Artur Queiroz*, Luanda
Sempre fui um grande estragador mas quando minha Mãe protestava logo demonstrava ser também um grande arranjador. Um dia desmontei, peça a peça, a máquina “hipólito” que trabalhava a pitrol. O arroz na fogueira de lenha demorava três horas a cozinhar. Na “primus” meia hora e já está. Deixou de funcionar, desmontei-a toda, desentupi o canal do combustível, arranjei o “espalhador” das chamas e ficou como nova. Ganhei o estatuto de engenheiro das obras feitas. Grande arranjador.
Sendo um especialista, estou
muito atento a arranjadores e estragadores. São mais do que as dívidas dos
pobres. Um dia destes apareceu um sujeito com ar de sábio anunciando que em
Malange estão a arrancar tudo quanto é pé de liamba. O homem falava
Não percam tempo a arrancar os pés de liamba porque o arbusto é espontâneo e nasce por tudo quanto é sítio, até em cima dos morros de salalé. Entre Malange, Cuanza Norte e a fronteira de Maquela é negro e parece cola. Duas baforadas e o consumidor fica com os pés no ar, bem-disposto e a ver estrelas no céu mesmo de dia. Um charro de média dimensão dá grandes poemas e especulações filosóficas que deixam Protágoras a milhas. O boi do Cuando Cubango é clarinho, mais sólido e meio charro atira-nos para o paraíso sem passar pelo bordel da Dona Mariazinha. Tudo espontâneo. Isso de plantações é conversa de estragadores.
O senhor ministro de Estado para a Coordenação Económica foi apresentado pelo Titular do Poder Executivo como o homem certo para o lugar certo. Hoje teve uma intervenção na TPA que me convenceu. Grande arranjador! O Dr. Massano avisou os estragadores. Não é viável um Estado que importa coxas de frango ao preço de 20 milhões de dólares por mês. O Estado gasta mais 20 milhões de dólares para pagar o açúcar. E 20 milhões de dólares mensais para comprar óleo alimentar.
O meu amigo Maciel (regente agrícola) fez uma fazenda em Quilengues, da Algodoeira Agrícola de Angola, que produzia para o mercado angolano. Grandes plantações de girassol e algodão. A refinaria era na Catumbela. Hoje a fábrica está desmantelada e a fazenda foi engolida pela voracidade da mata. Esses arranjadores abasteciam o mercado angolano de óleo alimentar e ainda sobrava muito produto para exportar. Os estragadores entraram em acção e foi tudo à vida.
A Avicuca produzia carne de frango e ovos em quantidades industriais. A ração era fabricada em Angola com os nossos grãos, desde o massango à massambala. Nada era importado. Mas os frangos iam à mesa dos pobres, remediados e ricos a preços módicos. Nem um bico era importado. Grandes arranjadores. Um engenheiro da Avicuca era nosso amigo e oferecia-nos patas e pescoços. Quando havia excesso de produção também nos dava moelas e fígados. O Joca Luandense fazia muzongué com esses subprodutos. Grande arranjador e cronista.
O açúcar era todo nosso e mais de metade da produção nacional era exportada. Tínhamos uma refinaria na Tentativa (Caxito), outra na Catumbela e uma terceira no Dombe Grande. Milhares de hectares de canaviais. A cana era transportada em pequenos comboios que circulavam nas propriedades. Os sacos de açúcar (100 quilos) eram branquinhos e minha Mãe fazia-nos cuecas com esse pano. Mas também panos de cozinha. Nada se perdia, tudo se aproveitava. Grande arranjadora, minha Mamã!
Os estragadores não deixam
recuperar a produção de açúcar. O álcool tem mais valor, dá mais lucro.
Produzir cana dá um trabalhão. Precisa de muita água. Fazer canais de irrigação
dá trabalho. Facílimo é importar o açúcar e receber milhões
Ontem a senhora ministra de Estado das Finanças, Vera Daves, esteve à conversa com a comunicação social para garantir que os salários dos funcionários públicos estavam a ser pagos e hoje o pagamento fica concluído. Estragadores! Quem convenceu sua excelência a fazer esta intervenção enganou-a miseravelmente. Quer deitá-la abaixo.
Ninguém convoca os jornalistas para anunciar que ao meio-dia há claridade. E à meia-noite fica escuro. Ninguém diz à comunicação social que as aves voam e os peixes nadam. Não vale a pena, excelência! Para informar a opinião pública que os salários da Função Pública estão a ser pagos a tempo e horas no mês de Junho podia ser um funcionário, com ar feliz, mostrando as mãos cheias de notas. Já recebi! O kumbu está aqui! Agora a senhora ministra informar o óbvio ululante, é um erro grave. Comunicar pior. Dar o peito às balas para nada. Os estragadores que a meteram nessa situação deviam ir cortar cana até ao fim da vida.
A patroa do Banco Central Europeu diz que a inflação na Europa se deve aos aumentos salariais. Uma estragadora desavergonhada. António Costa (em Portugal é o melhor que se arranja…) encheu-se de brios e garantiu que a inflação se deve ao facto dos patrões auferirem lucros pornográficos. Temos um arranjador inesperado. A não ser que seja paleio para boi dormir ou enganar o eleitor distraído.
A Federação Russa quer África, Ásia e América Latina representados no Conselho de Segurança da ONU. Está a chegar o tempo dos arranjadores. Os estragadores querem um mundo de escravos e famintos. Se ganharem mais uma vez, estamos perdidos. Esta é a última oportunidade para a liberdade e a dignidade triunfarem em todo o mundo. E para acabar com a fome e a miséria. Confiemos na República Popular da China. As políticas do governo resgataram milhões e milhões de seres humanos da fome e da miséria.
Confiemos em Lula da Silva. Eliminou a geografia da fome do mapa do Brasil. Angola tem de pensar em aderir ao bloco BRICS. Ao lado da África do Sul que ajudou a libertar do apartheid. Os angolanos decentes são todos arranjadores. Os estragadores têm os dias contados. Juro mesmo!
*Jornalista
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