quinta-feira, 1 de setembro de 2022

Angola | DAS CANELAS AOS DENTES TUDO É FRAUDE – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

O futebol é um desporto que tem em Angola excepcionais praticantes. Hoje o expoente máximo chama-se Pedro Mantorras. Mas no antigamente tivemos alguns executantes que eram os melhores do mundo. Vou excluir da lista os que constituem o estádio supremo, que são os futebolistas do meu tempo de miúdo: Faria, Barros, manos Rocha (Chico e Luís) ou o Santiago, um guarda-redes que desmoralizava os adversários defendendo os remates apenas com uma mão. Ele tinha uma manápula descomunal. Estes são os extraterrestres e não contam para a lista dos comuns mortais.

Melhores que Pelé, Maradona ou Mantorras eram o Zedu (tantas saudades, camarada Presidente!), o Justino Fernandes (além de melhor futebolista do mundo é também um ser humano excepcional), Espírito Santo, Assunção, Adérito Raquel, Pedro Gomes e o deus do futebol, Nicola Berardineli. Era senhor de uma técnica excepcional. Foi contratado para jogar no Benfica de Lisboa (o de Luanda não admitia pretos) mas na hora da partida começou a chorar de saudades e já não foi. 

O Nicola era um negro de Porto Amboim e tinha nome de italiano. Descendia dos revolucionários napolitanos que tentaram derrubar a monarquia e implantar a república na Sicília. Condenados à morte, o rei transformou a pena em degredo perpétuo. Portugal aceitou acolher os condenados na “colónia penal de Angola”. São os antepassados de todos os angolanos que têm nomes de família italianos. Um deles, o capitão Bessa Victor, era o avô do poeta Geraldo Bessa Victor. Mas também temos o signore Paris, dono do Hotel Paris, no Bairro dos Coqueiros, o meu amigo Pugliese, o grande futebolista Cardona, o meu colega do liceu Castelli e o deus Nicola, da família Berardineli. 

O futebolista mais tecnicamente dotado do nosso tempo tinha uma característica que lhe causou muitos dissabores. Para ele a bola ia até às canelas, joelhos, abdómen, costelas e até ao rosto dos adversários. Um dia a bola também se estendeu até ao senhor árbitro e o Nicola foi acusado de agressão ao homem do apito. Acabou ali a sua fabulosa carreira desportiva. Imaginem o que acontecia ao Adalberto da Costa Júnior que não só agride o árbitro mas também lhe usurpa o lugar. Depois de cinco eleições em que a UNITA sempre invocou fraude e como jogador agride e usurpa o papel da Comissão Nacional Eleitoral. Chegou a hora de tomar medidas.

O secretário-geral da UNITA fala como se fosse o árbitro destas eleições. E recusa os resultados. Porque houve fraude! Tal como o meu saudoso amigo Nicola, para quem a bola ia até aos dentes dos adversários e ele pontapeava forte, a UNITA, se uma assembleia de voto abriu cinco minutos mais tarde, é fraude. Se um voto tem a cruz fora do três e é considerado nulo, é fraude. Se o delegado do partido está podre de bêbado e é posto fora da mesa de voto, é fraude. Se das províncias mandam actas síntese falsas e rasuradas para a sede do Galo Negro, essas falsificações ficam logo documentos autênticos e a CNE entra em fraude. Se os comissários indicados pela UNITA para a CNE batem com a porta, a acta dos resultados oficiais é falsa porque não tem a assinatura dos faltosos.

Basta! A UNITA não pode participar em mais actos eleitorais. Porque desacredita o sistema eleitoral, atenta contra o bom nome de Angola, falta ao respeito aos eleitores, despreza milhares de angolanas e angolanos que trabalharam no processo eleitoral, deste o registo eleitoral s até à contagem dos votos. A primeira lei da próxima Assembleia Nacional tem de acabar com estes insultos. Partido ou coligação que invoque fraude sem provas, fica proibido de concorrer durante duas eleições. O mesmo para dirigentes partidários e candidatos. 

Em 1992, quando a UNITA perdeu estrondosamente as eleições, os Media portugueses davam-lhe uma vitória esmagadora. E foi em Portugal que deram corda à tese da fraude eleitoral. Uma mentira hedionda propagada por jornalistas que encheram os bolsos com dinheiro dos diamantes de sangue. O secretário-geral da UNITA, Alicerces Mango, ameaçou com a guerra. Ele sabia que tinha maias de 20 mil homens armados até aos dentes escondidos nas bases do Cuando Cubango, criadas pelos serviços secretos da África do Sul. 

O representante da UNITA na CMVM, Salupeto Pena, disse aos jornalistas: “Eu tenho poder para pôr na rua as nossas forças armadas e o povo”. Pôs mesmo as tropas (que não podia ter) nas ruas de Luanda. Mataram centenas de luandenses civis. O general Ben Ben, que devia representar a UNITA no comando das novas Forças mas Armadas Angolanas, também ameaçou com as forças armadas da UNITA. Abel Chivukuvuu foi muito mais bruto: “Se publicarem os resultados eleitorais vamos somalizar Angola”. 

Tantos anos depois e no desfecho das quintas eleições gerais, repete-se o filme. A UNITA rejeita os resultados eleitorais porque perdeu. E nos círculos provinciais onde ganhou diz que ganhou por mais! É o cúmulo do abuso! Esta gente não respeita nada nem ninguém. Nem sequer se respeitam a eles. Agora não ameaçam pôr na rua as suas forças porque não têm um exército ilegal escondido. Mas têm os gangues todos das grandes cidades. O banditismo (bandidos de delito comum e bandidos da política) está mobilizado para matar, agredir e destruir. 

Volto a repetir a frase que marcou esta campanha eleitoral: “Não atentem contra a Segurança Nacional porque levam no focinho”. Basta de abusos e insultos. A UNITA e seus parceiros da Sociedade Civil têm de ganhar juízo porque só assim um dia podem ganhar eleições.

A União Europeia já está a afiar a moca para agredir Angola colocando-se ao lado da UNITA na invocação de fraude eleitoral. A representante do cartel em Luanda já há muito devia ter recebido guia de marcha. A descendente dos piratas holandeses (hoje são puritanos!) pensa que Angola é uma colónia. Ou que os titulares dos órgãos de soberania angolanos devem ajoelhar-se à frente dos nazis de Bruxelas, só porque nos mandam meio chouriço depois de roubarem mil porcos aos angolanos.

Os portuguesinhos ignorantes e saudosos do colonialismo também pensam que podem dar palpites em Angola. Gostava de saber quem retirou do aeroporto 4 de Fevereiro o cartaz onde estava escrito “reservado o direito de admissão”. Toda a porcaria mediática portuguesa nos entra pela porta dentro! E como cheira mal!

*Jornalista

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