Artur Queiroz*, Luanda
Muito obrigado ao senhor Jair Bolsonaro por mostrar aos angolanos de uma forma tão clara, tão expressiva, o que é a UNITA quando os eleitores dão força aos inimigos da democracia e os aproximam de uma vitória eleitoral. Os sicários do Galo Negro perdem as eleições e mesmo antes dos votos já gritam que houve fraude. Bolsonaro dá uns grunhidos no mesmo sentido. A única diferença com Adalberto da Costa Júnior, Chivukuvuku ou Filomeno é que ele olha para o céu e diz que deus está acima de tudo.
Bolsonaro preparou as suas tropas, durante meses, para partirem tudo se ele perdesse a eleição presidencial. A UNITA fez exactamente a mesma coisa. São marionetas forjadas na mesma oficina, pelos mesmos manipuladores. Bonecos articulados, falantes, mas vazios de valores democráticos. Bolsonaro está cheio de deus, Adalberto repleto de Savimbi, alma gémea do diabo. Duas faces da mesma moeda, com o devido respeito aos crentes. Estou a seguir o guião do livro “Poemas de Deus e do Diabo” do inigualável poeta português José Régio, que escreveu estas palavras espantosas (cito de memória): E eu que nunca princípio nem acabo, nasci do amor existente entre Deus e o Diabo”.
Mal ele sabia que do mesmo amor nasceram seres humanos repugnantes que em nome do Criador fazem tudo para matar, destruir, espezinhar, domar a liberdade à sua imagem e matar a liberdade dos outros. Quem não é por mim, é contra mim. Bolsonaro acha que manifestações nas ruas e praças do Brasil exigindo um golpe militar é democrático. Adalberto e seus parceiros da frente da porcaria unida também pensam que fazer cair o poder na rua, é legítimo. E quem contrariar os seus intentos, está a atentar contra o regime democrático.
Bolsonaro até hoje não reconheceu a derrota eleitoral nem felicitou o vencedor. Mas já assinou com o seu partido um acordo que lhe garante um salário milionário, casa, e apoio jurídico de valor ilimitado, para enfrentar os mais de 50 processos que correm contra ele na Justiça e só esperam que perca a imunidade devida ao cargo de Presidente da República.
Neste aspecto, os sicários da UNITA estão bem melhor. Quando a organização nasceu em 1966, o governo colonialista e fascista de Lisboa garantia toda a protecção a Jonas Savimbi. Uma vez derrotada a guerrilha do MPLA, ele era nomeado governador do distrito do Moxico. Quando os colonos se conformassem com a nomeação de um preto, ia mesmo a governador-geral. Os sicários da UNITA comiam e bebiam do bom e do melhor. Quando Savimbi estava doente, era tratado no hospital militar do Luena (Luso).
Depois a UNITA alugou as armas ao regime racista de Pretória. O estado terrorista mais perigoso do mundo (EUA) ajudou os nazis a criarem o acampamento da Jamba, que rapidamente se transformou num entreposto dos negócios da droga, diamantes e marfim. Dinheiro em sangue! Uma ala do Hospital de Pretória foi reservada, pelos serviços secretos, ao pessoal da UNITA. Foi nessa ala que trataram o filho do Mário Soares quando partiu a cornadura no desastre de avião na Jamba. Às vezes o tráfico de diamantes dá para o torto.
O Presidente José Eduardo dos Santos, em nome da paz e reconciliação nacional, amnistiou todos os sicários da UNITA, mesmo aqueles que tinham cometido terríveis crimes de guerra. Permitiu que uma seita de fanáticos fosse transformada em partido político. E como todas as seitas, a do Galo Negro considera-se acima de tudo e de todos. Excepto de Savimbi. Só deixarão de invocar fraude eleitoral quando tomarem o poder. Depois, adeus eleições. Vão fazer do edifício da Assembleia Nacional, o memorial de Jonas Savimbi. E vai ser obrigatório que todos os cidadãos lhe rendam homenagem, pelo menos uma vez por ano. Quem não ajoelhar, vai para fogueira.
As pessoas mais crédulas dizem que a UNITA hoje é diferente. Já nada tem a ver com os tempos em que alinhou com os colonialistas portugueses e os racistas de Pretória. Com os bandoleiros que apontaram as suas armas à democracia, quando perderam as eleições. Já nada tem a ver com os bandidos de delito comum que entre 1992 e 2002 cometeram crimes gravíssimos contra o Povo Angolano. Puro engano de alma. Hoje a UNITA é mil vezes pior. Os seus dirigentes são ainda mais fanáticos. Estão mais frustrados. Querem mais dinheiro. Estão mais sedentos de sangue. Sonham com mais destruições. Por isso não hesitaram em mobilizar as quadrilhas organizadas nas grandes cidades, contra a democracia.
Bolsonaro apostou tudo na mentira e na falsificação da informação. A UNITA faz exactamente a mesma coisa. Vou dar um exemplo. Uma delegação parlamentar angolana visitou Moçambique. A deputada Webba, quando regressou a Luanda, contou que a FRELIMO e a RENAMO acordaram atribuir ao maior partido da oposição o lugar de segundo vice-presidente do Parlamento: “O MPLA não respeita as regras, não deu à UNITA a segunda vice-presidência da Assembleia Nacional”. Esta é jurista. Sabe o que diz, não é apenas uma fanática das fogueiras da Jamba. Mas não hesita em mentir e manipular. Como a FRELIMO fez um acordo, ele passou a ser “as regras”. Mentem descaradamente.
A UNITA não respeita o Poder Judicial e está permanentemente a violar o princípio da separação de poderes. Esta direcção política do Galo Negro é melhor do que as anteriores? Perigosa ilusão. É mil vezes pior. Porque em 1966, em 1975 e em 1992, imperava entre os dirigentes do Galo Negro a boçalidade, a ignorância, a traição pura e dura. Hoje manda e comanda o instinto assassino o ódio, o espírito de vingança. E a maioria das e dos dirigentes tem formação. Já não são os ignorantes do passado. Querem muito ser criminosos. E praticam!
Hoje a TPA mostrou-nos o cemitério municipal do Luena. Um capinzal cheio de mandioqueiras. Túmulos arrasados. Abandono e desleixo. Mas o tema da reportagem não foi o desmazelo das autoridades. Anda um grupo organizado a profanar os túmulos e a roubar ossadas. Sabem quem começou esse negócio macabro? Um tal Francisco Queiroz. Às tantas, os “restos mortais” (há restos imortais?) dos assassinos golpistas de 27 de Maio de 1977 foram compradas no Luena e vendidas aos familiares como autênticas. Grande negociata.
Na Rua dos Mercadores, ao lado do Hotel Luanda, existia um antiquário. Entre o material em exposição tinha dos crânios, um pequenino e outro grande. Mas não estavam à venda. Um dia perguntei-lhe porquê. E ele disse-me que eram relíquias! O crânio pequenino era da Rainha Jinga ainda criança e o grande, já mulher! O Francisco Queiroz aprendeu com esse artista!
*Jornalista
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