terça-feira, 12 de novembro de 2024

Angola | Guerra na Capoeira -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

O exonerador implacável já está afiando a caneta para a exoneração do embaixador Francisco da Cruz. Ele disse na ONU que é preciso “defender os Direitos Humanos em todos os lugares”- Possesso de uma loucura invulgar, o representante permanente de Angola junto da Organização das Nações Unidas, em Nova Iorque, elogiou o papel do Conselho dos Direitos Humanos, esse mesmo que declarou arbitrária a prisão de Carlos São Vicente e o seu julgamento ilegal. Mais grave ainda: Exige a sua libertação imediata. 

Francisco da Cruz discursou na ONU e disse isto: “O direito internacional, incluindo o direito internacional dos direitos humanos está a ser utilizado como arma para obter vantagens políticas”. Não acrescentou “económicas” porque teve medo da reacção intempestiva de Pita Grós, Eduarda Rodrigues e João Lourenço. 

Mesmo assim, numa ousadia demencial, fez esta declaração no mesmo lugar onde o Presidente da República se queixou de não lhe darem o dinheiro de Carlos São Vicente: “Devemos renovar o compromisso de defender os princípios intemporais da Declaração dos Direitos Humanos, tal como nos comprometemos a fazê-lo no ano passado, ao comemorarmos o 75º aniversário desde a sua adopção pela Assembleia Geral da ONU”. Só lhe faltou exigir a imediata libertação de Carlos São Vicente. 

Fernando Garcia Miala, o exonerador implacável , carinhosamente tratado pelos seus conterrâneos por Sipaio da Damba, já está a assinar a exoneração do embaixador. Mas como ler e escrever não são o seu forte, ainda demora algum tempo. Mais um destinado ao contrabando de combustíveis (de Angola para a República Democrática do Congo) ou de cobalto (da RDC para Angola) como forma de enriquecer rapidamente e em força. 

O exonerador também não vai longe. Está a circular um vídeo do General Zé Maria onde lhe chama criminoso por tentar matar o Presidente José Eduardo dos Santos. O julgamento do chefe Miala foi à porta do Cemitério do Alto das Cruzes e na presença dos responsáveis pela Segurança Externa e Segurança Militar. O General Zé Maria dixit com todas as letras: “O Miala é um criminoso, quis matar-me e matar o Presidente José Eduardo dos Santos”. Como não pode exonerar quem já foi exonerado, desta vez a coisa fica mesmo muito feia. No mobutismo reinante é facílimo condenar à morte as vozes críticas!

Notícias frescas. O presidente da Entidade Reguladora da Comunicação Social Angolana (ERCA), jornalista Adelino de Almeida, anunciou que estão em curso trabalhos, com os órgãos de Justiça, para criminalizar a desinformação reinante e o sensacionalismo. Clube K, Folha 8, Maka Angola e outros antros de banditismo mediático vão ter de fazer Jornalismo. Pita Grós fica sem tachos! Mais um que vai para o contrabando.

O Sindicato dos Jornalistas atirou com euaTeixeira Cândido para a capoeira onde manda o Galo Negro e a nova direcção anunciou que deixou a Central Geral dos Sindicatos Independentes e Livres de Angola (CG-SILA). Sem aviso prévio. Nem notícia singela de um parágrafo. Guerra na capoeira. A central diz que o sindicato nunca pagou as suas contribuições, desde a fundação. Deve um montão de kumbu. Caloteiros. Nada que o dinheiro não resolva. É assim que fazem “jornalismo”, com muitas notas por baixo da mesa. Mais nota menos nota, tudo se resolve.

O “politólogo” Luís Jimbo defende que a Comissão Nacional Eleitoral (CNE) precisa de se libertar dos partidos políticos para ser “um órgão verdadeiramente independente”. Alguém explique a este bagre fumado que os eleitores votam nos partidos políticos. E estes têm o direito de saber se o tratamento dos votos é correcto. Se há instituição onde os partidos políticos têm de estar representados é mesmo na CNE. Porque trata de uma parte essencial da sua existência, a legitimidade e representatividade. Isso faz-se através do voto popular. Partidos com menos de meio por cento dos votos são extintos.

Estes democratas de aviário (UNITA) não perdem uma oportunidade para mostrem o seu ódio visceral à democracia. Metam nessas cabecinhas ocas que quem garante mandatos e maiorias parlamentares são os eleitores. Os delegados dos partidos na CNE têm apenas 16 votos. Os representantes dos partidos nas mesas e assembleias de voto têm um voto cada. Quando encerram as urnas só são contados os boletins de voto. Ninguém vai incluir na soma o que pensa cada representante partidário. As eleições são em 2027 e já estão a preparar a cantilena da fraude!

A maka que estamos com ela é mesmo guerra na capoeira mas sem os galos da UNITA. Uns prendem camiões que levam combustível de contrabando para a RDC e lixam o negócio dos outros. Outros prendem os camiões que fazem contrabando de cobalto a partir da RDC para Angola, onde o escoamento é mais fácil do que lavar dinheiro sujo. Lixam o negócio de uns. Pelo meio há exonerações e gritos de vingança. Entre mortos e feridos alguém vai escapar. 

Nos EUA os eleitores vão escolher entre o forno e a fogueira da Jamba. De um lado os belicistas atómicos e do outro os belicistas genocidas. Ganhe quem ganhar as eleições, o mundo vai ficar ainda pior. O comércio mundial começa a fazer-se em moedas nacionais. Um dia destes, o dólar nem serve para limpar o rabo. Olhem para a História Universal. O fim dos impérios é sempre antecedido de tremendas tragédias humanitárias. Recordem Angola nos anos de 1974 e 1975 quando rebentou o império colonial português. Estamos nessa fase.

Em Portugal faleceu Camilo Mortágua, um lutador antifascista e anticolonialista. Ele e o capitão Henrique Galvão tomaram de assalto o transatlântico Santa Maria, que fazia a rota marítima de Lisboa para o Brasil e era o mais moderno navio da marinha mercante portuguesa. Os revolucionários anunciaram que iam rumar ao porto de Luanda. A cidade ficava cheia de jornalistas estrangeiros para o 4 de Fevereiro ter cobertura mediática à altura da matriz revolucionária angolana. 

Entrevistei três vezes Camilo Mortágua. A última foi na vila alentejana onde ele decidiu viver. Dedicava-se à criação de borregos em “pastos naturais parqueados”. Alem de partilharmos a mesma ideologia, fomos fundadores da Associação José Afonso. Portugal perdeu um dos seus melhores filhos. E eu perdi mais um amigo, o que não é coisa pouca para quem já perdeu tantos, ao longo desta vida descontente. Morreu um dos mais intrépidos combatentes da Liberdade que conheci. 

* Jornalista

Sem comentários:

Mais lidas da semana