DIÁRIO DE NOTÍCIAS, editorial
Há 20 meses que a Zona Euro e, por extensão, toda a União Europeia se confrontam com a crise das dívidas soberanas. Várias coisas tornaram-se evidentes: a primeira é que, passado este tempo todo, ainda não se encontra em funcionamento um mecanismo europeu de estabilização financeira, que actue preventivamente, em vez de ter de ser chamado em última instância, como se de um 112 financeiro se tratasse; a segunda é que o cargo de Sr. Euro, ocupado por Jean-Claude Juncker, não tem servido para grande coisa nesta crise.
Os sucessivos embaraços que este percurso atribulado da Zona Euro tem gerado estão, pela certa, na base da proposta insólita avançada pelo presidente do Banco Central Europeu, Jean-Claude Trichet, no discurso solene de aceitação do Prémio, entre todos simbólico na Europa, Carlos Magno. Sugere ele a criação (já que existe um mercado único, uma moeda única e um Banco Central Europeu) de um ministro das Finanças europeu. Metendo-se pelos meandros do que esse superministro deveria ou não poder fazer desde já, defende a ideia de ele reforçar a intervenção nos países incumpridores do euro, a coordenação económica e orçamental e a representação externa de toda a Zona Euro. Para, num rebate de consciência, reconhecer que o povo da Europa deveria ter uma palavra a dizer sobre a constituição de um tal alto cargo.
Um banqueiro central, independente de qualquer força política governante nos 17 países do euro, faz, assim, uma incursão nos terrenos da construção política da União Europeia de um ponto de vista tecnocrático. A política, isto é, a discussão séria acerca das instituições europeias actuais e sua capacidade de resposta aos problemas de 500 milhões de cidadãos europeus passa ao lado, parece dispensável. Mas não é. Sem a construção assumidamente federalista de uma nova arquitectura institucional europeia (que muito poucos hoje advogam), repetir-se-ão propostas deste tipo: remendos de uma máquina, que rebenta de incoerência por todos os lados.
A luta de Vargas Llosa
É um Peru de sucesso o país que domingo elege um novo presidente. Em 2010, registou uma taxa de crescimento económico de 8,7%, culminando aquela que foi uma década dourada, apesar da persistência das desigualdades. Mas com Alan Garcia de partida, a nação sul-americana surge nesta segunda volta dividida entre Keiko Fujimori, filha do antigo presidente preso por massacres, e Ollanta Humala, um ex-militar populista. Ambos causam repúdio a boa parte do eleitorado, e é imprevisível como tal se reflectirá nos resultados. Keiko surge à frente nas sondagens.
O protagonismo nesta campanha do mais famoso peruano, o Nobel Mario Vargas Llosa, mostra bem a crispação no país. Depois de ter descrito Humala e Keiko como "o cancro e a sida", o escritor apela agora ao voto no populista, dizendo esperar que prefira imitar antes o brasileiro Lula do que o venezuelano Chávez. Acusa a filha de Fujimori de nunca se ter distanciado da "ditadura do pai" e lamenta que na primeira volta os três candidatos centristas se tenham anulado a ponto de favorecer os extremos.
Mas se Vargas Llosa vê Humala como o mal menor, já os meios empresariais estão com Keiko. Recordam os tempos de estabilidade de Alberto Fujimori, que pôs fim às guerrilhas e favoreceu os negócios. Temem sobretudo o populismo de Humala. Perante este cenário, os peruanos vão ter uma escolha dramática. Defender a democracia e a prosperidade não será fácil.
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