Artur Queiroz*, Luanda
O Bangladesh pegou fogo. A violência instalou-se nas ruas de Daca e de todas as cidades do país. Mais de 500 mortos depois, a primeira-ministra Sheikh Hasina abandonou o cargo e partiu para Nova Deli num exilio voluntário. Mas não ficou calada. Acaba de dar a sua versão dos sangrentos acontecimentos no seu país: “O Governo dos Estados Unidos da América está por trás das manifestações que me tiraram do poder. Podia continuar no cargo se entregasse a ilha de São Martinho aos EUA. E permitisse que controlassem militarmente o Golfo de Bengala”.
O estado terrorista mais perigoso do mundo usa este método sempre que precisa de colocar os seus títeres no poder. Manifestações violentas, destruições, caos. Se não der, avançam com a guerra. E por fim ocupam. Primaveras e revoluções coloridas estão aí a comprovar, do Cairo a Kiev, de Bagdade a Berlim. Estão neste momento a fazer isso na Venezuela.
Tudo se agravou quando a Administração Obama deixou cair políticas emblemáticas que marcam o Estado Social, para conseguir o apoio dos republicanos ao aumento do tecto da dívida dos EUA. A Comissão Europeia diz que não há dinheiro para manter o Estado Social tal como está, oficializando a política neoliberal imposta pelo Partido Popular Europeu, largamente maioritário no parlamento de Estrasburgo.
De Moscovo veio mais uma acha para a grande fogueira da crise económica. Vladimir Putin disse que os EUA andam a “parasitar” as economias dos outros países e é altura de mudarem de vida. As crises económicas no ocidente alargado são resolvidas com guerras sangrentas que se sabe como começam mas nunca se sabe como e quando acabam. Olhem para a Palestina, Sudão, RDC, Ucrânia, Líbia, Síria, Kosovo e outros teatros de operações onde actua o estado terrorista mais perigoso do mundo e seu braço armado da OTAN (ou NATO).
Nestes dias de incertezas temos uma certeza absoluta: Está criado o clima social, político e económico para que os países ocidentais recorram mais uma vez à violência da guerra generalizada para resolverem os problemas sociais e políticos que não conseguem resolver desde que Wall Street entrou em falência.
Desta vez o dique rebentou pelo lado da maior economia do mundo, o que não é de todo inesperado, porque os EUA também têm a maior dívida do planeta e neste momento já há dúvidas fundadas sobre a sua capacidade de pagá-la. A recessão está instalada nos EUA e na Alemanha, o motor da União Europeia!África está a pagar um preço exorbitante pelos problemas surgidos nas economias dos países ocidentais. Mas desta vez as grandes potências já não podem arrastar as suas colónias para a guerra, simplesmente porque não existem, ainda que continue o espírito colonialista entre as grandes potências coloniais do passado.
Os países africanos estão a sofrer graves problemas sociais e económicos como reflexo da crise que afecta os países ocidentais. Mas pelo menos desta vez não ouvimos os habituais argumentos que enxameiam os órgãos de comunicação social ocidentais, que atribuem aos políticos africanos a responsabilidade de todos os males que afectam a Humanidade.
O Estado Social em Angola estava a crescer e em regime de consolidação, entre 2002 e 2017. No período do renascimento, os investimentos públicos aumentaram quando no ocidente alargado eram cortados. A dívida do Estado era paga pontualmente e os compromissos internacionais honrados. As contas públicas eram elogiadas. Os problemas quotidianos dos angolanos eram resolvidos com inteligência, dinamismo e em tempo útil.
Após 2017 tudo se desmoronou. Até o MPLA corre o risco de derrocada. Os angolanos, sobretudo os jovens, são mobilizados pela propaganda de um Executivo paralisado e enredado na teia da incompetência. A juventude, desiludida, segue viagem pelos trilhos da mentira. Perdeu a confiança nos políticos que elegeu com maioria absoluta. Um desastre de proporções gigantescas. João Lourenço é o autor (único) desta tragédia. Está empenhado em não deixar pedra sobre pedra, até final do mandato. Qualquer dia, com a delicadeza que lhe é conhecida, até destrói o repuxo do jardim no Palácio da Cidade Alta.
Se quiserem saber onde está a corrupção e a incompetência governativa, podem olhar para o Palácio da Cidade Alta e o seu inquilino, até 2027. Incompetência, corrupção, desemprego, falências, incumprimentos, tudo isso está à vista, desde 2017 e particularmente 2022. Os “buracos” financeiros aumentam todos os dias e não têm fundo.
Os “ajustes directos” a torto e a direito deram em atrasos no pagamento dos salários aos servidores públicos. Um retrocesso de 100 anos que só pode ser explicado pela incompetência e o desprezo dos governantes aos trabalhadores. Para Angola ficar igual a uma colónia do estado terrorista mais perigoso do mundo só faltam mesmo as bases militares. João Lourenço ainda vai inaugurar a primeira seja no Ambriz ou no Soyo. Com discurso de agradecimento e tudo.
África tem condições de enfrentar com sucesso a crise económica e financeira mundial, se for possível reproduzir os exemplos do Mali, Níger e Burkina Faso. Mas para que esta parte do mundo seja um oásis, os políticos africanos não podem dar crédito ao que chega dos EUA e da Europa. É possível enfrentar a crise do sistema, impedindo a contaminação do ocidente.
João Lourenço segue o caminho contrário. Agora está feito caixeiro-viajante entre Kigali e Kinshasa. Ainda não percebeu (ou finge que não percebe) que o conflito no Leste da República Democrática do Congo não tem origem na região. O problema reside na Casa dos Brancos, em Bruxelas, no Palácio do Eliseu, em Londres ou Berlim. Nas capitais do ocidente alargado. Lá estão os abutres que debicam no corpo inerte de África, enchendo o imenso papo, enquanto os africanos definham e perecem.
Políticos da dimensão de João Lourenço agravam este quadro. Em 2027 os eleitores angolanos têm novamente a palavra. O MPLA tem a responsabilidade de corrigir os erros que estamos com eles.
* Jornalista
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