sexta-feira, 27 de maio de 2011

Brasil: NOVO IMPOSTO À PREVIDÊNCIA PROMETE GUERRA PATRONAL POR R$ 82 BI




ANDRÉ BARROCAL – CARTA MAIOR

Para liberar folha de salário de tributo destinado à Previdência, ministério da Fazenda recua e compromete-se com centrais sindicais a apoiar criação de imposto sobre vendas. Troca, se concretizada, vai impor redistribuição fiscal de R$ 82 bilhões entre setores diferentes da economia. Grandes doadores de campanhas, empreiteiras ganham e bancos perdem.

BRASÍLIA – Dia 2 de junho, técnicos dos ministérios da Fazenda e da Previdência Social e representantes das centrais sindicais vão começar uma rodada de reuniões para traçar cenários de arrecadação do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a partir de um imposto novo, incidente nas vendas das empresas. A novidade substituiria a tradicional contribuição previdenciária patronal com base nos salários dos funcionários. E tem tudo para provocar uma verdadeira guerra dentro do empresariado, por conta de uma bilionária redistribuição tributária.

O aceno de que o governo topa criar um imposto sobre faturamento, para financiar as contas da Previdência, como compensação por desonerar a folha de salários, foi dado pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, em reunião com dirigentes das centrais na última quarta-feira (25/05). “Ele disse que vai desonerar 100% da folha e que a contribuição será transferida para o faturamento”, conta o secretário-geral da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Quintino Severo, presente à reunião.

A posição manifestada pelo ministro representa um recuo da própria equipe econômica. Em 2008, ainda no governo Lula, a Fazenda propôs ao Congresso mudar a Constituição para cortar um pedaço da contribuição à Previdência Social que as empresas pagam em cima da folha salarial.

A ideia era reduzir, ao longo de alguns anos, a alíquota de 20% para 14%. Motivo: ajudar as empresas brasileiras que empregam muito a enfrentar concorrentes internacionais que não têm o mesmo custo. “Esse é um dos fatores que reduzem nossa competitividade, sobretudo nos setores intensivos em mão de obra”, diz o secretário-executivo da Fazenda, Nelson Barbosa.

Desde o início, no entanto, as centrais sindicais espernearam contra a proposta, temerosas de que tirar receitas do INSS poderia lhe causar problemas de caixa no futuro, alimentando planos privatizadores do sistema previdenciário. Defendiam que o governo não deveria fazer cortesia aos empresários com dinheiro dos trabalhadores. Se fosse para abrir mão, ainda que de forma parcial, da contribuição patronal à Previdência, que se instituísse alguma outra fonte de receita para o INSS, diziam.

Pressionado, o governo Lula não fez esforço para os parlamentares votarem o projeto, mas a ideia nunca saiu da cabeça do ministério da Fazenda. Mantida pela presidenta Dilma Rousseff, a equipe de Guido Mantega tinha, nas atuais negociações da reforma tributária, desengavetado o plano de desonerar a folha de salários. Mas não havia dito ainda, até agora, que aceitava adotar alguma compensação.

Racha patronal: problema político

O compromisso com a fórmula compensatória vinha sendo evitado porque tem potencial para criar problemas políticos para o governo, por conta do impacto no empresariado. No ano passado, a contribuição patronal ao INSS com base nos salários foi de R$ 82 bilhões, 28% das receitas da Previdência. A proposta de 2008 cortava aquela arrecadação em cerca de R$ 25 bilhões e dizia que o governo se encarregaria de cobrir a diferença e que o próprio crescimento da economia ajudaria.

Agora, com a troca do imposto sobre a folha por um sobre faturamento, haverá uma redistribuição do recolhimento de R$ 82 bilhões à Previdência. Quem paga mais atualmente, como empreiteiras, indústrias têxtil e calçadista, setor naval, por exemplo, terá um alívio. Quem tem vida boa - empresa com vendas altas e emprego baixo –, sofrerá mais. Entram na mira, por exemplo, setores mais informatizados, como bancos, telefônicas, comércio e serviços em geral.

Um tipo de redistribuição da carga fiscal como este foi feito no início da década passada, quando o governo (primeiro Fernando Henrique, depois Lula) mudou as regras de dois tributos também incidentes no faturamento (PIS e Cofins). E não faltou polêmica, porque os setores que ganharam ficaram encolhidos, enquanto os perdedores foram para cima do Congresso fazer lobby e tentar minimizar os prejuízos.

Isso deve se repetir agora. A substituição da contribuição sobre a folha por outra sobre faturamento depende de aprovação do Congresso. Se empreiteiras são grandes financiadores de campanha de deputados e senadores, os bancos também são.

Por isso que os trabalhadores ainda estão cautelosos ao comentar os sinais emitidos pelo ministro da Fazenda. “Só ficaremos satisfeitos se garantir que a Previdência Social não terá prejuízo”, afirma Quintino Severo, da CUT.

Os trabalhadores também pressionam o governo para que aqueles setores que vão ser agraciados com menos imposto se comprometam a contratar mais funcionários ou a pagar salários menores, em vez de simplesmente transformar em lucro o que economizarão em pagamentos à Previdência.

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