Luciana Taddeo, Buenos Aires – Opera Mundi
"A fortaleza não implica crueldade". Essa foi a frase que resumiu a carta escrita pelo juiz da Corte Suprema da Argentina, Eugenio Raúl Zaffaroni, ao presidente Barack Obama, em defesa da libertação dos cinco cubanos acusados de espionagem e presos há 13 anos nos Estados Unidos.
Zaffaroni, que é professor emérito da Universidade de Buenos Aires, lembrou que o processo no qual foram condenados Ramón Labañino, Antonio Guerrero, Fernando González, René González y Gerardo Hernández “resulta pelo menos discutível ou pouco transparente, o que inclusive é reconhecido nos âmbitos adequados da ONU.”
Segundo o magistrado argentino, “o passar do tempo transformou a questão jurídica em matéria política, o que torna muito difícil chegar ao fundo da questão de forma imparcial”, e por isso Obama deve considerar a comutação das penas para “pôr fim a uma situação duvidosa que a estas alturas não pode ser resolvida por meio de decisões jurisdicionais”.
Símbolo da disputa entre os EUA e a ilha então comandada por Fidel Castro, os cinco cubanos foram presos por agentes do FBI em 1998. Descobertos ao lado de outros agentes —que conseguiram a liberdade após se declararem culpados e revelarem como o grupo operava—, "Os Cinco" se mantiveram em silêncio e foram condenados a penas que variam entre 15 anos e prisão perpétua por espionagem e conspiração.
Segundo as autoridades cubanas, eles eram agentes do país que atuavam em território norte-americano para impedir atos terroristas contra Cuba—especialmente de grupos exilados após a revolução de 1959 na região de Miami. Havana assegura que eles não representavam ameaça para a segurança dos Estados Unidos. O grupo permanece recluso em penitenciárias de segurança máxima.
Críticos da condenação, como a ONG Anistia Internacional, afirmam que os ex-agentes não tiveram um processo justo, e que a decisão da Justiça norte-americana foi política, por conta da falta de evidências durante o julgamento.
Na carta a Obama Eugenio Zaffaroni diz ainda que, na hipótese de os acusados serem culpados, suas penas não devem ser “cruéis” ou “desproporcionais”. Para ele, os cubanos não representam à segurança do país um risco “de tal magnitude, que mereça uma pena maior que a que já cumpriram os mencionados cidadãos”.
Zaffaroni ressalta que durante a atividade dos cubanos no país “não se produziu a morte de nenhuma pessoa nem se pôs em perigo concreto a vida de ninguém”, e que a magnitude das condenações “excedem em quase todos os casos a vida útil dessas pessoas”, equivalendo a penas de morte.
O juiz afirma saber que as razões de política interna poderiam ser um obstáculo à concessão do mesmo. O magistrado argumenta, no entanto, que a liberação dos cubanos reforçaria a imagem de “boa vontade e generosidade” dos EUA e do governo norte-americano para a comunidade internacional, assumindo “um valor simbólico de máximo significado”.
“Contribuiria para paliar velhas desavenças que a cada dia vão perdendo mais sentido no atual momento do mundo, urgida por outras demandas e riscos. Insistir em velhos rancores provoca nas novas gerações a sensação de assistir os ódios dignos de museu e desvaloriza a imagem de seriedade e realismo que a vida política deve transmitir, para não ser desprezada por aqueles que nos sucederão”, escreve.
Perfil
Reconhecido internacionalmente por sua reputação como criminalista, Zaffaroni foi apoiado por juízes argentinos e de vários países da América Latina ao ver-se envolvido em uma série de acusações sobre o uso de propriedades para serviços de prostituição, há cerca de dois meses. O magistrado alegou desconhecer a utilização dada aos seus apartamentos, administrados por um terceiro.
As acusações levaram políticos opositores a pedirem a renúncia do magistrado, nomeado como ministro da Corte Suprema pelo ex-presidente Néstor Kirchner. O ex-chefe de Estado renovou a instituição judicial, antes comandada por muitos juízes remanescentes do período presidencial de Carlos Menem (1989-1999).
A trajetória de Zaffaroni reforça, na Argentina, a campanha pela libertação dos cinco cidadãos cubanos presos nos Estados Unidos sob acusação de espionagem, que conta com o apoio do ex-jogador e ex-técnico da seleção argentina Diego Armando Maradona, de Estela de Carlotto e Hebe de Bonafini, presidentes das associações das Avós e Mães da Praça de Maio e do Prêmio Nobel da Paz, Adolfo Pérez Esquivel.
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