Direito. Ao contrário de outros, que nunca mais regressaram e tanta falta nos faziam. Depois do 25 de Abril aderiu à FNLA. Foi colaborador muito próximo de Holden Roberto. Desencantou-se com a política e fez a sua vida. Todos sabem que a ele se deve o êxito das primeiras eleições multipartidárias, em 1992. Especializou-se nas técnicas eleitorais e hoje é uma autoridade mundial na matéria. É público que foi juiz do Tribunal Constitucional onde se jubilou. Quase todas e todos sabem que é escritor. Um grande escritor. Quando me sair o euromilhões vou publicar a sua obra completa e distribuí-la grátis pelas escolas angolanas. Fica a promessa!

Ele entrou na festa das eleições à sua maneira, com inteligência, dedicação, partilha, espírito solidário, patriotismo. Onofre Martins dos Santos é do tempo em que éramos patriotas e servíamos a Pátria sem apresentarmos a factura ou esperarmos pagamentos, por cima ou por baixo da mesa. Deu uma entrevista ao Novo Jornal notabilíssima, que devia ser profusamente distribuída em todo o país, mas particularmente entre os mentores da Frente Podre da UNITA (FPU). O sistema eleitoral em Angola é bom? Resposta do perito na matéria, Onofre Martins dos Santos: 

“Comporta riscos muito inferiores aos da antiga recolha e tratamentos manuais”. Mas também garante “toda a informação pertinente aos eleitores, tanto à sua inscrição nos cadernos eleitorais, como no apuramento dos votos. Hoje, por exemplo, todos usamos o telefone portátil de última geração e já não aceitaríamos comunicar de outro modo. Em alguns países com menos recursos do que Angola ainda se faz o recenseamento manual dos eleitores e publicam-se as listas com os nomes nas paredes”.

A festa da democracia é nossa, tem de ser bonita, não pode ser ensombrada com ataques traiçoeiros, falsos, mentirosos. A verdade está  nas nossas mãos, no voto que depositamos nas urnas. Por isso, diz Onofre Martins dos Santos: “Angola já usa processos avançados de registo e de comunicação rápida desde 1992, sendo dos países que despendem verbas altíssimas para garantir essa qualidade do processo eleitoral (…) Hoje ninguém pode dispensar os meios electrónicos na execução do processo eleitoral. Mas como tudo se aprende, é preciso explicar muito bem aos actores políticos e aos líderes sociais o funcionamento dessas inovações que são introduzidas para melhorar a eficácia e a eficiência dos processos eleitorais e não para enganar, como muitas vezes somos induzidos a pensar”.

Por favor, ofereçam o texto integral desta entrevista aos mentores da Frente Podre da UNITA (FPU). Pode ser que o seu conteúdo ilumine aqueles espíritos fechados que sendo fraudes humanas, pensam que tudo é uma fraude. Mas Angola não é uma fraude. Custou o sangue e as vidas de milhões de angolanas e angolanos, para ganharmos o direito à grande festa da democracia. O que leva políticos que deviam ser verdadeiros, honestos e responsáveis, a recorrerem ao falso argumento da fraude eleitoral? Responde Onofre Martins dos Santos, uma autoridade mundial em questões eleitorais: 

“Eu insisto sempre na importância dos delegados de lista não porque espere que eles detectem irregularidades e fraudes nos actos eleitorais, mas para que as pessoas tenham boas razões para acreditar que não será fácil cometer actos proibidos no processo eleitoral. Se pensarmos nisto, compreenderemos que todas as dúvidas que se levantam contra o material eleitoral e a solução tecnológica de apuramento de votos se desvanecem. Se numa mesa de voto estiver um delegado de lista, ele vai poder verificar, desde a abertura das urnas, que elas estão vazias, vai poder conferir os maços de boletins de voto que vão ser utilizados, pode inspeccionar as cabines de voto e verificar como cada eleitor exerce livremente o seu direito de voto. Vai ainda poder controlar o encerramento da votação, o fecho das urnas, assistir à retirada dos boletins de dentro das urnas e à sua contagem, bem como à elaboração da respectiva acta das operações eleitorais, podendo apresentar reclamações a qualquer momento de todo esse processo. É ainda preciso esclarecer que o delegado de lista da mesa n.º 1 de qualquer assembleia de voto com mais de uma mesa, deve poder acompanhar e verificar a elaboração da respectiva acta-síntese que englobará os dados de todas as mesas de voto de uma assembleia de voto, devendo assiná-la em sinal de concordância com o seu conteúdo e ficando com uma cópia para o seu partido ou coligação”.

Na nossa festa não há fraude! Mas não podemos calar os políticos que são uma fraude. A democracia obriga-nos a conviver com eles. Além desse convívio obrigatório em nome do regime democrático também podemos enviar-lhes esta declaração de Onofre Martins dos Santos:

“O ideal seria que os partidos políticos tivessem um delegado de lista em cada mesa de voto ou, pelo menos, em cada mesa n.º 1 de cada assembleia de voto cujo presidente tem a função de elaborar a acta-síntese dos resultados de todas as mesas de uma assembleia de voto. É aqui que o controlo dos partidos políticos tem todo o seu significado e não junto do Centro de Apuramento Nacional, que é um trabalho electrónico de soma dos resultados de todas as actas-síntese, por círculo provincial e pelo círculo nacional, onde os representantes dos partidos não têm nem podem ter qualquer interferência. Se o apuramento nacional é feito com base nas actas das assembleias de voto, é no conteúdo destas actas que os partidos políticos se devem concentrar.”

Como se resolve esse problema? Onofre Martins dos Santos responde mas faz um alerta: “O recrutamento e a formação de todo este pessoal é sempre muito complexo e custoso e talvez por isso se deixa para a última hora, como se não fosse uma das mais importantes de todo o processo. Não só porque só eles podem reclamar de qualquer irregularidade, como são, no final, portadores da cópia da acta de cada assembleia de voto que vai ser uma parcela dos resultados a processar no Centro Nacional de Apuramento dos Votos”.

Perceberam agora? Os delegados de cada partido são o selo de garantia, a chancela, de todo o processo eleitoral. E se existirem irregularidades, só os delegados devidamente formados e credenciados podem denunciar. Cada delegado fica com a cópia da actas da assembleia de voto. Devidamente assinada. E essa assinatura significa que está tudo certo, tudo legal, tudo confirme as regras. Os dirigentes partidários não podem nem devem interferir. Ainda que façam dessa interferência ilegítima, a essência da sua intervenção política. Onofre Martins dos Santos não deixa passar em branco este aspecto: 

“A experiência de não-aceitação de resultados teve réplicas em 2008, 2012 e 2017. Não tenho a menor dúvida de que se vai repetir em 2022, felizmente sem as consequências dramáticas de 1992 porque as circunstâncias são outras desde os Acordos de Paz. Infelizmente a paz e a estabilidade nunca estão garantidas quando se denunciam fraudes eleitorais desacompanhadas de qualquer prova material, unicamente apoiadas na férrea convicção de que os resultados foram manipulados. Essa convicção pode ser contagiosa e incendiária, razão pela qual todas as dúvidas dos partidos políticos sobre o material eleitoral e a as respectivas soluções logísticas devem ficar esclarecidas pela CNE e com a mais ampla divulgação. Também seria muito conveniente que fosse assumido pelos partidos políticos concorrentes, como princípio basilar de conduta, o compromisso de só denunciar uma fraude eleitoral desde que seja apresentada a respectiva prova material e o comprovativo da reclamação do Delegado de Lista que a tenha verificado”.

É isso mesmo. Mas não está a acontecer nem vai acontecer. A Frente Podre da UNITA (FPU) já começou a ventilar porcaria para cima da festa. A tirar o brilho à nossa alegria, ao nosso compromisso com a democracia. Mas tomem nota desta declaração de Onofre Martins dos Santos:

“Para bem preparar estas eleições de Agosto, o maior desafio continua a ser o recrutamento e a formação do pessoal eleitoral”. A Oposição nada fez. Absolutamente nada. Só lhe interessa a fraude.

A entrevista de Onofre Martins dos Santos ao Novo Jornal devia ter sido publicada no Jornal de Angola, o som emitido pela Rádio Nacional e as imagens mostradas na TPA. Nada disso aconteceu. As pressões sobre os Media públicos funcionam! E tiram brilho à nossa festa.

*Jornalista 

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