quarta-feira, 7 de setembro de 2022

A estrutura Rússia-Índia-China (RIC) é a chave para o século asiático

Andrew Korybko* | One World

A Rússia pretende desempenhar um papel de liderança na facilitação do desejo compartilhado recentemente reafirmado de seus parceiros multipolares igualmente estratégicos das Grandes Potências de serem pioneiros em conjunto no Século Asiático.

*Traduzido em português do Brasil

O embaixador russo na Índia, Denis Alipov, descreveu a estrutura Rússia-Índia-China (RIC) como tendo “potencial incrível” na transição sistêmica global para a multipolaridade durante uma recente entrevista à mídia de seu anfitrião, acrescentando que “certamente, para a Rússia, este é um formato prioritário, que, acreditamos, poderia apoiar a promoção de um diálogo construtivo entre Nova Délhi e Pequim”. Ele indiretamente a contrastou com as estruturas regionais lideradas pelos americanos, observando que “[RIC] é obviamente uma abordagem muito diferente contra a política de algumas outras potências, que propositalmente abusam das divergências entre a Índia e a China em seus jogos geopolíticos”.

Sem dúvida, a Rússia pretende desempenhar um papel de liderança na facilitação do desejo compartilhado recentemente reafirmado de seus parceiros multipolares da Grande Potência, igualmente estratégicos, de serem pioneiros em conjunto no Século Asiático . Esse resultado é absolutamente crucial para garantir de forma sustentável o sucesso da transição sistêmica global para a multipolaridade, eliminando simultaneamente a chance de terceiros hostis, como os EUA, explorarem suas disputas preexistentes para fins de dividir para governar, além de incentivar a convergência abrangente do jogo desses dois. -alterando o potencial econômico. O RIC é a chave natural para concretizar esse futuro previsto, uma vez que já fornece uma plataforma para o diálogo construtivo entre a China e a Índia, como foi dito.

O presidente Putin sugeriu anteriormente que a estratégia da Rússia na Ásia-Pacífico é criar instituições multipolares por meio de meios econômicos que possam, por sua vez, acelerar a transição sistêmica global, de modo que o RIC é a base sobre a qual todo o resto será construído. China e Índia são mais do que capazes de resolver bilateralmente suas disputas delicadas entre si sobre fronteiras, comércio e outras questões, mas é útil para eles saberem que seu parceiro estratégico russo compartilhado está sempre pronto para ajudá-los em cada passo do caminho se solicitado a fazê-lo e se isso for acordado por ambas as partes. Este é especialmente o caso se as tensões militares aumentarem inesperadamente no futuro próximo por qualquer motivo e independentemente de quem seja o culpado.

Nesse cenário de pior caso, um ou outro pode solicitar os serviços diplomáticos da Rússia caso seus respectivos representantes não se sintam tão à vontade para interagir com seus homólogos e/ou apresentar não oficialmente certas propostas de resolução de conflitos. Moscou poderia, portanto, mediar entre eles ou pelo menos encorajar seus meios de comunicação internacionais financiados publicamente a discutir qualquer que seja a proposta acima mencionada, a fim de aumentar a conscientização sobre ela e “testar as águas” com cada um de seus parceiros, particularmente no que diz respeito à sua comunidade especializada e a sociedade. Este é um papel único que esperamos que nunca tenha que ser desempenhado, mas que apenas a Rússia poderia cumprir, se necessário.

Além da dimensão diplomático-militar, o RIC também é extremamente importante quando se trata de fortalecer a cooperação econômica multilateral. Não só é relevante em termos de fazê-lo trilateralmente entre cada uma dessas Grandes Potências, mas também possivelmente em investimentos pioneiros liderados por RIC em terceiros países como Afeganistão , Etiópia e Mianmar , todos os três afetados por vários conflitos e exigem reabilitação socioeconômica em todo o seu território, como o Afeganistão, ou apenas em algumas partes, como a Etiópia e Mianmar. Ao combinar seus conhecimentos pertinentes e reunir seus recursos financeiros, a RIC pode fazer uma diferença significativa na melhoria da vida de seus funcionários.  

Com base na proposta de projetos socioeconômicos liderados pelo RIC em terceiros, essas três grandes potências multipolares também podem trabalhar juntas na ONU para bloquear os esquemas de intromissão do Ocidente liderados pelos EUA (que incluem ameaças militares e de sanções), bem como empurrar apresentar suas próprias propostas para ajudar esses países em plena conformidade com o direito internacional. Quanto mais a China e a Índia cooperarem em questões de interesse comum, tanto bilateralmente quanto no exterior, maior será sua confiança mútua. Mais uma vez, eles já podem fazer isso por conta própria sem que ninguém mais incentive isso, mas é sempre útil saber que a Rússia está disponível para ajudar, se solicitado. Além disso, seu envolvimento em projetos estrangeiros é um ativo.

Afinal, o século asiático não implica que grandes potências daquele continente, como China e Índia, substituirão as ocidentais, como os EUA, na forja de sua própria forma de unipolaridade. Em vez disso, tudo a que se refere é que o centro de gravidade geoestratégica está mudando para a Ásia, o que naturalmente resultará em seus países desempenhando um papel maior nos assuntos globais. Nenhum deles aspira à dominação ou a criar blocos fechados que excluam quaisquer outros, por isso a parceria igualitária da Rússia com eles através do RIC sinaliza poderosamente suas intenções verdadeiramente multipolares e, portanto, deve formar a base institucional do século asiático.

*Andrew Korybko - analista político americano

SERVOS FAMINTOS OU CADÁVERES - a escolha à vista dos europeus

Cartoonista grego ganha World Press Cartoon com sátira sobre resgate europeu – 2013. Continua tudo na mesma ou ainda pior com a pandemia mal gerida e com avultadas despesas, incompetências e péssimas consequências por uma guerra que é dos EUA contra a Rússia usando a Ucrânia e a UE como aríete e carne para canhão. Com tão maus líderes europeus o que resta é sermos servos do império dos EUA e enterrarmo-nos. A escolha à vista é entre ser servos famintos ou cadáveres.

A EUROPA DESCOBRE-SE SEM RUMO E SEM LÍDERES

Envolvido pelos EUA na guerra e incapaz de agir com autonomia, continente enfrenta crise energética, pobreza e inflação. Scholz, Macron e Draghi perderam-se. Crise de liderança abre espaço perigoso para ascensão da ultradireita

Maria G. Zornoza, no Público - es | Outras Palavras | Tradução: Maurício Ayer

Olaf Scholz afunda nas pesquisas. Emmanuel Macron está enfraquecido após as últimas eleições legislativas. Mario Draghi renunciou. Os escândalos de Boris Johnson o forçaram a recuar. Pedro Sánchez enfrentará eleições no próximo ano. E desde o início de seu mandato, Joe Biden se vê abatido por uma profunda falta de popularidade. O Ocidente enfrenta uma crise de liderança.

Como pano de fundo, a Europa vive um dos seus momentos mais complicados desde o fim da Guerra Fria. Com 8,9%, a Zona do Euro registrou uma taxa de inflação recorde em julho. A crise energética se agrava. Recentemente, a Rússia anunciou o terceiro corte no fornecimento de gás nas últimas semanas, que começará em 31 de agosto. E, nesse cenário, a guerra na Ucrânia completará em breve seus primeiros seis meses, sem nenhum sinal de uma conclusão à vista.

O vácuo de liderança entre os aliados transatlânticos já se fazia sentir às vésperas do início da invasão russa da Ucrânia. Na Alemanha, a saída da histórica chanceler alemã Angela Merkel deu lugar a um opaco Olaf Scholz. Em 24 de fevereiro, Macron estava a dois meses das eleições presidenciais em seu país, que acabou vencendo contra a extrema direita. A OTAN cochilava em busca do sentido da vida. E os Estados Unidos ainda arrastavam a crise de reputação e credibilidade após o desastre no Iraque e a retirada do Afeganistão.

Macron é o presidente ocidental que mais conversou com o inquilino do Kremlin desde o início da disputa. Ele é um dos poucos que mantêm a linha telefônica aberta. Ambos apoiaram recentemente a necessidade de enviar uma missão da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) à usina ucraniana de Zaporizhia, a maior da Europa e sob controle do exército russo.

Mas o principal interlocutor da Rússia para negociar qualquer aspecto da guerra continuam sendo os Estados Unidos. Apenas quatro dias antes de a Rússia invadir seu vizinho ucraniano e com os tambores da guerra batendo alto, Macron tentou em uma conversa telefônica com Putin acertar uma reunião entre o presidente russo e Joe Biden em Genebra. “Para ser sincero, eu ia jogar hóquei no gelo, estou falando com você do ginásio onde vou começar meus exercícios físicos. Primeiro vou consultar os meus assessores”, respondeu Putin, em conversa registrada pelo Washington Post.

A linha direta do Eliseu com o Kremlin gerou desconforto na Ucrânia e entre os países orientais e bálticos, que apostam no máximo isolamento de Putin. E zero diálogo. Durante a guerra, o eixo franco-alemão não desfrutou de sua tradicional influência e liderança na mesa do Conselho Europeu. E a situação de fraqueza é especialmente notável em Berlim.

Alemanha é talvez o país mais exposto à atual crise energética e à potencial crise econômica. Durante a última década, a locomotiva alemã apostou boa parte de sua demanda energética em hidrocarbonetos russos. E agora deve enfrentar o duplo desafio de reconhecer seus erros e a falta de uma estratégia de longo prazo e lidar com os cortes intermitentes de gás orquestrados pela gigante estatal Gazprom.

A posição do chanceler também é enfraquecida pelos diferentes postulados entre seus parceiros de coalizão, Verdes e Liberais, que têm criticado muito o posicionamento inicial “morno” do presidente no que se refere ao envio de armas à Ucrânia. Nos últimos dias, Scholz foi atingido por um escândalo por possível favorecimento a uma instituição financeira quando era prefeito de Hamburgo.

Brasil | A INDEPENDÊNCIA INACABADA - segundo Celso Furtado

200 anos depois, falta de autonomia cultural e profunda dependência bloquearam reflexão criativa e geraram projeto incompleto de país, afiança pesquisador da obra do economista. Analisá-la é crucial para construir um Brasil soberano

Roberto Pereira Silva em entrevista a João Vitor Santos, no IHU Online | em Outras Palavras

Tem gente que não gosta de fazer aniversário, talvez porque inevitavelmente esse completar de mais um giro da Terra nos joga diretamente na seara dos pensamentos sobre o nosso passado. Quando falamos de uma nação, ou até de um país, chovem análises sobre o nosso passado, sobre o que somos hoje e o que, quem sabe, muito provavelmente, haveremos de ser no futuro. Ao invés de se render a essas elocubração, que quase caem na cilada do presentismo, o professor Roberto Pereira Silva faz um movimento distinto ao revisitar o pensamento de Celso Furtado justamente acerca da Independência do Brasil. “Para Celso Furtado, a Independência do Brasil é um evento fundamental, mas que deve ser compreendido em um quadro mais amplo de modificações políticas que marcaram o final do século XVIII e o início do século XIX”, adianta.

Na entrevista a seguir, concedida por e-mail ao Instituto Humanitas Unisinos – IHU, Silva detalha que Furtado compreende que “a Independência foi feita com uma sociedade polarizada entre grandes proprietários de terras e escravos”. O professor observa, ainda, que Celso Furtado via a independência do Brasil como um projeto inacabado, pois faltava uma autonomia, aquela capaz de ler o mundo, mas aplicando em suas terras somente aquilo que realmente servisse à sua realidade. “Talvez a maior lição da obra de Furtado seja essa de colocar a explicação do Brasil e do subdesenvolvimento como o principal critério de verificação de qualquer teoria. Se ela não explica a realidade, é a teoria que deve ser alterada, modificada, repensada”, reflete. E acrescenta: “a expansão do neoliberalismo no final do século XX fez com que Furtado reforçasse ainda mais a questão da soberania e da autonomia nacional. (…) A perda de autonomia sempre foi vista como um grande prejuízo para o Brasil”.

A partir disso, podemos compreender a centralidade da realidade das agruras de um nordeste ressequido e carcomido pelos interesses daqueles que só pensam na expropriação. “E Furtado não falava disso apenas em termos de decisões econômicas e políticas. A perda de autonomia cultural, ou seja, a imitação dos padrões de consumo e de pensamento criados nos centros do capitalismo iam dificultando cada vez mais as formas de reflexão criativa para sair da crise econômica”, acrescenta.

Quem sabe, como provoca Silva, não possamos voltar a Furtado para realmente repensar um projeto de nação independente e autônoma. Afinal, na década de 1960 ele já via como inegociável “a democracia e o projeto de desenvolvimento com distribuição de renda”. “Acredito que Celso Furtado não desistiria de propor caminhos e soluções, pois a sua convicção na possibilidade da ação planejada e no papel do Estado para corrigir essas distorções é uma das ideias que moviam seu pensamento e sua ação”, sintetiza o professor Silva, pensando o Brasil de hoje à luz de Celso Furtado.

Roberto Pereira Silva é professor do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas e do programa de pós-graduação em economia da Universidade Federal de Alfenas. Graduado em História pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo – USP, também é mestre em História Econômica pelo Programa de Pós-Graduação em Economia do Desenvolvimento do Instituto de Economia da Universidade de Campinas e doutor pelo programa de História Econômica da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP.

É autor de O jovem Celso Furtado: história, política e economia (1941–1948) (Edusc, 2011).

Juntamente com Alexandre Freitas Barbosa e Alexandre Macchione Saes, é autor do artigo Celso Furtado e a (In) dependência do Brasil. O texto integra o livro Independência do Brasil – a história que não terminou (Boitempo, 2022), organizado por Antonio Carlos Mazzeo e Luiz Bernardo Pericás.

Marcelo no Brasil para comemorar a independência do país e atirar pérolas ao porco

Marcelo conta história de D. Pedro a Bolsonaro em encontro de 20 minutos

PR português garantiu que na reunião com o seu homólogo não se falou de política nem das eleições presidenciais do Brasil marcadas para outubro.

O chefe de Estado português, Marcelo Rebelo de Sousa, afirmou esta terça-feira que aproveitou um encontro com o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, de cerca de 20 minutos, para contar a história da vida de D. Pedro.

Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, a reunião bilateral, que decorreu no Palácio Itamaraty, em Brasília, "correu muito bem, à medida dos 200 anos de História do Brasil", e não se falou da campanha para a Presidência da República do Brasil.

"Eu aproveitei para contar a história de D. Pedro, a vida de D. Pedro. Isso foi um grande ponto de partida", declarou aos jornalistas.

Depois da reunião com Bolsonaro, o Presidente português visitou no Itamaraty o espaço onde está exposto o coração de D. Pedro I do Brasil e IV de Portugal, conservado em formol e guardado numa cápsula de vidro, que foi trazido de Portugal para as comemorações do bicentenário da independência do Brasil.

A seguir, antes de deixar o Palácio Itamaraty, sede do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, Marcelo Rebelo de Sousa prestou declarações à comunicação social.

O Presidente português referiu ter contado a Bolsonaro que D. Pedro, "com menos de 35 anos tinha nascido e morrido no mesmo quarto do Palácio de Queluz, atravessado o Atlântico mais de uma vez, sido imperador do Brasil, sido rei de Portugal, vencido uma guerra civil e depois, com o trono nas mãos de sua filha, morrendo de tuberculose, logo a seguir a essa vitória".

De acordo com Marcelo Rebelo de Sousa, no encontrou falou-se sobre "como o Brasil se foi afirmando ao longo dos 200 anos e a projeção hoje".

"E falei obviamente, tinha de falar, do peso dos brasileiros em Portugal, que vão a caminho dos 250 mil -- o que, para 10 milhões de habitantes, é um peso muito apreciável", acrescentou.

Questionado se não conversaram acerca da campanha eleitoral em curso no Brasil, à qual são candidatos, entre outros, Jair Bolsonaro e Lula da Silva, o chefe de Estado português respondeu: "Não, não se falou. Estava ali um Presidente da República com outro Presidente da República e, portanto, não se ia falar de problemas internos nem de um Estado nem do outro".

Brasil | O GRITO DO IPIRANGA

Ana Paula Laborinho* | Diário de Notícias | opinião

Tem sido muito destacado, por pouco habitual, também ser celebrado em Portugal o Bicentenário da Independência do Brasil. A data simbólica de 7 de setembro em que D. Pedro rompe as relações de subordinação com Portugal e grita nas margens do Ipiranga "Independência ou Morte!", permitiu, ao longo destes dois séculos, a visão romantizada do país colonizador que liberta a sua colónia. Decerto um dos melhores resultados destas comemorações tem sido a profusão de encontros científicos e publicações (livros, artigos, nomeadamente dirigidos ao grande público) que mostram a complexidade desse processo.

Ao longo destes 200 anos, vários movimentos migratórios têm levado e trazido comunidades que serviram para aproximar os dois países que (não será exagerado dizer) ainda se conhecem mal. De um lado e doutro, sobrevivem muitos estereótipos com a sua melhor expressão no anedotário vulgarizado. A língua portuguesa continua a ser considerada o traço de união mais permanente, embora com as diferenças que umas vezes são empoladas e outras ignoradas.

A chegada das telenovelas brasileiras a Portugal trouxe consigo um contacto com vocabulário e sotaques que, na altura, foram rapidamente assimilados. Muito desse vocabulário era, afinal, o regresso de palavras do português antigo que outras influências ou o caminho das palavras fizeram desaparecer ou substituir por distintos termos. Esquecemos que as línguas são corpos vivos que se transformam, embora seja necessário ter uma perspetiva longa para dar conta dessas mudanças. Se o português evoluiu do latim, começando por ser uma língua oral e absorvendo influências como o árabe, o português do Brasil cruzou-se com outras línguas como o tupinambá, o iorubá, mas também o espanhol, o francês e outros idiomas ao sabor da história.

Pedro I do Brasil ou Pedro IV de Portugal, apelidado de "o Libertador" e "o Rei Soldado", foi o primeiro Imperador do Brasil como Pedro I de 1822 até sua abdicação em 1831, e também Rei de Portugal e Algarves como Pedro IV entre março e maio de 1826. -- Saiba mais em Wikipédia

Reconheço que o grande objetivo do Acordo Ortográfico de 1990 não foi alcançado: criar uma base ortográfica comum a todos os países de língua oficial portuguesa que permitisse, por exemplo, maior circulação do livro e de todos os produtos escritos, mas também contribuísse para a criação de um espaço de conhecimento comum, facilitando a mobilidade de estudantes e professores.

Lindley Cintra (1925-1991), um dos maiores linguistas portugueses, que colaborou ativamente na elaboração das bases desse acordo, publicou no semanário Expresso, em 28 de junho de 1986, um artigo em que expõe as razões para que, segundo ele, "deve considerar-se indispensável e urgente que se chegue a um verdadeiro e eficaz acordo sobre tal matéria ainda que, para isso, haja que sacrificar preconceitos e hábitos há muito adquiridos [...]". O resto da história já a conhecemos.

Os preconceitos e hábitos há muito adquiridos têm levado a uma clivagem cada vez maior entre a variante do Brasil e de Portugal, de que poderíamos dar muitos exemplos, desde logo ao nível da circulação de edições de um país e de outro por razões da diferença de variantes. Talvez o exemplo mais chocante seja a exigência por parte de universidades portuguesas (não sei se acontece no Brasil) de que os estudantes dos países de língua oficial portuguesa utilizem nos seus trabalhos a variante de Portugal. É frequente também ouvir comentários dirigidos a brasileiros como "Fala tão bem, nem quase tem sotaque".

Uma das maiores riquezas da nossa língua é a sua diversidade que resulta de uma história espalhada por várias geografias, cruzando-se, por isso, com diferentes culturas e outras línguas. No ano em que celebramos o Bicentenário da Independência do Brasil, falta saltar muitos muros e não esquecer que o português é uma grande língua - a tal de 260 milhões de falantes - porque 210 milhões estão na América Latina. E muitos de nós (incluindo os nossos filhos) imitamos o sotaque brasileiro para conseguir um bom desempenho de assistentes de voz como a Siri ou a Alexa.

*Diretora em Portugal da Organização de Estados Ibero-Americanos

Portugal | Governo aceita perda de poder de compra ao manter subida dos preços

Limitadas e insuficientes, as medidas apresentadas pelo Executivo não travam a escalada da inflação porque não interrompem a subida dos preços, mas protegem os interesses dos grandes grupos económicos.

Chegou a ser descrito como «pacotão», mas o que se percebe do conjunto de medidas anunciadas esta segunda-feira por António Costa é, mais uma vez, a falta de vontade política para uma resposta estrutural aos problemas com que os portugueses estão confrontados e, novamente também, a intenção de deixar a salvo os interesses dos grandes grupos económicos ao não intervir, por exemplo, na fixação dos preços, medida que poderia dar alguma estabilidade aos bolsos das famílias. 

Ao contrário do que afirmou esta manhã o ministro das Finanças, o programa definido não só está longe de ser «eficaz» na resposta, tendo em conta que é curto e concentrado no tempo, como se revela prejudicial para os pensionistas, ao comprometer o rendimento destes a longo prazo. 

Segundo o que foi aprovado ontem em Conselho de Ministros, no próximo mês os pensionistas (que recebem até 5318,4 euros mensais) vão receber uma prestação única equivalente a meia pensão, juntamente com o valor da prestação mensal. Mas este bónus acaba por não o ser, já que o Governo adianta aos pensionistas uma parte do valor que deveriam receber em 2023 pela actualização automática das pensões, prevista na lei. 

Nos meses de Novembro e Dezembro, e não obstante não se perspectivar uma alteração favorável da inflação, o valor das pensões voltará a ser o de Setembro. Entretanto, a partir de Janeiro do próximo ano, em vez do mecanismo de actualização automática previsto na lei, que, a ser aplicado, ditaria aumentos entre os 7,1% e os 8%, o Executivo propõem-se realizar aumentos que ficam apenas entre 3,53% e 4,43%, ou seja, praticamente metade, não acolhendo o valor da inflação em 2023.

Tendo em conta esta alteração, e assumindo que não haverá outras, a partir de 2024 os pensionistas irão receber menos do que receberiam se o Governo de António Costa não tivesse avançado com este «bónus». 

EXISTE CORRUPÇÃO EM PORTUGAL. O QUE NÃO EXISTE É JUSTIÇA

Numa breve pesquisa sobre a corrupção em Portugal, assim como branqueamento de capitais, encontramos um manancial de referências que, a saber, dão em nada. O que vem provar que existe corrupção e crimes de índole económico-financeira mas o que está demonstrado é que não existe Justiça. Por curiosidade acrescente-se que “curiosamente” ainda há dias deparámos com um título explicito que talvez explique também porque em Portugal vimos a impunidade daqueles crimes passarem para a prateleira dos impunes. Dizem os que sabem mas que não especificam nem se atrevem a ‘chamar os bois pelos nomes’: Um em cada quatro magistrados diz que há juízes corruptos

Há juízes corruptos? Homessa! Ora, ora, nada menos que os portugueses há muito afirmem em conversas informais com base no tradicional ‘diz que disse’. Conversas da má-língua é como lhes chamam e assim justificam a impunidade de criminosos, não indo a fundo na questão. Pois por isso é que não há justiça, como também se diz. E tudo demonstra que é uma insofismável verdade.

A seguir constam alguns "casos", uns mais antigos, outros menos. E na atualidade o que existe? Já não há corruptos nem corrupção? O que existe parece estar atascado na Justiça e assim continuará, pelo sabido. Disponha-se a ler ou a reler o que já sabe mas que continua atual, apesar de demasiados estarem tão caladinhos… Já agora, uma pergunta: Ricardo Salgado continua em liberdade? Pois. (PG)

Corrupção. Processos disparam 42% e casos por resolver batem recorde

Em 2021 entrou na Polícia Judiciária um total de 705 novos inquéritos para investigar suspeitas de corrupção. Representa um aumento de 42% em relação ao ano anterior. Nos últimos cinco anos (2017/2021) agravou-se em 48% o número de processos pendentes.

Há cada vez mais casos de corrupção por resolver na Polícia Judiciária (PJ). De acordo com as estatísticas da Direção-Geral de Políticas de Justiça (DGPJ), que já incluem os dados de 2021, neste ano foi batido o recorde com 909 inquéritos pendentes, o que representa um aumento de 15% em relação ao ano anterior e de 48% comparando com 2017.

No ano passado deram entrada nesta polícia 705 novos processos de suspeitas de corrupção, um recrudescimento, também sem precedentes, de 42% em relação ao ano anterior.

Nos últimos cinco anos, os novos processos tinham vindo a revelar uma tendência de diminuição - depois de uma subida de 38% de 2017 para 2021, nos anos seguintes registou-se uma inversão - que volta agora a ser contrariada.

Estes valores incluem a corrupção ativa - "quem, por si ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, der ou prometer a funcionário (público), ou a terceiro por indicação ou com conhecimento daquele, vantagem patrimonial ou não patrimonial" - e corrupção passiva - "o funcionário que por si, ou por interposta pessoa, com o seu consentimento ou ratificação, solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, vantagem patrimonial ou não patrimonial, ou a sua promessa, para a prática de um qualquer ato ou omissão contrários aos deveres do cargo".

As explicações para o sucedido só deverão ser tornadas públicas e interpretadas na apresentação do Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) relativo ao ano de 2021, que deverá ocorrer no final do mês, mas fontes judiciais avançaram ao DN a sua tese preliminar.

"Terá a ver com duas razões essencialmente: a primeira, deve-se a uma muito maior mediatização da corrupção e sensibilização da sociedade, o que dá origem, inevitavelmente, a um maior nível de alerta e denúncias das pessoas; a segunda é que tudo isso gera uma maior confiança nas instituições, nomeadamente na PJ, para as investigar", sublinha uma dessas fontes.

Quanto ao aumento do número de inquéritos por concluir, a resposta é imediata: "apesar de algumas melhorias nos últimos dois anos, os recursos estão ainda muito aquém das necessidades, quer tecnológicos, quer investigadores e peritos, para dar conta mais rapidamente das investigações".

Branqueamento de capitais sobe 52%

Em 2021 a PJ abriu um total de 44 565 inquéritos, segundo ainda os números oficiais do Ministério da Justiça, uma ligeira subida (0,2%) em relação a 2020.

No total dos processos por findar em 2021 registou-se uma diminuição de 0,5%, no entanto, comparativamente a 2017 houve um agravamento de mais 29,4%.

Um dos crimes relacionados com a corrupção que mais se avultou foi o de branqueamento de capitais, na categoria da criminalidade contra o Estado: 658 novos inquéritos em 2021, mais 48% , mais 471% (cinco vezes mais) do que em 2017 (115).

Esta subida teve, está claro, efeitos também nos casos pendentes, que aumentaram 52% de 2020 para 2021 .

um balanço de 10 anos sobre a resposta da Justiça no combate à corrupção, o DN concluiu que entre 2010 e 2019 entraram na PJ 4806 processos de corrupção para investigar, representando um aumento de 63% entre o primeiro e o segundo quinquénio.

Nesta década, que atravessou mandatos de três procuradores-gerais da República, Pinto Monteiro, Joana Marques Vidal e a atual Lucília Gago - foram constituídos 1167 arguidos, dos quais foram condenados 609 (52%), dos quais 60 a prisão efetiva 9,8%). O tempo médio de uma investigação destes casos (inquéritos abertos após 1/1/2011 e fechados antes de 1/1/2021) foi de 18 meses.

Corrupção política ignorada

O último relatório de perceção da corrupção relativo a 2021, produzido pela Transparency International (TI), aponta "falhas no combate à corrupção em Portugal, nomeadamente na Estratégia Nacional de Combate à Corrupção, por deixar de fora do seu âmbito os gabinetes dos principais órgãos políticos e de todos os órgãos de soberania e, também, o Banco de Portugal".

Os representantes nacionais da TI alertam que essa Estratégia, aprovada na anterior legislatura, "ignora, quase por completo, a questão da corrupção política". Portugal subiu um ponto (para 62) mo índice de perceção da corrupção - na escala de 0 (muito corrupto) a 100 (país visto como muito transparente) - abaixo ainda da média europeia (64).

A TI Portugal sublinha que Portugal é um dos países "em que não se registaram evoluções significativas na última década e desde 2012 que regista variações anuais mínimas".

Numa altura em está previsto Portugal receber quase 15 mil milhões de subvenções do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) da União Europeia (UE) é importante também olhar para os casos de fraude na obtenção de subsídios em investigação na PJ.

Em 2021 foram instaurados 116 novos inquéritos por fraude na obtenção de subsídio (uma subida de 33% em relação a 2020), estando por resolver no final do ano passado, 205 processos - mais 19,6%.

O Ministério Público já alertou que a estrutura de missão do PRR não tem meios para evitar fraudes e corrupção na atribuição dos subsídios.

Um relatório a que a SIC teve acesso, os representantes da Procuradoria-Geral da República na comissão de acompanhamento do plano, dizem que a estrutura de missão "não garantiu certos procedimentos relevantes, como sejam a validação da ausência de conflito de interesses e mitigação dos riscos de fraude e de corrupção".

Mais meios para a PJ?

Por seu lado, nas suas mais recente intervenções públicas onde se referiu à corrupção, o Diretor Nacional da PJ tem demonstrado estar convicto de um reforço de meios na sua polícia.

"Se os meios que nós pretendemos, quer do ponto de vista de inspetores, quer de meios especializados tecnológicos - esses já estão decididos, estão em curso -, vierem a ser disponibilizados tal qual nós esperamos, a criminalidade económico-financeira e a corrupção terá a maior afetação de meios que jamais alguma vez teve", sublinhou na cerimónia do 76º aniversário, em outubro de 2021.

Em março último, na tomada de posse de 101 novos inspetores, anunciou que 60% dos mesmos seriam colocados combate à corrupção, criminalidade económico-financeira e cibercrime.

Avançou ainda que as suas expectativas de que o reforço de meios já concretizado, a que deve acrescer mais 170 inspetores, 100 dos quais já em setembro, num total de 300 novos inspetores nos últimos anos, permita que a estratégia de combate à corrupção do Governo "possa efetivamente ter concretização e que tenha resultados".

No orçamento de Estado para 2022 proposto pelo governo e aprovado na generalidade, contudo, não está prevista a abertura de novos concursos para a PJ.

Na altura em que este artigo era escrito, havia apenas uma proposta no site do parlamento a concretizar um aumento de verbas para a PJ: do BE, para reforçar em 2,5 milhões a verba atribuída "para apetrechamento dos seus meios tecnológicos, designadamente de combate ao cibercrime, manutenção de sistemas críticos, e renovação da sua frota automóvel".

Marcelo apela a "nova fase"

O combate à corrupção tem marcado nos últimos anos os discursos públicos dos mais altos responsáveis do país.

Ainda na recente cerimónia de abertura do ano judicial, o Presidente da República voltou a destacar o tema, apelando a que se abrisse "uma nova fase" no combate à corrupção em Portugal, considerando que a opinião pública exige urgência nesta matéria, e a que se reafirme os princípios democráticos.

"Podemos, se quisermos, tentar abrir uma nova fase em que a vontade de combater essa chaga não só permita multiplicar investigações -- o que já começou a ocorrer no passado recente -- como converter esperas de década, década e meia, duas décadas até uma decisão final num tempo muitíssimo mais razoável em democracia", afirmou Marcelo Rebelo de Sousa.

O chefe de Estado considerou que "a justiça relacionada com o combate à corrupção ganha aos olhos da opinião pública uma ainda maior urgência coletiva e uma ainda maior dramatização, mais acentuada ainda na opinião publicada".

"Como responder a essa sensação de mal estar social de convicção de que a corrupção continuaria a estar imparável e de que quase tudo e quase todos sucumbiriam às suas tentações: políticos, funcionários, magistrados, grupos empresariais, entidades associativas, cidadãos?", questionou, dando a resposta: "Em tempos como este cumpre manter cabeça fria e serena e agir consistentemente".

"Há erros de perceção a esclarecer, com rigor e clareza? Que se esclareça", acrescentou.

Sobem crimes informáticos

A criminalidade informática (acesso indevido, sabotagem, falsidade) também se encontra na categoria dos crimes que mais subiram nos últimos cinco anos e, com isso, um agravamento no número de inquéritos que continuam por resolver.

De acordo com as estatísticas da DGPJ, foram abertos em 2021 um total de 2551 novos inquéritos, mais 55% do que em 2017.

As burlas informáticas subiram 2,5 vezes nos últimos cinco anos (+147%). Em 2021 foram instaurados 18 189 inquéritos, contra 7373 em 2017

As pendências subiram também 51%, estando por concluir a no final de 2021, 2297 processos.

Além destes processos, as burlas informáticas tiveram uma das maiores subidas do quinquénio: de 7373 processos abertos em 2017, passaram para 18 189 em 2021 - mais 146%. Por resolver estão 11 034, contra 4033 em 2017 , quase três vezes mais.

Diário de Notícias

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