Artur Queiroz*, Luanda
O Presidente José Eduardo dos Santos, depois de derrotar as forças do apartheid no Triângulo do Tumpo, num gesto magnânimo estendeu as mãos à UNITA com a assinatura do Acordo de Bicesse. O gesto teve a grandeza dos que sabem vencer. Em nome da reconciliação nacional, o Chefe de Estado deu uma oportunidade a Savimbi para se reconciliar com o Povo Angolano, depois de um longo percurso de traições e crimes de guerra.
Os angolanos merecem a verdade nua e crua. Aí vai a lembrança dos factos. Apenas cinco dias depois da assinatura do Acordo de Bicesse, Isaías Samakuva e Abílio Camalata Numa escondiam 20.000 militares da UNITA, fortemente armados, em quatro bases secretas no Cuando Cubango. A operação foi financiada e alimentada pelos EUA e a Inteligência Militar da África do Sul.
Os Generais Nzau Puna e Tony da Costa Fernandes, quando romperam com Savimbi, denunciaram essa situação. Mas não conheciam a localização das bases onde as tropas foram escondidas, para tomar o poder pela força, no caso de uma derrota eleitoral de Savimbi, que veio a acontecer. Lembram-se da doutrina da CIA/Sean Cleary? “Se a UNITA ganhar as eleições tudo bem. Se perder dizemos que houve fraude e tomamos o poder pela força”. Está escrito nos documentos na posse de Jeremias Chitunda, vice-presidente do Galo Negro.
A ONU foi investigar a situação e nada encontrou. Os EUA queriam que fosse assim. Washington exigia que a operação secreta resultasse. No dia em que foram proclamados os resultados eleitorais, o mundo ficou a saber que o MPLA tinha ganho com maioria absoluta e a UNITA perdeu.
Quando isso aconteceu, os 20.000 homens escondidos saíram das bases “Girafa”, “Palanca”, “Tigre” e “Licua” para Savimbi tomar o poder pela força. Em poucos dias ocuparam mais de 75 por cento do país. As FAA só tinham oficiais e as FAPLA foram extintas. Angola estava nas mãos do caudilho. Adalberto da Costa Júnior anunciou na Europa que a UNITA tinha vencido a guerra! Valeu, na altura, a Polícia Nacional e a as suas forças da Polícia de Intervenção Rápida, que fizeram o papel que cabia aos militares, na defesa da soberania nacional.
Isaías Samakuva é um arrependido.
Declarou solenemente que aderiu ao “Espírito de Bicesse”. Mas nunca manifestou
arrependimento por ter ajudado a esconder 20.000 militares armados para tomar o
poder pela força
Adalberto da Costa Júnior e os dirigentes da UNITA ainda tratam o Executivo como o “regime de Luanda”. Continuam a comportar-se como se tivessem ganho as eleições. Não reconheceram nunca as vitórias eleitorais do MPLA. Falsificam a História. Usam a intoxicação e a manipulação mediática para conquistarem espaço político.
Angola e o mundo sabem que actuais e antigos dirigentes da UNITA participaram, cumprindo ordens da CIA e dos serviços secretos sul-africanos, numa operação suja para esconder as tropas e o armamento que trouxeram de novo a guerra a Angola, depois do curto período de paz que se seguiu ao Acordo de Bicesse.Actuais dirigentes da UNITA participaram activamente em todas as operações da Guerra Suja do Galo Negro. A reconciliação nacional só existe se for sustentada pela verdade. Acabou a vida dupla, o discurso ambíguo, a mentira compulsiva. A pele de cordeiro cai quando a verdade é revelada. Os angolanos sabem quem escondeu tropas e armas nas bases “Girafa”, “Palanca”, “Tigre” e “Licua”. Sabem quem seleccionou os melhores comandantes para actuarem na guerra. Quem escondeu as antiaéreas, incluindo os mísseis Stingers, e as armas pesadas.
O espírito de Bicesse foi trucidado na guerra após as eleições. Adalberto da Costa Júnior ajudou Savimbi a destruir Angola, a provocar milhões de desalojados, mortos e feridos. Não pode servir-se da reconciliação nacional como arma de arremesso contra as suas vítimas. Mais de 95 por cento dos problemas que hoje temos (mesmo o oportunismo…) resultam da guerra que os EUA fizeram contra Angola por procuração passada ao Zaire de Mobutu e ao regime racista de Pretória. Os da UNITA eram o pessoal menor, criadagem para o trabalho sujo contra o Povo Angolano. A direcção da UNITA e seus idiotas úteis do Bloco Democrático não querem a democracia, odeiam eleições e sempre que podem, tornam a vida impossível aos angolanos.
O Bureau Político do Comité Central do MPLA emitiu um comunicado sobre a reunião entre Joe Biden e João Lourenço. Manifesta-se “consciente da importância desta visita, reconhece que os progressos alcançados são um reflexo do trabalho contínuo e dedicado do MPLA para a melhoria da vida dos angolanos e a afirmação de Angola no palco internacional. O Bureau Político apela a todos os membros da sociedade angolana para que, inspirados neste sucesso diplomático, continuemos a trabalhar unidos para o crescimento e a prosperidade da nossa Nação”.
Isto é uma voz de barragem. Nem me atrevo a perguntar em que medida o encontro vai melhorar a vida dos angolanos. Ou contribuiu para o crescimento e prosperidade da nossa Nação. Mas está dito. Falou o Bureau Político e a partir de agora só falo sobre este tema com os meus camaradas.
Os sujeitos que sacam mundos e fundos à frente do CFB e do Porto do Lobito dizem que pelo corredor do comboio vamos chegar à Zâmbia. Esta criadagem está muito parecida com os sicários da UNITA. A linha férrea para a Zâmbia já começou a ser construída? Em Angola ou na República Democrática do Congo? Quantos anos são necessários para construir o canal ferroviário? Não há respostas para estas questões. Mas quem os ouvir, Biden vem a Angola e viaja de comboio do Lobito até Lusaka na inauguração do corredor do Lobito alargado.
Conversa acabada. João Lourenço foi dar uma mão a Joe Biden num momento em que os EUA são escorraçados de todos os países africanos que desgraçaram durante décadas. A falência da política norte-americana para África foi compensada por Angola. Mas não contem com o ovo antes de ser posto pela galinha. O Zaire era Mobutu mas a RDC não é Tshisekedi. A Zâmbia era Kaunda mas hoje não é. O Níger era um qualquer criado de serviço mas hoje não é. O Mali era um qualquer agente da CIA e do Pentágono mas hoje não é. João Lourenço é Presidente da República até 2027. Mas em 2028 já é outra ou outro. Que pode não dar a mão aos náufragos de Washington. Os ventos sopram a favor da organização BRICS também na África Austral.
* Jornalista
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