Sondagem mostra que maioria absoluta do PS
esfumou-se, PSD também perde, Chega ganha força
Um ano depois das legislativas, o
Bloco Central apresenta sinais de desgaste, a Direita deixa a Esquerda a sete
pontos de distância, e os liberais multiplicam resultado por dois.
Um ano depois das últimas
legislativas, o PS de António Costa voltaria a vencer umas eleições, mas longe
da maioria absoluta (27,1%). Não conseguiria sequer liderar uma maioria
parlamentar à Esquerda, porque ela desaparece. De acordo com a sondagem da Aximage
para o JN, DN e TSF, o PSD de Luís Montenegro não consegue afirmar-se como
alternativa (25,1%). A Direita teria primazia, mas à custa do crescimento de
Chega (12,9%) e Iniciativa Liberal (9,5%). O BE também recupera, mas pouco
(6,6%), enquanto a CDU parece estagnada (4,8%). Livre (3,4%) e PAN (3,1%)
deixariam de ser partidos de deputado único. E o CDS continuaria fora do
Parlamento.
O exercício é virtual. Uma
sondagem é um retrato do momento, sempre com imperfeiçoes, não é uma eleição.
Ainda assim, mesmo os mais desconfiados serão obrigados a reconhecer que a que
foi realizada pela Aximage, entre 10 e 14 de janeiro, parece confirmar muitas
das leituras que se têm ouvido a comentadores e politólogos, e até ao
presidente da República, nos últimos meses: primeiro, o desgaste do PS, minado
por sucessivos escândalos; segundo, a incapacidade do PSD de se apresentar como
uma alternativa forte; terceiro, a polarização que desfaz o centro, premiando
os radicais de Direita. Vamos por partes.
O desgaste do PS
Quando se compara o que aconteceu
há um ano com o que se projeta para este, a primeira conclusão é que os
socialistas desbarataram a sua maioria absoluta. Seja pela conjuntura externa
(o aumento do custo de vida), seja pela sua autofagia (a sucessão de escândalos
e demissões no Governo), a avaliação positiva de António Costa é coisa do passado. E o PS pagaria a fatura, se os
portugueses fossem de novo chamados às urnas (o presidente da República já
deixou claro que não serão): perde 14 pontos relativamente às últimas
legislativas e sete quando se compara com a sondagem de outubro passado.
O chamado "povo de
Esquerda" poderia ser levado a pensar que isso seria uma coisa boa. O PS
seria de novo obrigado a governar à Esquerda. Ou melhor dito, a negociar orçamentos
do Estado com a Esquerda. O problema é que a sondagem também mostra que a
geringonça seria insuficiente. Foi na sondagem de outubro passado que o
conjunto da Direita ultrapassou pela primeira vez a Esquerda. Um ano depois das
legislativas, PS, BE, CDU e Livre teriam em conjunto menos dez pontos
percentuais e ficariam longe de conseguir controlar o Parlamento (41,9%).
Isto porque as perdas socialistas
não revertem para os outros três potenciais parceiros. É verdade que, quando se
analisa o mapa de transferência de voto, o BE ganha alguma coisa com o
descalabro do PS. Mas os bloquistas crescem apenas dois pontos face a 2022.
Tanto quanto o Livre de Rui Tavares, ainda que neste caso dois pontos tenham
outro peso (quase triplicaria o seu valor no mercado eleitoral). Quanto aos
comunistas, a troca de Jerónimo de Sousa por Paulo Raimundo não teve efeitos:
mais meio ponto do que há um ano continua a ser um resultado difícil de engolir.
A incapacidade do PSD
Marcelo Rebelo de Sousa já foi um presidente mais popular. Mas a sua capacidade de
analisar a vida política em termos que toda a gente compreende não se perdeu.
Tendo em conta os resultados desta sondagem, é impossível não a associar às
reflexões do presidente, quando, confrontado com a avalanche de escândalos,
recusou demitir o Governo, dissolver o Parlamento e forçar eleições
antecipadas. Como disse, no mesmo que tom de analista que o tornou famoso nas
televisões, não era provável que "surgisse uma alternativa evidente, forte e imediata". Traduzindo: o
PSD não chega lá.
A prova dos nove fica feita. O
PSD de Luís Montenegro não só não consegue aproveitar o trambolhão socialista,
como troca o passo: se hoje houvesse eleições, perderia quatro pontos
relativamente às última legislativas, delapidando os ganhos que conseguiu nesse
intervalo (perde seis pontos face à sondagem de outubro passado). Um resultado
em linha com outros indicadores do barómetro: não só perde a liderança da
Oposição e da Direita para André Ventura, como, na avaliação aos vários líderes
partidários, Montenegro é o segundo que mais perde (depois de Costa),
registando um saldo negativo de 18 pontos.
Recorde-se uma outra fase de
Marcelo, dita no mesmo contexto: "Imagine que o presidente da República
usa a arma atómica e que o povo português confirma o partido no Governo, com
maioria absoluta ou sem maioria absoluta. Já viu a posição em que deixava o
presidente da República?". Já não é preciso imaginar. Mesmo que esta seja,
como já se disse, uma escolha virtual.
O Centro a perder peso
É um fenómeno comum a várias
democracias europeias e ocidentais. Com a vida política polarizada, os partidos
tradicionais de centro-esquerda e centro-direita perdem preponderância, em
favor de propostas mais populistas, radicais ou de rutura com o status quo. E,
em vários casos, até da extrema-direita. É isso que mostra esta sondagem.
Quando se somam os resultados do
PS e do PSD, os partidos que lideraram todos os governos, desde que a
democracia portuguesa encontrou um rumo de estabilidade, a sua degradação é
evidente. Nas legislativas do ano passado, os dois partidos somaram 69% dos
votos (e mais de dois terços dos deputados, a maioria necessária para fazer
alterações constitucionais). Nesta altura, segundo a sondagem, somariam apenas
52%.
Os grandes beneficiários são,
desta vez, dois partidos recém-chegados. A Iniciativa Liberal, que valeria
agora praticamente o dobro do que conseguiu nas últimas legislativas, em boa
parte à custa do eleitorado do PSD (o que torna ainda mais surpreendente que
João Cotrim de Figueiredo, o único chefe partidário com uma avaliação positiva
por parte dos portugueses, tenha decidido abandonar a liderança).
Mas, acima de todos os outros,
estão os ganhos (por enquanto virtuais) dos radicais de Direita, que subiriam
cerca de seis pontos relativamente a janeiro de 2022. André Ventura é sempre o
primeiro (e muitas vezes o único) a pedir a demissão de secretários de Estado e
de ministros, haja ou não razão para tal, e a tática está a dar frutos. É
preciso recuar a 1987 para encontrar um terceiro partido a superar a barreira
dos 12 pontos percentuais (na altura foi a CDU).
Socialistas metropolitanos
Quando se analisa o corpo a corpo
entre PS e PSD ao nível regional, percebe-se que os socialistas continuam a
dominar nas áreas metropolitanas do Porto e de Lisboa, ainda que nove pontos
mais abaixo que em outubro passado. O PSD mantém a liderança no Norte (agora
mais folgada) e no Centro (mais apertada).
Chega dispara em Lisboa
O Chega continua a ser o terceiro
classificado no Sul e Ilhas e no Norte (aqui empatado com os liberais), perde o
pódio no Centro para a Iniciativa Liberal, mas sucede o movimento contrário em
Lisboa, em que o crescimento dos radicais é enorme (16,2%). No Porto, o BE
consegue empatar com os liberais no terceiro lugar.
Seniores castigam centro
A distribuição dos grupos etários
entre PS e PSD não se alterou relativamente a setembro. Os mais novos (18/34
anos) inclinam-se para os sociais-democratas. No caso dos mais velhos, os
socialistas sofrem uma queda, mas o grande rival à Direita, não só não
aproveita, como sofre um castigo ainda mais severo.
Jovens mais radicais
Os radicais de Direita acrescentam os mais jovens ao
terceiro lugar que já detinham nos dois escalões intermédios. Os liberais
empatam com o Chega nos 35/49 anos e ficam com o último lugar do pódio entre
que têm 65 ou mais anos, um terreno que lhes costuma ser relativamente hostil.
Rafael Barbosa | Jornal de Notícias | Imagem: Rodrigo
Antunes/Lusa, inscrição PG