Joana Petiz | Diário de Notícias | opinião
Um ano difícil para os procuradores e a ministra sob os holofotes, com os casos Sócrates e Salgado na agenda." Eram os processos quentes que chegavam a tribunal naquele que o DN titulava como O Ano da Justiça. A edição datava de 2016 e já se antecipava que o caso que envolve o antigo primeiro-ministro, investigado desde 2013 por corrupção, fraude fiscal e branqueamento, devia "arrastar-se mais um ano até julgamento". Para o mesmo ano de 2017 estava marcado o arranque do julgamento (estamos à espera...) dos casos saídos do colapso do grupo Espírito Santo, em 2014. Fast forward até a década seguinte.
Às portas de 2023, são os mesmos casos que "marcam a agenda", mas a esses somam-se outros igualmente de alto perfil, com destacados membros da sociedade sentados no banco dos réus há anos. Juízes, governantes, empresários e gestores que foram acusados de crimes - com a gravidade acrescida decorrente da importância dos cargos que ocupavam. E que continuam sem sentença à vista.
Falta de meios, tribunais entupidos em burocracia, formalidades anacrónicas e recursos intermináveis, plataformas digitais que visam simplificar processos mas não dispensam o papel, falta de especialização em crimes económicos... muitas podem ser as razões apontadas para chegar a uma conclusão antiga: há um problema na justiça. Antes: há enormes problemas na justiça. De custos, limitando aos muito ricos e aos muito pobres o acesso. De burocracia, afastando os portugueses desgastados por sucessivas barreiras. De tempo, que tira eficácia às decisões, quando estas chegam a existir. De injustiça, afinal.
A mera morosidade de qualquer caso - não são só os megaprocessos - impede que se cumpra a finalidade repositiva de direitos, principal objetivo da justiça. Experimente ver quanto tempo demora e quanto gasta em custas, taxas e representação para fazer pagar uma dívida incumprida, por exemplo. Ou para resolver um caso de agressão. Dados do Pordata mostram que por cada 100 casos fechados, quase 130 ficam pendentes nos tribunais.
A este retrato junta-se o traço mais negro de todos, que já vai além da ideia de impunidade dos fortes, enraizando-se na convicção generalizada de que o crime compensa. Ou pelo menos que é relativamente fácil fugir ao castigo.
Quando um em cada quatro magistrados acredita que há juízes envolvidos em esquemas de corrupção, está quase tudo dito.
O autor da maior fraude financeira de todos os tempos, Bernie Maddoff, foi detido em 2008, condenado em 2009 e preso de seguida. É assim tão difícil?
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