terça-feira, 5 de setembro de 2023

Portugal | Habitação, saúde e educação de alto risco

Rosália Amorim* | Diário de Notícias | opinião

A habitação, a saúde e a educação são três batatas quentes que escaldam as mãos dos portugueses. No regresso de férias, as famílias reencontram as dificuldades de sempre e que as atormentam: falta de habitação acessível, centros de saúde e hospitais com longas filas de espera e abertura das escolas comprometida.

A habitação criou mais um conflito institucional entre o Governo e a Presidência da República. Marcelo estica a corda, Governo estica-a mais e contorna o veto do Presidente. A oposição não poupa o Executivo socialista e considera a atitude "arrogante" e "poucochinho". Enquanto decorre a tensão institucional, nada muda para os cidadãos. O governo opta por ganhar tempo e, de certa forma, chuta o problema para Bruxelas. O primeiro-ministro enviou uma carta à presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, e quer que o assunto passe a ser uma prioridade da política europeia. Pede a Von der Leyen uma "iniciativa europeia de habitação acessível".

Hoje, mesmo quem já tem casa encontra grande dificuldade em pagá-la ao banco. Ontem, Mário Centeno, governador do Banco de Portugal, veio pedir mais apoios para evitar o incumprimento no crédito à habitação. A um mês do Orçamento do Estado para 2024, Centeno mostra-se preocupado com o que ainda está para vir na economia.

Na saúde, a dificuldade no acesso e a lentidão no atendimento continua. As filas de espera são infindáveis e ainda não chegaram as gripes do outono/inverno. O SNS continua nos cuidados intensivos, com reformas adiadas.

Na educação, as escolas temem a falta de pessoal. Há cerca de dez anos que não se reformavam tantos docentes mesmo antes do arranque de mais um ano letivo. Desde janeiro, mais de 2 mil professores abandonaram as salas de aula. Desiludidos, desencantados, sem se sentirem reconhecidos, preferiram abandonar o que para muitos foi uma paixão a vida inteira: ensinar.

Sem um bom ensino, o falhanço de um país - seja ele qual for - anuncia-se. De que vale ter universidades públicas nos melhores e mais credíveis rankings do mundo, como o do Financial Times, se a educação de base é fraca ou muito fraca? De que vale contratar os melhores professores internacionais para tornar o ensino superior público mais cosmopolita e competitivo, se os meninos e meninas chegam lá (ou nem sequer chegam) com aprendizagens em atraso e dificuldades em chegar ao final de uma licenciatura? Na educação, tal como na construção de uma casa, não se pode começar pelo telhado.

*Diretora do Diário de Notícias

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