Artur Queiroz*, Luanda
António de Oliveira Cadornega escreveu a “História Geral das Guerras Angolanas”, em 1680, já lá vão 344 anos. Em nenhuma página fala de guerra civil. Outras guerras aconteceram contra os ocupantes estrangeiros. A mais longa foi a Guerra dos Dembos. Rebentou em 1872 e só terminou em 1919 quando as tropas portuguesas assaltaram a cidadela real do Dembo Kazuangongo, na Pedra Verde. Nenhum historiador fala em guerra civil. As guerras de ocupação do Planalto Central e do Sul de Angola aconteceram há mais de cem anos. Os vários historiadores desses acontecimentos não falam em guerra civil.
Em 1961 começou a guerra colonial. Luta armada de libertação nacional. Não se atrevam a chamar-lhe uma guerra civil, ainda que os sicários da UNITA tenham lutado ao lado dos colonialistas contra as forças libertadoras do MPLA.
Em 1974 começou a guerra contra a liberdade. De um lado as forças de libertação e do outro os independentistas brancos, apoiados pela mais agressiva e reaccionária aliança que alguma vez se formou na Terra: EUA, Reino Unido, França, Alemanha Federal, África do Sul, Rodésia de Ian Smith (Zimbabwe), Zaire do ditador Mobutu, UNITA de Jonas Savimbi, fascistas portugueses e mercenários de várias nacionalidades. Não foi uma guerra civil.
A coligação continuou após a Independência Nacional para destruir a República Popular de Angola. Os racistas de Pretória invadiram Angola usando como escudo os sicários da UNITA. Nunca foi uma guerra civil.
Após as eleições de 1992 Jonas Savimbi e a UNITA levantaram armas contra a democracia. Uma rebelião armada que furou dez anos e fez milhares de mortos. Milhões de deslocados e refugiados. Destruições em todo o país. Liquidação da autoridade do Estado. A rebelião foi derrotada em 22 de Fevereiro de 2002. Não foi uma guerra civil. Foi um assalto armado ao poder. A expressão mais sangrenta da traição. Não falem em guerra civil. O banditismo armado não tem dimensão política.
Tanto falaram em guerra civil que ela estoirou em 2017. João Lourenço foi eleito Presidente da República por ser o cabeça de lista do MPLA. Serviu-se dessa vitória eleitoral para abrir uma guerra civil no seio do partido. A primeira vítima foi o Presidente José Eduardo dos Santos, seus familiares e colaborares próximos. Alguns notáveis do MPLA colaboraram na guerra civil ordenando a José Eduardo dos Santos que abandonasse a liderança do partido. Bem sabendo que o líder e a direcção têm um mandato que vai de congresso a congresso. A guerra civil ganhou contornos de golpe de teatro. De prémio, os seus activos não foram “recuperados”.
Sob o pretexto do combate à corrupção a guerra civil agravou-se. O lado terrorista começou a fazer reféns. E os seus mentores criaram um instrumento para extorsão e chantagem. Chamam-lhe recuperação de activos. Passaram a exigir avultadas somas aos reféns e seus familiares em troca da liberdade. Os resgates são proibitivos. Quem não pagar morre na cadeia, mesmo que a ONU declare a existência de prisões arbitrárias e julgamentos ilegais. Ou o Tribunal Constitucional aprove Acórdãos que atiraram com o decreto presidencial dos dez por cento para o lixo ou considerem que uma sentença judicial “violou os princípios da Legalidade, do Contraditório, do Julgamento Justo e Conforme e do Direito à Defesa”.
Nada disse conta. Os reféns só são libertados quando pagarem o resgate. A carteira ou a vida. Escolham. Carlos São Vicente ficou sem as empresas. Sem as acções no Standard Bank. Sem os prédios. Sem os hotéis. Sem o dinheiro nas contas bancárias, Mas eles querem ainda mais. Ou paga ou morre na cadeia.
A ONU exigiu a sua libertação.
Continua preso ao contrário do que o chefe Miala pôs a circular. Carlos São
Vicente está preso
Esta guerra civil não vai deixar pedra sobre pedra. Não pensem que alguém é poupado. Quem tenha empresas, dinheiro, prédios, fazendas ou entrega tudo ou vai preso. É feito refém. Quem não pagar o resgate morre no cárcere. Porque os mentores da guerra civil fizeram seus os Tribunais. Fizeram suas as penitenciárias. Fizeram seus os magistrados judiciais. Fizeram sua a Procuradoria-Geral da República. Fizeram seu o Executivo.
A única esperança é a direcção do MPLA resistir. E as deputadas e deputados eleitos cumprirem o mandato popular. Honrarem a confiança dos eleitores. Esta guerra civil é desigual. Os golpistas tomaram de assalto as instituições do Estado. Todas e todos são candidatos a reféns. Todas e todos podem ser chamados a pagar os resgates.
Do lado dos golpistas não há inocentes, Do lado da democracia todos são suspeitos e candidatos a vítimas da chantagem e extorsão. Todos podem ter de enfrentar chantagistas. Carcereiros cruéis. Todos estão em risco de pagar resgates.
Joe Biden debateu com Trump. Guardei uma frase do presidente do estado terrorista mais perigoso do mundo: “A guerra em Gaza continua até acabarmos com o HAMAS”. Estão a conseguir. Matam uma criança de dois em dois minutos. Pela primeira vez na História da Humanidade há uma guerra contra as crianças.
A cidade de Rafah está em ruinas como todas as outras da Faixa de Gaza. O genocídio avança avassalador. Ao fim de meses e meses de mortandade, a União Europeia tomou uma medida histórica. Impôs sanções a pessoas e empresas que apoiam o HAMAS e a Jihad Islâmica.
Já ouviram falar do Estado Islâmico? Esse mesmo. É um instrumento da CIA para o trabalho sujo contra quem não se submete às ordens da Casa Banca. Na Síria é um grupo ao serviço do estrado terrorista mais perigoso do mundo. Números oficiais: Em quatro anos de guerra na Síria, o Estado Islâmico matou 4.000 civis!
Morreu Fausto, menino do Huambo. Musicou um poema de Acácio Barradas e na capa do disco “Por Este Rio Acima” citou esta frase de uma crónica que publiquei no jornal Página Um: “Nós, os do reviralho, andamos sempre a navegar com sérios riscos de afundar”. Vamos todos ao fundo mais hora menos hora. Estou bem triste.
* Jornalista
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