terça-feira, 31 de maio de 2011

ADEUS PRIVACIDADE




ANTONIO TOZZI, Miami – DIRETO DA REDAÇÃO

O que antes era somente sonho de ficcionistas como George Orwell, Julio Verne e Aldous Huxley hoje já é realidade. Vivemos como se, de fato, fôssemos personagens de um imenso Big Brother – inspirado, aliás, numa antevisão de Orwell – onde já não mais existe privacidade. Com um simples clicar de botão, é possível para as autoridades levantar todos os dados de sua vida – sejam eles pessoais, profissionais ou mesmo secretos.

Redes sociais como Facebook, Linkedin e outras foram criadas exatamente com esta finalidade, a de angariar dados que as pessoas colocam de graça em troca de um serviço. Como dizem os especialistas em Marketing, se você não paga nada por um produto ou serviço, isto significa que você é o produto que está sendo comercializado. Ou melhor, estão sendo comercializadas as informações que você disponibilizou por sua própria conta – e risco.

Através desse mapeamento, as companhias podem direcionar suas campanhas de Marketing de uma maneira mais objetiva. Não há razão para enviar uma amostra do produto em amarelo para Alice se ela mesma já declarou ser o azul sua cor predileta. E assim, através desta seleção natural, os empresários e grupos organizados vão conquistando cada vez mais adeptos para seus produtos e serviços e também para suas causas.

A sociedade moderna a cada dia torna-se mais invasiva. Quando a polícia técnica efetua seus trabalhos de investigação para rastrear os suspeitos de crimes e de fraudes vasculha todos os instrumentos usados pelos cidadãos. Desta maneira, os peritos examinam as ligações feitas e/ou recebidas pelo suspeito e recuperam os dados contábeis e financeiros para ver se eles podem revelar informações importantes para o esclarecimento do caso.

E o que dizer das onipresentes câmeras de vídeo? Elas estão em todos os locais a denunciar crimes, roubos ou mesmo atos indiscretos. Que o diga Dominique Strauss-Khan, que trocou uma provável Presidência da França por uma desastrada cantada em uma camareira da Guiné num hotel de luxo em Nova York. A moça denunciou o figurão, e contou com as inestimáveis ajuda das câmeras e do laboratório que acusou a presença do DNA do sexagenário Don Juan numa amostra de sêmen colhida no quarto. Só restou mesmo a ele mudar a história e afirmar que o sexo havia sido consensual.

Nada escapa destas máquinas sofisticadas que atuam como olhos mecânicos do Big Brother. Nos aeroportos, somos submetidos a um verdadeiro escrutínio no qual nossa privacidade é totalmente desrespeitada. A bagagem é examinada cuidadosamente e há até mesmo um excesso de zelo, com o confisco de cremes e pastas de dente. Entretanto, o transtorno é tolerado porque o cuidado nunca é demais ao sabermos que terroristas suicidas podem inflitrar-se levando com eles instrumentos e elementos que podem provocar uma tragédia acima das nuvens.

Por isto, este negócio de querer levar vantagem tem provocado muita dor de cabeça em políticos que recentemente ignoraram o arsenal de monitoramento à disposição de todos. Que o digam Jacqueline Roriz, flagrada por uma câmera que a filmou no ato do recebimento da propina, e Antonio Palocci, que argumenta ter multiplicado seu patrimônio por 20 apenas prestando serviços de consultoria, sem especificar quais e para quem.

Isso leva a outra consideração. Por que no Brasil não se institui definitivamente a atividade de lobby? Passaria a ser uma atividade de pressão de determinados grupos sobre os principais atores da vida pública nacional, apenas que feita de maneira clara e assumida. Muita gente repele os lobistas, por julgá-los uma alcatéia de lobos prontos a devorar os incautos, mas se esquecem que toda ação de pressão caracteriza-se como lobby: seja grupo sindical, ambientalista, em defesa da igualdade sexual etc. Tudo isto é lobby, assim como o de ruralistas, madeireiros e importadores.Talvez, regularizada, essa atividade poderia ser (um pouco) mais controlada.

*Foi repórter do Jornal da Tarde e do Estado de São Paulo. Vive nos Estados Unidos desde 1996, onde foi editor da CBS Telenotícias Brasil, do canal de esportes PSN, da revista Latin Trade e do jornal AcheiUSA.

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